Um balanço das eleições na França: viva Macron! Mas e agora?

O mais jovem presidente francês da história, Emmanuel Macron, de 39 anos, precisa unir uma nação dividida no pleito legislativo.

Thiago Süssekind
Revista Subjetiva
5 min readMay 9, 2017

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O presidente Macron, feliz com a vitória. (Foto: AP)

A vitória de Macron neste domingo (7) foi comemorada em toda a Europa. O segundo turno, que colocou o candidato centrista do recém-criado “Em Marcha!” contra a líder da Frente Nacional (FN)— e da extrema direita — Marine Le Pen, foi enxergado como uma espécie de referendo acerca da União Europeia. Vitória do europeísta Macron, com aproximadamente 66% dos votos e derrota dos eurocéticos e da direita radical.

O ex-ministro da Economia do governo de François Hollande, do Partido Socialista (PS), se tornará no dia 14 de maio — data de sua posse — o primeiro presidente da França desde a fundação da Quinta República Francesa (1958) que não pertence nem aos socialistas nem ao partido “Os Republicanos”. Ou seja, Macron já conquistou um fato impressionante.

No entanto, a França possui um regime semi-presidencialista, de forma que o pleito legislativo — a ser realizado em 11 e 18 de junho — ganha uma importância ainda mais significativa do que em nações presidencialistas, como o Brasil e os Estados Unidos. O primeiro-ministro tem uma enorme importância e, para se aprovar projetos na Assembleia Nacional, é preciso se adquirir uma maioria parlamentar.

Cabe ao primeiro-ministro, nomeado pelo presidente, dirigir a ação governamental, que é decidida pelo presidente da República. O primeiro-ministro, na teoria, desempenha o papel de chefe de governo. Todavia, de facto, normalmente o presidente da República é quem desempenha este papel, enquanto o primeiro-ministro aplica a política do chefe de Estado. Apesar disso, caso Macron não consiga um bom desempenho nas urnas legislativas, existe a possibilidade de haver uma grande queda de braço entre Legislativo e Executivo. O que, apesar de nunca bom, é agravado negativamente em um país de regime híbrido.

O número de dois assentos possuídos pela FN na Assembleia Nacional — que, antes de 2012, nada tinha no Parlamento — deve crescer vertiginosamente. Bem como a esquerda radical, representada pela figura do também eurocético Jean-Luc Mélenchon, que conquistou 19,58% dos votos no primeiro turno das eleições presidenciais.

Enquanto isso, os tradicionais partidos de centro-esquerda e centro-direita — respectivamente, os socialistas e os republicanos — terão a tarefa de convencer o público a votar neles, mesmo após o fracasso na empreitada à presidência. Espera-se que a centro-direita vá particularmente bem, uma vez que, nas eleições presidenciais, o partido foi extremamente prejudicado por um escândalo de corrupção que envolveu o candidato François Fillon.

Já o Em Marcha!, que hoje não possui nenhum assento na Assembleia Nacional, deve ter representantes no Parlamento. O discurso em prol da governabilidade do presidente deve convencer alguns, apesar de, dificilmente, essa quantia conseguir superar a maioria parlamentar. Na verdade, a quantidade ganha pelo mais novo partido francês deve ser bem distante da necessária para tal feito.

Assim, para governar, Macron terá que, muito provavelmente, formar um ministério composto por alguns socialistas e outros republicanos, desde que unidos na visão pró-União Europeia. As suas propostas, contudo — que mesclam uma visão progressiva no campo social e liberal na economia, em geral — , terão vida difícil no Parlamento.

Em sua campanha, se por um lado Macron disse desejar reduzir o imposto que incide sobre as empresas (de 33,3% para 25%) para tornar o país mais competitivo, propôs também alterar a cobrança do imposto sobre grandes fortunas—política vista como de esquerda — e exonerar 80% dos lares franceses do imposto sobre moradia. Ou seja, o novo presidente une propostas dos republicanos e do PS, de forma que as votações no Parlamento serão sempre bastante distintas.

Ainda há, porém, o seu projeto de mudar o seguro desemprego, de forma que os desempregados tivessem que se mostrar competentes e serem obrigados, em caso de uma segunda oferta, a aceitar uma proposta de trabalho. Algo desaprovado tanto pelos socialistas quanto pelos republicanos. Ele, todavia, tem a alternativa de aprovar a medida por decreto. O que nunca é bem visto e que costuma gerar fortes protestos, como quando o presidente François Hollande usou do artifício para aprovar uma polêmica reforma trabalhista.

Há outras propostas ainda, e talvez a mais ambiciosa desta seja o seu plano de 50 bilhões de euros para treinamento profissional, incentivo a energias renováveis, infraestrutura e modernização. “Gastar para evoluir”: algo criticado pela direita econômica tradicional, mas que vem conquistando novos públicos com o seu recente sucesso no Canadá de Trudeau e em Portugal, que antes enfrentara duras medidas de austeridade que não surtiram o efeito desejado.

Enquanto isso, ficou claro na França que a extrema direita nacionalista da Frente Nacional não é um modismo, uma fase. Marine Le Pen fez com que a sua ideologia esteja, hoje, como uma das principais forças políticas francesas. E, diferentemente dos apoiadores de Donald Trump, há, dentre os apoiadores da FN, muitos jovens. O que, evidentemente, indica um potencial futuro, ainda mais com a sobrinha da líder do partido, a carismática Marion Marechal-Le Pen, crescendo.

Por ora, vitória dos europeístas e daqueles que defendem a imigração como parte constituinte do País e dever humanitário. Emmanuel Macron está prometendo reforçar o “motor franco-alemão” para dar um impulso à União Europeia. Ele defende reformar o bloco com o intuito de fortalecê-lo após o Brexit, estabelecendo um Orçamento para a Zona do Euro e um ministro para a mesma.

A sua missão, é claro, não é unicamente internacional: o seu país enfrenta um desemprego de quase 10%, contra 3% da Alemanha, por exemplo. Isso tudo com uma França dividida, especialmente, entre periferia e grandes cidades. Os habitantes do primeiro grupo são a principal força de Le Pen e da FN — moradores de pequenas cidades, desconectadas da globalização e prejudicadas pelo fechamento das velhas fábricas. Já o segundo, aqueles que se beneficiam do processo globalizador, habitantes de cidades cosmopolitas.

Mapa com o resultado do primeiro-turno, deixando clara a diferença entre periferia e grandes centros urbanos. (Foto: EL PAÍS, com fontes do New York Times e do Ministério do Interior francês)

Emmanuel Macron ganhou com um programa firmemente pró-Europeu. Sendo favorável à imigração e à globalização e tudo aquilo que os populistas da extrema-direita odeiam e difamam. Ele, portanto, pode ser a última chance da França e da União Europeia. Um fracasso de sua parte pode representar o fim de uma ordem mundial estabelecida em 1991, após o colapso soviético.

Que todos os partidários de Os Republicanos, do Partido Socialista, os franceses e todos os países da União Europeia se unam em torno de sua figura. Pode ser a última oportunidade de todos eles. Pelo bem da França, da Europa, do mundo.

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Thiago Süssekind
Revista Subjetiva

Líder Estadual do Acredito-RJ (2020-2022) | Advogado | Direito-UERJ | Contato: tsussekind@hotmail.com | Twitter: @ThiagoSussekind