artista do mês de novembro

Grifo - editorial
revistagrifo
Published in
6 min readNov 30, 2022

maria ramos gazel

Gosto que me chamem de Maria, mas meu nome mesmo, é Maria Eduarda. Como quase todas, já quis ser duda, mas não tive sucesso, tenho cara de Maria.

de maria ao 201, (2021)
curta-metragem do diretor alberto contarato

Nasci em Minas Gerais, na cidade de Teófilo Otoni. Minha infância se deu entre minas-bahia-ceará, e hoje, vivo em Vitória, no Espírito Santo. Vim parar aqui com a desculpa de entrar na universidade, mas acho que eu era uma adolescente do interior que queria espaço e liberdade. Por fim, me formei em psicologia, e hoje trabalho enquanto artista, psicóloga e dona de casa.

Fui uma criança criativa, tive a oportunidade de brincar muito! Durante a adolescência, me envolvi com teatro e fotografia, principalmente. Quando vim de Minas para o Espírito Santo, foi um período inerte nesse sentido; ingressei no curso de arquitetura e aquilo sugava todo meu desejo de criar. As coisas melhoraram em 2016, quando mudei de curso e de tantas outras coisas. Fui, aos poucos, retomando o desenho e a pintura, experimentando os materiais sempre em escalas pequenas. No período pandêmico, essas experimentações ganharam mais força, e passei a aderir mais materiais, em outras escalas, além de resgatar outras linguagens, como a fotografia, o vídeo e a atuação.

fotografia da série analógica : a esperança é a última que morre (2021)

Meu processo de criação é sem nenhuma regularidade. Não é todo dia que necessariamente produzo algo materialmente falando, mas todo dia produzo pensamento, e isso faz parte do meu processo criativo.

Das coisas que considero viscerais em minhas criações até agora, fiz quando menos esperava. Costumo ir colecionando coisas: objetos que encontro na rua ou que herdo da família, insetos mortos, fotografias, papéis, tintas, materiais diversos, sentimentos, recortes, livros, revistas, tecidos, etc.

Uma hora começo a cutucar uma coisa aqui, deixo parada por tempo indeterminado, como quem marina uma ideia, e em algum momento retorno àquilo, até um dia dar por finalizado;
— tem coisa que nunca termina , que é mais ou menos da mesma forma que faço com a vida. Uma hora sai alguma coisa.

“Receita para fazer pedra lapidada dilapidar” (2022)
texto escrito manualmente sobre papel sulfite 21cm x 12cm

Tudo que faço considero muito pessoal, acredito na pessoalização da produção como algo que potencializa o trabalho, talvez essa seja a premissa de meus trabalhos, então tudo que me proponho a fazer é muito pessoal sim, e só assim tenho prazer em fazer, de resto fiz por conveniência, e tenho me proposto a isso cada vez menos.

Gosto de brincar, ora esconder, ora de deixar à vista o que tenho feito. O ateliê tem as paredes cheias de começos e meios. Para mim, funciona muito deixar as coisas não terminadas ali à mostra, porque acontece muitas vezes de eu estar passando, olhar pra algo e entender o que precisava ser feito, assim — de repente.

Então acredito na importância da maturação criativa, e isso não quer dizer sentar e esperar surgir uma ideia, mas sim ir fazendo outras coisas, bebendo de outras águas, e em algum momento torna-se possível.

É aquilo: estudar psicanálise pra conseguir escrever, escrever pra conseguir pintar, pintar pra conseguir fotografar, ver filme pra fazer música, fazer música pra entender psicanálise…

Descoberta (2022)
recortes e giz pastel oleoso sobre papel artesanalmente reciclado
21cm x 29,7cm

