Política e Representatividade Feminina se discutem, sim!
“Nas eleições de 2014, dos 1.035 legisladores estaduais eleitos, somente 114 eram mulheres, ou apenas 11% do total. No Congresso Nacional, foram eleitas somente 61 mulheres para 513 cadeiras, ou 12% do total”. Conforme este trecho de reportagem do Nexo Jornal, publicado em março deste ano, podemos nos direcionar para uma questão ampla que assola o cenário político brasileiro: onde estão as mulheres na política?
Isso diz muito sobre a cultura machista do nosso país, já que aquela velha representação de que as mulheres não tem “credibilidade” ou vocação para ocuparem cargos públicos continua ditando as pesquisas eleitorais e a intenção de voto da população. É a mesma representação que faz com que as mulheres, mesmo ocupando os mesmos cargos que os homens, continuem recebendo salários inferiores, e inclusive, ocupando menos cargos de chefia. Relações de poder estão por todo lado dentro da estrutura social, e os espaços públicos e privados continuam sendo extremamente desiguais em matéria de gênero, raça e classe. Por isso a importância de falar sobre o voto em nosso país, e mais especificamente, sobre os votos e as candidaturas femininas.
Lembrar de nossa História parece propício, pois, em matéria de atuação na vida pública, as mulheres tiveram um atraso considerável, lembrando que fomos permitidas de votar há menos de um século atrás, a duras penas. No Brasil, o voto feminino foi liberado e implementado na Constituição Federal em 1934, mas ainda era facultativo, somente sendo equiparado ao sufrágio masculino, obrigatório, em 1946.
Não se trata de advogar que o eleitorado feminino somente deposite o seu voto em candidatas mulheres, mas sim de questionar o porquê dessa representação tão escassa e o porquê dos candidatos homens eleitos não estarem atendendo às demandas da população feminina parece não incomodar grande parte da população. Parece não ser do interesse da maioria das pessoas no poder que as mulheres ocupem cargos de chefia, gestão ou governança. Analisando isso mais de perto, podemos nos perguntar: quem são as pessoas que estiveram e estão em poder do nosso Estado? Quais as políticas e projetos direcionados para a população feminina que tivemos nos últimos tempos?
Na área da saúde, a assistência às mulheres é, muitas vezes, sinônimo de atenção às gestantes e planejamento familiar, enquanto há invisibilidade das mulheres lésbicas, bissexuais e trans. Temos uma política que continua a ignorar o fato de que gênero é um fator que afeta a qualidade de vida e a saúde mental e física de mulheres (e de homens também!). Uma maioria parlamentar de homens que acreditam ser correto o Estado manter a tutela sobre o corpo das mulheres, impedem-nos de acessar nossos direitos sexuais e reprodutivos, da possibilidade de optar ou não pela interrupção da gravidez, por exemplo. Enquanto isso, a violência de gênero, o feminicídio, e os abortos clandestinos, continuam a vitimar cidadãs brasileiras todos os dias. O que esperar da nossa sociedade e do nosso cotidiano quando as pessoas no poder não estão governando para uma sociedade mais equânime?
Há no Brasil cotas a serem preenchidas pelos partidos políticos, que dizem respeito à porcentagem destinada às candidatas mulheres, sendo de 10% do tempo de propaganda televisiva, 5% do orçamento total e de, pelo menos 30% de candidatas mulheres. Na prática, esse percentual não funciona, sendo, muitas vezes, preenchidos com nomes fictícios ou marcado pela velha “politicagem”, afinal, as cotas somente valem para o registro da candidatura, após esse momento inicial, são os próprios partidos que decidem, internamente, quem vai ficar com os lugares da frente.
Além disso, quando há mulheres se candidatando, geralmente o que se vê é o receio de ser abertamente apoiadora de causas “femininas”, por pensar que o eleitorado não irá “comprar” essas propostas, o que indica que questões como desigualdade salarial, direitos sexuais e reprodutivos e violência de gênero, por exemplo, continuam sendo invisibilizadas e não recebendo a devida importância. Ainda assim, as cotas impedem que a situação se agrave ainda mais, embora seja necessário pensar alternativas com maior grau de alcance e que, de fato, consiga alterar a visão sexista das mulheres na política.
A total falta de incentivo e as jornadas duplas e, por vezes, triplas de trabalho, desestimulam muitas mulheres a embarcar em uma carreira que exige tanta dedicação quanto a vida pública. Mas, acredito que uma das formas de alterar essa realidade é por meio da educação, em casa e desde os primeiros anos escolares, ensinar a importância da formação e da participação política, deixar de lado a representação de que política é “chata”, “complicada”, “coisa para homens”, “coisa que não se discute”. Ao assegurar para as meninas que as suas vozes podem e devem ser ouvidas, explicar que política é para todas e todos, e que se faz todos os dias.
É importante não apenas para colocar em pauta no cenário político nacional assuntos de interesse para a população feminina — e que deveriam ser de interesse da população em geral — mas também para que as meninas mais jovens possam ter um modelo no qual se inspirar, a partir do qual possam criar referências e perceber que é possível, sim, que mulheres ocupem espaços de poder e sejam protagonistas no processo de construção de uma sociedade que trata os seus com dignidade. Acredito que a representatividade feminina é de extrema importância, embora a sua efetivação não dependa apenas de uma cota obrigatória em cada partido ou coligação, mas de uma série de processos e transformações que ainda precisamos incentivar ao nosso redor, incluindo a responsabilização e reflexão sobre nosso voto, por quem estamos elegendo para tomar essas decisões — dia 07 de outubro está aí.
REFERÊNCIAS:
Nexo Jornal, 2018: