Ser Mulher no Carnaval

A luta por um Carnaval democrático

Mayra Chomski
Revista Subjetiva
4 min readFeb 24, 2017

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Em algumas horas começa oficialmente uma das maiores festas populares do Brasil, o Carnaval. São cinco dias de diversão paga ou gratuita nas ruas, onde milhões de pessoas mais diferentes possíveis se divertem juntas, brasileiros e estrangeiros; ricos e pobres; adultos e crianças; homens e mulheres; héteros ou LGBTs; cisgêneros ou transgêneros.

Na teoria, o carnaval é maravilhoso para esse últimos grupos de pessoas que foram citadas acima, mas quando você é mulher, esta festa perde um pouco de seu encanto devido à sociedade patriarcal que vivemos, e, provavelmente terá que aturar muito, mas muito assédio. Segundo uma pesquisa feita pelo Instituto Data Popular em 2016, foram denunciados 1.901 casos de violência física e 279 agressões psicológicas durante o carnaval de 2016. Há também denuncias de cárcere privado, onde mulheres durante os dias de carnaval são proibidas e trancadas em suas próprias casas pelos seus parceiros, pois para esses homens, uma mulher que sai durante o carnaval é “vadia”, pois para 49%, os festejos de rua não são lugares para “mulheres direitas”. E para 61% deles, a mulher que estiver solteira não pode reclamar do assédio, pois na lógica deles, a mulher solteira está lá para servi-los e a mulher que esta acompanhada de outro homem só ganha o respeito por estar acompanha, pois se ela estivesse sozinha, seria obrigada a aceitar os elogios e ainda dar um sorriso sinalizando de como esta “grata”.

Todos esses números nos mostram como o machismo é naturalizado, como que puxar o cabelo ou o braço de uma mulher é normal, e que ela é obrigada a aceitar essa agressão calada, mas se não ficar calada, será agredida verbalmente e até fisicamente. Para essa sociedade machista, nós mulheres que pulamos carnaval, estamos pedindo que nos agarrem, que nos beijem, mas não queremos isso, o que queremos é nos divertir, e, se quisermos beijar alguém, não será com alguém nos machucando — fisicamente ou psicologicamente — , será com alguém que nos tratara com respeito que qualquer um merece, não só nós mulheres.

Mulheres cansadas do assedio se juntaram e criaram duas campanhas, primeiro o ‘Carnaval Sem Assédio’, onde o objetivo é mostrar que paquerar, beijar e se divertir faz parte da folia, mas é preciso acatar uma condição fácil de entender que é respeitar a condição das mulheres. E a segunda é ‘Minas De Vermelho’, onde convidam mulheres e simpatizantes da causa a usar uma faixa vermelha no braço, assim, se alguma mulher precisar de ajuda e ela te ver, sabe que terá alguém para ajuda-la.

Mesmo com essas campanhas super ativas na internet, mais uma mulher foi vítima do assédio recentemente, este caso aconteceu no pré-carnaval de São Paulo, dia 18 de fevereiro de 2017. Carolina Froes foi agredida verbalmente e fisicamente quando estava deixando o bloco ‘Casa Comigo’. Segundo Carolina, o agressor chegou agarrando-a por trás e a despiu, ela tentou lutar, mas o homem era o dobro de seu tamanho. Quando começou a briga, se abriu uma roda, e em vez das pessoas ajudarem, ficaram olhando e não fizeram nada, enquanto era agredida e gritava para chamarem a policia. Quando começaram a querer separar a briga, em vez de segurar o agressor, seguraram-na e o homem fugiu livremente.

Como mulher que ama carnaval, a cada relato de assédio, sempre penso milhões de vezes se quero sair mesmo, sabendo que se sair estarei a mercê de homens que foram educados a achar que mulher deve servi-lo. Mas quando me vem à cabeça que é melhor ficar em casa, nos últimos dias penso demais na frase que Carolina escreveu no seu relato:

Amo o carnaval. O que aconteceu comigo no sábado não é carnaval. O que aconteceu comigo no sábado é abuso, é assédio, é agressão, é violência.

O que Carolina quis dizer é que carnaval é alegria, diversão, beijo na boca, sexo (seguro), amor, purpurina, fantasias e, principalmente, tudo com consenso. Meu desejo é que neste carnaval todos se divirtam, mas sempre respeitando o próximo, é preciso entender de uma vez por todas que NÃO É NÃO e que, se a mulher estiver bêbada, passando mal ou qualquer outra situação que a deixe vulnerável, não se aproveite da situação.

Espero que todas nós possamos nos divertir muito, e, lembrem que a nossa presença na rua sempre será de resistência, afinal, somos mulheres desafiando o machismo diariamente no simples ato de ir trabalhar ou estudar, por exemplo. Se infelizmente sofrer alguma agressão — qualquer uma delas — não ache que é coisa da sua cabeça, ela existe. Denuncie, grite, não se cale, mas se não puder denunciar, peça ajuda a alguma mulher próxima. Sempre será nós por nós, somente unidas poderemos fazer a nossa revolução no Carnaval e em nossas vidas.

As denuncias podem ser feitas através do Ligue 180, que é a Central de Atendimento a Mulher em Situação de Violência.

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