artista do mês de novembro
maria ramos gazel
Gosto que me chamem de Maria, mas meu nome mesmo, é Maria Eduarda. Como quase todas, já quis ser duda, mas não tive sucesso, tenho cara de Maria.
Nasci em Minas Gerais, na cidade de Teófilo Otoni. Minha infância se deu entre minas-bahia-ceará, e hoje, vivo em Vitória, no Espírito Santo. Vim parar aqui com a desculpa de entrar na universidade, mas acho que eu era uma adolescente do interior que queria espaço e liberdade. Por fim, me formei em psicologia, e hoje trabalho enquanto artista, psicóloga e dona de casa.
Fui uma criança criativa, tive a oportunidade de brincar muito! Durante a adolescência, me envolvi com teatro e fotografia, principalmente. Quando vim de Minas para o Espírito Santo, foi um período inerte nesse sentido; ingressei no curso de arquitetura e aquilo sugava todo meu desejo de criar. As coisas melhoraram em 2016, quando mudei de curso e de tantas outras coisas. Fui, aos poucos, retomando o desenho e a pintura, experimentando os materiais sempre em escalas pequenas. No período pandêmico, essas experimentações ganharam mais força, e passei a aderir mais materiais, em outras escalas, além de resgatar outras linguagens, como a fotografia, o vídeo e a atuação.
Meu processo de criação é sem nenhuma regularidade. Não é todo dia que necessariamente produzo algo materialmente falando, mas todo dia produzo pensamento, e isso faz parte do meu processo criativo.
Das coisas que considero viscerais em minhas criações até agora, fiz quando menos esperava. Costumo ir colecionando coisas: objetos que encontro na rua ou que herdo da família, insetos mortos, fotografias, papéis, tintas, materiais diversos, sentimentos, recortes, livros, revistas, tecidos, etc.
Uma hora começo a cutucar uma coisa aqui, deixo parada por tempo indeterminado, como quem marina uma ideia, e em algum momento retorno àquilo, até um dia dar por finalizado;
— tem coisa que nunca termina , que é mais ou menos da mesma forma que faço com a vida. Uma hora sai alguma coisa.
Tudo que faço considero muito pessoal, acredito na pessoalização da produção como algo que potencializa o trabalho, talvez essa seja a premissa de meus trabalhos, então tudo que me proponho a fazer é muito pessoal sim, e só assim tenho prazer em fazer, de resto fiz por conveniência, e tenho me proposto a isso cada vez menos.
Gosto de brincar, ora esconder, ora de deixar à vista o que tenho feito. O ateliê tem as paredes cheias de começos e meios. Para mim, funciona muito deixar as coisas não terminadas ali à mostra, porque acontece muitas vezes de eu estar passando, olhar pra algo e entender o que precisava ser feito, assim — de repente.
Então acredito na importância da maturação criativa, e isso não quer dizer sentar e esperar surgir uma ideia, mas sim ir fazendo outras coisas, bebendo de outras águas, e em algum momento torna-se possível.
É aquilo: estudar psicanálise pra conseguir escrever, escrever pra conseguir pintar, pintar pra conseguir fotografar, ver filme pra fazer música, fazer música pra entender psicanálise…
Tenho por referências artistas diversos, que trabalham em linguagens diversas, e em tempos diversos, como Leonilson, Castiel Vitorino, Ana Mendieta, Paulo de Nazareth, Frida Kahlo, Manuela Navas, dentre tantos nomes que poderia continuar a citar aqui. Penso que o que me interessa tanto nas produções de cada um desses — e tantos outros que me são referências — é justamente a pessoalidade impressa no que se propõem a fazer; por tratarem de suas próprias vidas enquanto obras de arte, e a partir desse ponto, materializarem o que nos apresentam. Por vezes, só me dou conta que fui fortemente influenciada por x artista um tempo depois. Por exemplo, houve um tempo em que consumia muitos trabalhos de Ana Mendieta e Marina Abramovic, e um tempo depois, analisando minhas produções daquele período, percebo fortemente a referências dos trabalhos dessas duas artistas no que estive desenvolvendo naquele tempo.
Como bem disse saramago “é preciso sair da ilha para ver a ilha”.
Atualmente tenho me debruçado numa investigação muito pessoal no que diz respeito à minha raça/etnia, e tudo que envolve isso. Tenho lido muito, talvez a escrita tem sido o que mais tenho consumido nos últimos tempos, junto a materiais diversos que pertencem à minha família: fotografias, vídeos, cartas e livros que têm sido fonte de investigação para mim, a fim de elucidar de onde vim, minhas ancestralidades, e que lugar eu ocupo sendo uma pessoa que não é branca, e não é preta no brasil hoje. Meu último trabalho nomeei “Ruminar”; onde discuto efeitos da branquitude que vieram operando sobre minha vida e meu corpo até agora.
Nos últimos anos, produzi ilustrações e fotografias para cartazes de filmes, capas de singles e álbuns musicais. Atuei como artista oficineira e artista convidada em ações produzidas pela associação sociedade cultura & arte — SOCA BRASIL, vila velha/es, brasil. participei da Residência Artística “Clínica-Ateliê: Ser Obra da Obra de Arte” (2022), Galeria de Arte e Pesquisa — GAP/UFES, Vitória/ES, Brasil, bem como do Workshop Virtual “LIMBO | Laboratório de investigações de Processos Criativos em Tempos Pandêmicos” (2021), Vitória/ES. Brasil.
Atuei, como atriz, nos curtas-metragens capixabas “Quimera” (2021) e “De Maria ao 201” (2020). Integrei as exposições coletivas “O que dá pra rir dá pra chorar” (2022)no Espaço Thelema e na Oca, ambos em Vitória/ES, Brasil; “Klínicateliê: ser obra da obra de arte” (2022), na Galeria de Arte e Pesquisa — GAP/UFES, Vitória/ES, Brasil; “LIMBO | Experimentações em tempos pandêmicos” (2021), coletiva virtual organizada pelo Coletivo FURTACOR, Vitória/ES, Brasil; “Mostra Internacional Luz del Fuego de Mulheres Brasileiras na Fotografia” (2021), Cachoeiro de Itapemirim/ES, Brasil, e Buenos Aires, Argentina; e “Fórum da Imagem: Construção de Imagens Urgentes” (2020), na Galeria Homero Massena, Vitória/ES, Brasi; e a mostra coletiva. Meus trabalhos integram, ainda, o acervo de colecionadores locais e nacionais. Fui co-curadora e co-arte-educadora da exposição virtual coletiva “LIMBO | Experimentações em tempos pandêmicos” (2021). Meu último trabalho nomeei “Ruminar”, trata-se da investigação sobre os efeitos da branquitude em minha vida, e desejo de composições imagéticas que perscrutam ferramentas e rituais para descolonizar minha pele, via experimentos videoperformáticos que flexionam minha própria história de vida e ancestralidade. Esse trabalho foi apresentado no “I Projeto Projeções”, realizado na Casa da Escada Colorida, e na “Parada 7 arte em resistências”, ambos no Rio de Janeiro/RJ, Brasil.
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