Uma pornografia de extrema direita?

Me parece que nos próximos meses veremos despontar nos portais de pornografia um novo subgênero. Nem tão novo, na verdade.

Tiago da Silva
Revista Subjetiva
3 min readNov 6, 2018

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Aconteceu quando a onda migratória atingiu a Europa e aconteceu de modo um pouco menos expressivo no momento de maior fluxo de venezuelanos para o Brasil. Venezuelanas, especificamente.

Li algo — acho que foi no grupo Anti Pornografia ou em algum link que recebi direta ou indiretamente através da Yatahaze — sobre cidadãos alemães ou italianos, enfim, oferecendo trocados a uma jovem e faminta imigrante da Síria sob a condição de que ela entrasse em um furgão com eles. Você já entendeu, eu não preciso ser explícito.

O “roteiro” trazia invariavelmente mulheres refugiadas maltrapilhas sendo abusadas e filmadas, cenas com apelo violento/degradante. Cenas reais? É possível que não: talvez fossem atrizes interpretando um papel, apenas simulando uma situação real. Mas não é disso que se trata. Falo aqui de cenas de abuso sendo vendidas como entretenimento e formando “imaginários” na cabeça das pessoas, imaginários de como devem ser as reações entre as pessoas.

Xenofobia, misoginia, racismo, tudo misturado e batido junto com doses de sadismo. Isso não são vídeos avulsos, isso constitui um gênero.

(Se alguém souber o nome do gênero, comente, por gentileza.)

Agora, com a ascensão da extrema direita no Brasil e o crescente desrespeito para com os movimentos sociais, em especial a causa feminista, não deve tardar a emergir um tipo de subgênero da pornografia em que sejam encenadas situações de sexo entre uma caricatura da mulher feminista (que provavelmente será representada com axilas não depiladas e, talvez, algum acessório na cor vermelha ou algo que remeta ao Comunismo, possivelmente uma mulher caricatamente periférica) e o estereótipo do homem de extrema-direita (provavelmente caucasiano e mais velho, aparentando maior poder aquisitivo e vestindo uma camisa da seleção brasileira de futebol). Ambiente militarizado com certeza, com provável presença de armas de fogo. Podem haver referências também aos “Porões da Ditadura” e suas torturas.

As cenas provavelmente serão humilhantes (mais que o habitual na indústria pornográfica) e trarão diálogos que ironizarão os conceitos de “resistência”, “meu corpo, minhas regras” e “lute como uma garota”. Provavelmente na trama a protagonista será uma mulher homossexual e o protagonista (mais provável que sejam protagonistas, no plural) fará referências à ideia de “convertê-la” à heterossexualidade.

Como a internet imita a vida e a vida imita a internet, num ciclo infernal, quando os primeiros vídeos assim surgirem a demanda pelos mesmos vai aumentar e surgirão muitos mais.

E, como é característico da pornografia, comportamentos encenados na tela tenderão a ser “copiados” para a vida real. Eu quase posso ver as manchetes dos jornais.

Creio que haverá bastante procura por parte de um público bem específico. São os mesmos rapazes que têm postado fotos ao lado da bandeira dos Confederados e desenhado suásticas nazistas em universidades. Os mesmos que fizeram campanha para o você-sabe-quem.

É uma previsão bem pessimista, mas acho factível.

Alguém acha que estou equivocado?

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Tiago da Silva
Revista Subjetiva

Às vezes me surpreendo com o que escrevo, porque não sabia que pensava assim.