Nós gostamos mesmo de futebol?

A preferência das TVs que transmitem a UEFA Champions League é um pouco explicada pelo pouco apreço do brasileiro pelo jogo em si

Alexandre Rodrigues Alves
Revista Acréscimos
4 min readOct 25, 2017

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Montagem com os brasileiros do Paris Saint Germain, grande (e praticamente única) atração da UEFA Champions League nas TVs brasileiras. (arte: Esporte Interativo)

É até relativamente fácil criticar a TV brasileira na questão da transmissão dos jogos da UEFA Champions League. Se no Campeonato Brasileiro já somos, em parte, reféns das repetidas dobradinhas de jogos de mesmas equipes, no torneio europeu parece que só existem Barcelona, Paris Saint Germain e Real Madrid na disputa. Bandeirantes e Esporte Interativo insistem no pensamento de que vale mais ver qualquer jogo (bom ou ruim) que tenha Messi, Neymar ou Cristiano Ronaldo, do que uma partida mais relevante de outra grande equipe.

Na última quarta tivemos um exemplo claro disso: A Bandeirantes, que já faz um transmissão de qualidade muito discutível da competição europeia (basta lembrar quem é o “comentarista” dos jogos…) preferiu transmitir Anderlecht x Paris Saint Germain ao invés de um jogo da qualidade de Chelsea x Roma. Claro que o fator audiência, que tanto prejudica a qualidade média do que é exibido em nossa TV, pesa nesse aspecto, mas chega a irritar quem acompanha o futebol internacional sem se prender a uma equipe apenas.

O pior é que esse pensamento voltado apenas para a audiência está cada vez mais estabelecido na TV paga. O Esporte Interativo, que possui os direitos de transmissão do torneio, também preferiu o jogo do time de Neymar, certamente por achar que teria mais audiência com isso. Com isso, jogos de times também tradicionais como a Juventus e o Bayern de Munique, ficam relegados à segundo plano, devido a preferência explícita pelo time que possui mais brasileiros com destaque. Mesmo o Barcelona de Messi, por estar jogando normalmente no mesmo dia do PSG, tem ficado com jogos sendo exibidos apenas no canal Space.

Compreendo e sei do grande número de admiradores que Barcelona, Real Madrid e PSG possuem no Brasil. Mas muitas vezes chega a ser burra essa decisão de apenas querer agradar a maioria, se esquecendo da qualidade e da diversidade que a grande competição nos proporciona e que na maioria das vezes não é aproveitada pelas nossas emissoras. O Esporte Interativo ainda se vangloria de transmitir “todos os jogos”, mas temos de lembrar que essa possibilidade só acontece mediante a outro pagamento pelo sistema de internet EI Plus; ou seja, você paga duas vezes pelo mesmo serviço, o que não é muito correto a meu ver.

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Na TV aberta vamos dizer que até é compreensível uma busca por uma maior e diversificada audiência. O problema é vermos uma busca igual também na TV paga, onde o interesse pelo esporte deveria ser maior do que a simples busca pela exposição do que “o público quer”.

Reprodução da capa da última revista Placar, de setembro de 2017.

Até compreendo que a busca do equilíbrio entre o que o distinto público deseja e o que se entende como algo de qualidade é complicada. Transferindo um pouco a discussão para a imprensa escrita: Não temos no Brasil um veículo que faça uma cobertura mais ampla no futebol nacional e mundial com revistas no estilo Four Four Two na Inglaterra ou El Gráfico na Argentina. No Brasil temos a revista Placar que tem perdido a sua profundidade na análise do jogo nos últimos anos; inclusive fez uma edição dedicada aos jogos eletrônicos! Nada contra quem joga, mas acredito que ceder o espaço para uma análise mais aprofundada do futebol em si para simplesmente tentar correr desesperadamente atrás de um público com essas “novidades” é, a meu ver, um desperdício.

A cultura de discussão de futebol aqui no Brasil ainda é fraca no geral. Gostamos do jogo, mas não tanto de discuti-lo e, principalmente apreciá-lo quando não está em campo o nosso time. Talvez isso ajude a explicar o fato das TVs seguirem sempre a tendência da moda, ao invés de mostrar o futebol pelo futebol em si. A grife, infelizmente, sempre é mais importante.

OBSERVAÇÃO: No episódio 37 do podcast DOIS TEMPOS do Grupo Gabiroba, falamos sobre a moda e também a vontade de muitos brasileiros em torcer para times estrangeiros. Acesse pelo link abaixo para escutar e também ouça todos os episódios no Mixcloud do Grupo Gabiroba.

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