Tenho por referências artistas diversos, que trabalham em linguagens diversas, e em tempos diversos, como Leonilson, Castiel Vitorino, Ana Mendieta, Paulo de Nazareth, Frida Kahlo, Manuela Navas, dentre tantos nomes que poderia continuar a citar aqui. Penso que o que me interessa tanto nas produções de cada um desses — e tantos outros que me são referências — é justamente a pessoalidade impressa no que se propõem a fazer; por tratarem de suas próprias vidas enquanto obras de arte, e a partir desse ponto, materializarem o que nos apresentam. Por vezes, só me dou conta que fui fortemente influenciada por x artista um tempo depois. Por exemplo, houve um tempo em que consumia muitos trabalhos de Ana Mendieta e Marina Abramovic, e um tempo depois, analisando minhas produções daquele período, percebo fortemente a referências dos trabalhos dessas duas artistas no que estive desenvolvendo naquele tempo.

Como bem disse saramago “é preciso sair da ilha para ver a ilha”.

colagem analógica: quando Fre(u)d chorou, (2021)

Atualmente tenho me debruçado numa investigação muito pessoal no que diz respeito à minha raça/etnia, e tudo que envolve isso. Tenho lido muito, talvez a escrita tem sido o que mais tenho consumido nos últimos tempos, junto a materiais diversos que pertencem à minha família: fotografias, vídeos, cartas e livros que têm sido fonte de investigação para mim, a fim de elucidar de onde vim, minhas ancestralidades, e que lugar eu ocupo sendo uma pessoa que não é branca, e não é preta no brasil hoje. Meu último trabalho nomeei “Ruminar”; onde discuto efeitos da branquitude que vieram operando sobre minha vida e meu corpo até agora.

Nos últimos anos, produzi ilustrações e fotografias para cartazes de filmes, capas de singles e álbuns musicais. Atuei como artista oficineira e artista convidada em ações produzidas pela associação sociedade cultura & arte — SOCA BRASIL, vila velha/es, brasil. participei da Residência Artística “Clínica-Ateliê: Ser Obra da Obra de Arte” (2022), Galeria de Arte e Pesquisa — GAP/UFES, Vitória/ES, Brasil, bem como do Workshop Virtual “LIMBO | Laboratório de investigações de Processos Criativos em Tempos Pandêmicos” (2021), Vitória/ES. Brasil.
Atuei, como atriz, nos curtas-metragens capixabas “Quimera” (2021) e “De Maria ao 201” (2020). Integrei as exposições coletivas “O que dá pra rir dá pra chorar” (2022)no Espaço Thelema e na Oca, ambos em Vitória/ES, Brasil; “Klínicateliê: ser obra da obra de arte” (2022), na Galeria de Arte e Pesquisa — GAP/UFES, Vitória/ES, Brasil; “LIMBO | Experimentações em tempos pandêmicos” (2021), coletiva virtual organizada pelo Coletivo FURTACOR, Vitória/ES, Brasil; “Mostra Internacional Luz del Fuego de Mulheres Brasileiras na Fotografia” (2021), Cachoeiro de Itapemirim/ES, Brasil, e Buenos Aires, Argentina; e “Fórum da Imagem: Construção de Imagens Urgentes” (2020), na Galeria Homero Massena, Vitória/ES, Brasi; e a mostra coletiva. Meus trabalhos integram, ainda, o acervo de colecionadores locais e nacionais. Fui co-curadora e co-arte-educadora da exposição virtual coletiva “LIMBO | Experimentações em tempos pandêmicos” (2021). Meu último trabalho nomeei “Ruminar”, trata-se da investigação sobre os efeitos da branquitude em minha vida, e desejo de composições imagéticas que perscrutam ferramentas e rituais para descolonizar minha pele, via experimentos videoperformáticos que flexionam minha própria história de vida e ancestralidade. Esse trabalho foi apresentado no “I Projeto Projeções”, realizado na Casa da Escada Colorida, e na “Parada 7 arte em resistências”, ambos no Rio de Janeiro/RJ, Brasil.

*a revista grifo é uma publicação independente e coletiva da Grifo — editorial, e a-borda os enlaces entre arte, política, filosofia e psicanálise. você pode nos apoiar com grifos, palminhas e compartilhamentos nas redes sociais.
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