The Hidden Identities of Andreas Poupoutsis

Sociedade do silêncio

Carolina Infanger
Revista Subjetiva

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Estaria eu tentando equiparar meus passos com os de Byung Chul nesse título que pode ser até considerado um tanto quanto atrevido? Jamais.

Porém, te convido à fazer uma análise da fala. Do ato de falar e se comunicar e da sociedade, consequentemente te fazer pensar também sobre o silêncio.

Nós vamos juntos.

Em O que é Psicologia Social, Silvia Lane consegue transmitir bem o que é o ato da fala e o que ele trouxe à sociedade — não reduza a fala apenas à oralização— a linguagem surgiu para transmitir ao outro o resultado, os detalhes de uma atividade ou da relação entre uma ação e uma consequência.

Silvia ainda pontua que, no início, se a fala teve sua existência para demonstrar um objetivo, hoje ela adquiriu uma autonomia que permitiu uma divisão de trabalho: A manual versus a intelectual onde o intelectual não é quem fala mas sim quem pensa e expressa o pensamento pela fala.

Se levarmos em consideração a frase de René Descartes “Penso logo existo” e unirmos à autonomia da linguagem apontada por Silvia, quem não tem a função de pensador não existe.

Logo, quem “não existe” é porque foi silenciado.

Não nos levemos apenas ao âmbito do trabalho mas sim no da existência em si.

Acredito que o silêncio acompanhe alguns de nós desde a infância, quando falamos de sociedade também precisamos discutir que essa possui padrões, maiorias e minorias. Possui opressores e oprimidos, silenciados e “pensadores”.

Muitas vezes quem “pensa” pelo Mundo é um homem branco, cis, hétero e de alta classe social. Que é representado na mídia, em comerciais e propagandas, ele sai na Forbes e dificilmente é questionado sobre suas escolhas pessoais. Muitas vezes esse homem também tem sua representação em núcleos, seja ele no núcleo familiar como o “chefe da família”, no núcleo escolar como um professor autoritário e no núcleo do trabalho como um chefe. O silêncio é o que resta à quem pertence às minorias, assim como a descaracterização do ser.

Numa vivência LGBTQIA+ quantas vezes, por exemplo, não houve o silenciamento de sua existência à partir do momento em que algum estereótipo de gênero foi “desviado”? Quantas vezes te repreenderam por existir fora do padrão?

Em sua existência quantas vezes você já ouviu a frase “É impossível entender você?” e, de fato, realmente é impossível de compreender verdadeiramente o outro num ponto de vista filosófico mas tal frase não faz nada além de te silenciar e colocar em cheque suas emoções e sentimentos de maneira que sejam invalidados.

A existência de quem é silenciado corre para a invalidação.

Talvez seja um pouco impossível não amarrar o silêncio à dor e à sociedade da positividade.

Mais uma vez, cito Baudrillard “Quem vive no igual, também perece pelo igual”

No nosso caso, o igual mantém uma padronização do poder e o silêncio forçado. É ignorante o pensamento de que quem é silenciado não pensa, o que acontece é que quem é silenciado não tem o privilégio de expressar o seu pensar.

O silencio é imposto para manutenção do poder e da positividade, sendo consequentemente sempre igual.

Hoje nós podemos silenciar alguém até mesmo em redes sociais. Um jeito sutil de fingir estar presente enquanto se tem alguém silenciado e invalidado mesmo numa plataforma social. É mais fácil fingir estar ali do que assumir a responsabilidade de não estar. Também é manipulatório.

E é então, é à partir de tudo isso que somos ensinados à termos “controle” sobre nossos “conflitos”.

“Não fale isso” “Não faça isso” “Compreenda isso” “Releve”

Você é ensinado à não expressar.

Tem quem veja o ato de expressar sentimentos como sinal de fraqueza, o vínculo afetivo também se descaracteriza e é silenciado. Vê-se com bons olhos o ato de deixar de falar o que lhe incomoda para que não cause ao outro um “desconforto”, muitas vezes esse outro é quem está no estado de poder. Estamos numa sociedade onde qualquer dor é remediada o tempo todo com analgésicos.

Somos ensinados à engolir.

O excesso de positividade tornou o “pense no outro” maior do que no “pense em si”, não há pensamento sobre si em uma sociedade onde não se sente dor, não se expressa amor, só se produz e é focada em desempenho.

Hoje citamos trabalho humanizado, autoconhecimento e relacionamentos saudáveis como algo inovador quando, na verdade, é o básico.

O ato de expressar sua intensidade seja no encher a boca para dizer “eu te amo” ou gritar aos ventos seu descontentamento é visto como loucura. Você se torna um radical quando luta pelo que concorda, você se torna fraco quando ama e você é patético quando dói.

Conforme Byung ChulA sociedade positiva evita todo e qualquer tipo de negatividade[…] a verdade é uma negatividade na medida em que se põe e impõe, declarando tudo o mais como falso”

Voltando para Lane, relações de dominação são necessárias para a reprodução das condições materiais de vida e a manutenção da sociedade de classes onde uns poucos dominam e muitos são dominados através da exploração.

Leontiev cita “A consciência individual do homem só pode existir nas condições em que existe a consciência social”, a consciência social existe à partir do momento em que questionamos os papéis que nos são determinados e suas funções históricas.

E é por isso que somos silenciados.

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Carolina Infanger
Revista Subjetiva

Escrevo tudo que me transborda, ensinando tudo que um dia eu descobri; Futura Psicóloga | ig: @bluehowlita