Você sabe foder.

Contos “Eu já amei muita gente”

Bia.
Revista Subjetiva
5 min readDec 28, 2017

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Ilustração by Bia Quadros

Todo mundo gosta de sexo. Quer dizer, é generalizar a opinião de uma maior parte da população sem levar em conta os traumas e a grande supervalorização sobre tal ato, mas pergunte a alguém e a resposta normalmente será positiva. A cultura pop, a televisão, a sociedade em geral nos leva a isso, mesmo que nunca tenhamos experimentado verdadeiramente um bom. Ah, quantos amigos héteros enchem a boca para dizer que “adoram uma buceta”, “amam transar”, “sexo melhor coisa”. Mas será que sabem o que estão fazendo?

Quando comecei a minha vida sexual, tardiamente por se dizer, não achava sexo grande coisa. Ok, gozava, achava maneiro, mas me divertia mais dormindo de conchinha após um lanche de besteiras compradas nas Lojas Americanas do que o ato em si. Quando terminei com meu namorado, o qual digo que oficialmente me desvirginou, queria transar com outras pessoas. Meu objetivo era ver outras pirocas, sentir outros gostos, aprender com as outras novas visões sobre a fornicação. A diversão, aliás, do sexo, a meu ver, é esta troca. Cada pessoa apresenta algo novo, uma posição nova, possibilidades com seu corpo que não imaginava que era tão bom. Mas mesmo transando com um diferente a cada final de semana, ainda preferiria um programa de casal a o ato em si da pentada.

Então, no meio desta gente, conheci um rapaz no Tinder numa tarde vazia de domingo. Conversamos, nos encontramos e demorou um tempo para enfim transarmos. Devido a um problema grave de saúde do rapaz, que vou nominar de Washington, demorou um pouco para finalmente acontecer a nossa primeira transa. A primeira vez aconteceu depois de um mês de encontros num quarto de motel barato da Lapa. E foi assim que percebi como em todo este momento estava transando com gente que não sabia o que estava fazendo ali. Só do ato de tirar a minha roupa, e ele a dele, entendi que estava dando para alguém que sabia fazer sexo. Melhor, que gostava do que estava acontecendo.

Ele me lambia. Sim, ele usava a língua em todas as partes do meu corpo sem nojo. Quando os rapazes lambem, fazem apenas nas partes que interessam: Peito, buceta, pescoço. Mas não além, na virilha, perna, braço, barriga… O corpo da mulher no sexo se resume as partes eróticas, seios/buceta/cu/boca. Mas nosso corpo é além disso. São dedos da mão, tornozelo, joelho, coxa, costas. Os homens por muitas vezes aprendem o que é sexo por filmes pornôs e lá a mulher é um objeto, uma boneca inflável. O sexo, mecanizado, o entre e sai do pênis em algum buraco, sem pensar naquilo, sem prazer afinal sabemos que o gran finale é o gozo. O meio não interessa, alias, nem deveria ter um. O objetivo do sexo na pornografia é o esperma saindo do pênis. Mesmo que seja mentiroso, e aquela quantidade absurda seja irreal.

Ele lambia a minha buceta com gosto. Poucos sabem fazer isso com tanta vontade, mesmo dizendo que adoram sexo oral. Mas como já disse aqui, sexo oral não é lamber que nem gato. É saber que a vagina é além do clitóris e do buraco, são os lábios, grandes e pequenos, a vulva, é o entorno, tudo ali é terminação nervosa. Que tem dedos (e ele sabia disso), língua, ar quente quando se aproxima e ar frio quando se afasta. Que o ph da vagina é diferente do da boca, e o gosto é diferente de um pirulito. Lembro-me de um ex que dizia que não gostava de fazer sexo oral na mulher. “Só depois do banho”, me contava. Ele gostava de lamber sabonete. E o nojo dele me mostrava que ele só fazia devido a uma pressão social de que todo homem deve fazer isso para ser mais macho.

Eu me via com Washington como uma mulher e não como um mero deposito de esperma. Ele gostava do que estava fazendo, eu via isso em seus olhos e no seu gemido, que vinha do centro da Terra. Ele sabia e me mostrou que sexo não é só um entra-sai-entra-sai até alguém gozar. O prazer começa quando os 2 estão ali querendo estar ali. De ter a liberdade de explorar outras possibilidades de prazer no corpo do outro. Com ele fazia fio terra e ele, que nunca tinha feito isso, gostava da sensação nova que tomava conta de cada célula do seu corpo. Com ele eu aprendi que a ponta dos meus dedos da mão são extremamente sensíveis. E junto com sua saliva, impossível não ficar molhada de tesão.

O sexo com ele era uma constante descoberta. Não algo rotineiro, um quase manual de instruções que sabemos os botões e o jeito que o outro goza, sem procurar uma nova experiência. Era ter a vontade de saber qual o limite do corpo do outro e se o que estávamos descobrindo era bom. Washington sabia transar porque ele gostava de transar. Não algo de dentro para fora, só para não ficar feio na conversa da roda de amigos. Ele gostava de foder e melhor, comigo.

E foi assim que descobri que é diferente quando uma pessoa diz que gosta de chocolate e uma que GOSTA de chocolate. A que apenas gosta come com certa vontade, porém se tiver opção come outro tipo de doce. A que GOSTA deixa derreter na boca, experimenta outros tipos de chocolate, sente tanto prazer que fecha os olhos vagarosamente sem consciência disso. Experimente nesta vida transar com alguém que GOSTA disso. E então saberá que será o melhor sexo.

Esta é uma série em parceria com a Revista Subjetiva. Ela sairá todas as sextas e tem o nome de “Eu já amei muita gente”. Histórias baseadas em fatos reais. Nomes modificados para não darem problemas. Qualquer mensagem mande um e-mail para beatrizquadros@yahoo.com.br

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Bia.
Revista Subjetiva

Ilustradora que dá bico de escritora. Não dou conselhos nem respondo cantadas. Gostou de algum texto meu? Comente nele.