Stephen King e sua construção de monstros reais

Mateus Pereira
Revista Subjetiva
Published in
4 min readJan 30, 2019
Imagem de divulgação

Stephen King é um dos autores mais aclamados da atualidade. Escritor prolífico, deve parte do hype que o cerca a grande quantidade de adaptações de seus livros que vão para as telas anualmente. Em 2019, duas (que eu me lembre, me perdooem a falta de informação) produções baseadas em suas estórias vão estrear nos cinemas: o remake Cemitério Maldito e It Capítulo 2, uma das sequências mais aguardadas pelos fãs.

De antemão, esclareço que ele, ao lado de Edgar Allan Poe, é o meu autor favorito do gênero do horror. Desde 2012, costumo ler no mínimo uma obra de Stephen por ano. E em 2018 não foi diferente. Escolhi It, a Coisa, um calhamaço básico com mais de 1000 páginas. E findada a leitura, cheguei a mesma conclusão que tive ao fechar as páginas de Sob a Redoma: King é maravilhoso quando descreve o pior da humanidade, mas pisa na bola quando mescla terror com ficção científica.

Ele é meigo, tem até um corgi fofo… (Imagem de divulgação)

Stephen tem o claro dom de retratar personagens maléficos, repulsivos e demasiadamente humanos. Apesar de inserir elementos sobrenaturais em suas tramas, são figuras repugnantes que causam aflição, nojo e agonia. Annie Wilkes (Misery), Henry Bowers (It), Jack Torrance (O Iluminado), Margaret White (Carrie) e Percy Wetmore (À Espera de um Milagre) são exemplos dessa caricatura tão bem desenhada por King. Mas aqui, quero me ater a dois modelos mais significativos: Pennywise, o Palhaço Dançarino (vulgo a Coisa) e Big Jim Rennie, de Sob a Redoma.

Derry e Chester’s Mill: sombrias e reais demais

Começando pela entidade que assombra Derry a cada 27 anos: Pennywise, que é majoritariamente retratado como um palhaço, assume a personificação do maior medo de suas vítimas, no caso as crianças. Além de personagens escabrosos dos filmes de horror, ele se manifesta em moradores locais e atua por meio deles, como o adolescente Henry Bowers ou o pai de Beverly Mash. O pânico ao se deparar com o poder da criatura é tão grande que o indíviduo atacado não consegue encontrar meios para enfrentá-lo na maioria dos casos. E o ambiente local amplia essa sensação de desamparo.

Arquivo pessoal

Derry é uma cidade extremamente apática. Os habitantes veem o sofrimento alheio e fazem pouco caso. Suas preocupações são banais e conservadoras e a Coisa faz bom proveito desse ambiente hostil. É por isso que ela está ali a tanto tempo e se dá ao luxo de hibernar por anos. Há pouca resistência. E nas páginas do livro, somente os membros do grupo dos otários, ligados pelo sentimento da amizade, conseguem ter coragem a pelo menos tentar eliminar tal perigo.

Chester’s Mill, local em que se passa de “Sob Redoma” é outro ambiente hostil. Presa repentinamente em uma cápsula que isolou a cidade, rapidamente é dominada por um grupo reacionário que institui um novo governo, com ações intolerantes comandadas por Jim Rennie. Político com influência na segurança pública, ele comete as maiores atrocidades em nome dos bons costumes: comete e permite assassinatos de pessoas que contrariam seu posicionamento, prende seu principal opositor e elabora diversas maneiras de desacreditar o único veículo de comunicação do local.

Algo me parece familiar…

Notou coincidências com a nossa realidade atual? Sim, muitas das atividades manipulatórias combinam com o perfil da família Bolsonaro. É o velho discurso da necessidade de mudanças (taoquei?), quando na verdade é o velho desejo de comandar os esquemas ilícitos que prevalecem. Não basta a corrupção, há o controle de pensamento da população. Ludibriada pelo discurso inflamante, clama pelo fim dos direitos de quem busca igualdade, e cada indivíduo que não se faz mais necessário aos interesses de Rennie, é jogado ao limbo do descrédito. Sim, eu ainda estou falando do livro…

Como falei no início, são as situações cotidianas e as relações interpessoais que fortalecem a escrita do autor. Explicações como tartarugas que vomitam universos e experimentos de observação não são explicações plausíveis. Confesso que acreditei mais em carros assassinos(Christine).

No entanto, é analogia, as metáforas e as verdades cruéis demais que dão o brilho aos seus livros. Pennywise atordoa, tira forças, enfraquece. Rennie manipula, influencia, aproveita das condições fragilizadas. E as soluções são parecidas: a resistência, a união. As resoluções parecem como um discurso de oposição (esquerdopata, petralha, insira aqui outro adjetivo pejorativo) demais para você? Então, desculpa ser aquele quem avisa, mas Stephen King, assim como eu, é democrata…

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Mateus Pereira
Revista Subjetiva

Jornalista tímido que gosta de escrever sobre cultura pop e aleatoriedades da vida. Reclama muito no twitter. E ama sorvete com batata frita. IG: m_pereiras