Os falsos brilhantes

Alexandre Rodrigues Alves
Revista Acréscimos
4 min readMay 12, 2017

A mídia muita vezes se empolga na análise de um novo futuro (possível) craque. E muitas vezes isso gera o efeito contrário…

Lulinha, que 10 anos atrás era a “joia” do futebol brasileiro (sem nem ter jogado pelo profissional do Corinthians). Hoje atua no Pohang Steelers da Coréia do Sul (foto extraída do foxsports.com.br).

Nas últimas semana a mídia tem sido inundada (e vem inundando as manchetes) com especulações em torno da possível transferência do atacante Vinícius Junior, do Flamengo. Um jovem que ainda não fez 17 anos (fará aniversário em 12 de julho) e que nem estreou no time principal do rubro-negro. E já está sendo exaltado além da conta por muitos da imprensa.

Vinícius Júnior, atacante do Flamengo, comemorando um gol nas categorias de base (foto extraída do site: colunadoflamengo.com)

É claro que Vinícius fez um ótimo Sul-Americano Sub-17, no começo deste ano no Chile. Foi campeão com a Seleção Brasileira e foi artilheiro do torneio com sete gols. Para muitos que acompanha o futebol de base, ele pode vir a ser mesmo uma grande revelação e um grande jogador no profissional em futuro próximo. Não duvido de nada disso, é bom deixar claro. Porém, me espanta como é tratada com facilidade a possibilidade de nem vermos direito um talento atuando em nossos campos.

Ilustrei o começo deste texto com a foto de Lulinha. Em 2007 o meia-atacante revelado pelo Corinthians também venceu um Sul-Americano sub-17 (desta vez disputado no Equador). Foi também eleito melhor jogador e artilheiro (no caso com 12 gols!). E era considerado um fenômeno na base, com um número de gols absurdo feito contra times menores.

Porém Lulinha estreou em um Corinthians em crise, que ainda naquele ano de 2007 seria rebaixado para a segunda divisão. O jogador não mostrou na categoria principal a mesma qualidade e regularidade que possuía nos times de base e nunca se firmou no time paulista. Depois de permanecer no clube até 2009, perambulou por 8 clubes (entre eles Ceará e Botafogo no Brasil e Estoril e Olhanense em Portugal) até chegar ao Pohang Steelers da Coréia do Sul, onde está desde o meio de 2016. Por lá ele vem tendo bom desempenho.

Ao ser entrevistado pelo site do Fox Sports, Lulinha disse que vem acompanhando o caso de Vinícius Júnior. Mas sua declaração em relação ao jovem flamenguista foi um pouco surpreendente, ao menos para mim.

“Vi que ele (Vinícius Júnior) surgiu com um caso muito parecido com o meu. Foi muito bem no Sul-Americano sub-17, e clubes querem pagar milhões. O conselho que eu dou é para ele agir com o coração. Se você tem uma oportunidade, mesmo com 16, 17 anos, de ir para um Real Madrid, ou outro clube dessa dimensão, não pode perder. Acredito que ele tem que ir”

Primeiro é preciso lembrar que Vinícius só pode se transferir para o exterior quando completar 18 anos, segundo legislação brasileira (ele pode ser até vendido mas, sair oficialmente, só quando obter a maioridade). Mas a surpresa na declaração nem é só pela questão mercadológica, que hoje domina em grande parte o futebol mundial. Mas sobre o fato de Lulinha pensar que, se tivesse ido cedo para lá, tudo teria sido diferente em relação ao rumo que sua carreira tomou.

A preparação para uma carreira envolve diversos fatores. O psicológico manda muito também na cabeça do jogador. E hoje em dia vemos uma superexposição exagerada em adolescentes que ainda nem se provaram em suas equipes locais! Antigamente o jogador brasileiro aparecia, mas ao menos conseguia jogar em sua equipe formadora. Hoje em dia nem isso acontece. Mesmo Gabriel Jesus que vem conseguindo comprovar sua qualidade jogando na Inglaterra e na Seleção, atuou pouco no Palmeiras (jogou apenas 1 ano e meio no clube paulista).

Entrada e saída de jogadores brasileiros no país em 2016. (fonte: Revista Época).

Ou seja, além dos próprios jogadores serem lançados (e muitas vezes queimados) cedo demais, os clubes vendem as promessas — aí entrando na questão mercantil — também com extrema rapidez, muitas vezes para cobrir rombos financeiros de gestões passadas. Veja no gráfico acima, que o número de transferências continua alto, mas abaixo você verá que o valor em dólares das últimas vendas até diminuiu em comparação a tempos atrás, ou seja, em termos de mercado externo, ainda somos vistos como periferia.

Valores de transferências (entrada e saída) de jogadores brasileiros em 2016 — em dólares. (fonte: Revista Época).

Em resumo: Brilhar agora não representa tudo. Um jogador no Brasil com um destaque razoável já tem normalmente como destino o exterior. Portanto essa ânsia para se vender logo o Vinícius Júnior é muito exagerada a meu ver. O ponto que precisamos resolver em nosso futebol é fazer com que os talentos fiquem mais por aqui e não sejam quase que coagidos a serem vendidos de forma apressada.

Mas isso é também parte da imprensa, que muitas vezes exagera e busca a criação de novos heróis, mas que, em muitas ocasiões, se tornam apenas falsos brilhantes. Que não seja o caso de Vinícius Júnior.

--

--