Empreendedorismo feminino em Bauru em tempos de novo coronavírus #h8

Helenas
revistahelenas
Published in
6 min readMay 27, 2020

Como os negócios de mulheres enfrentam novos relacionamentos sociais e comerciais no município

Por Julia Mendonça

Photo by Christina @ wocintechchat.com on Unsplash

Devido ao avanço do COVID-19 no país, no dia 20 de março a Prefeitura de Bauru determinou situação de emergência no município, por meio do Decreto nº 14664/2020.

Um dos principais artigos do texto proíbe “o funcionamento de todos os estabelecimentos comerciais e de serviços que tenham acesso direto ao público ou que possam gerar aglomeração de pessoas (…) com exceção de serviços essenciais”. Dentre os listados como essenciais estão supermercados, postos de combustível, distribuidoras de gás e água, serviços médicos e farmácias.

Por conta da determinação de fechamento dos estabelecimentos que não são considerados essenciais, diversos locais deixaram de funcionar: lojas do centro da cidade e de shoppings centers, bares, centros culturais, salões de beleza.

Os locais que continuam funcionando operam por serviços de drive-thru (em que o cliente apenas “passa” para retirar o produto) e entrega, atendimento por aplicativo ou à meia porta, impedindo que os clientes entrem no estabelecimento ou só permitindo a entrada de um número específico de pessoas por vez. Algumas empresas também adotaram o sistema de home office, em que os funcionários trabalham diretamente de suas residências.

Por conta da necessidade de distanciamento social, em ambientes comerciais e até mesmo nas ruas, a transformação das atividades para as novas relações comerciais e prestação de serviços demonstra ser o principal problema para os empreendimentos durante a pandemia do novo coronavírus. A internet e as redes sociais passaram a ser a principal forma de relacionamento com os clientes.

No entanto, as ferramentas não necessariamente garantem a manutenção das vendas e movimento que as empreendedoras estavam acostumadas no pré-pandemia.

“Como são produtos autorais e diferentes, tinha uma boa procura, a loja era bastante frequentada por pessoas que estavam procurando um presente diferente, nossas vendas eram bem boas” afirma Yngrid Silva, artesã e sócia do ateliê Las Chicas.

Com a chegada da pandemia, a loja colaborativa em que disponibilizavam seus artesanatos precisou fechar. “Os produtos estão lá, as meninas atendem pelo Instagram, mas é bem menor as vendas do que quando a loja estava aberta. Tá sendo bem difícil, a gente tá tendo que se reinventar no mercado”, conta.

Mesmo dispondo de atendimento e vendas online, combinado a entregas por moto táxi e correios, Greice Luiz, artesã e dona da marca Charloo, também ressalta a queda no movimento: “Com a quarentena está bem complicado, estou vendendo bem pouco”.

O setor de prestação de serviços também sofreu com a pandemia. “Tive que adaptar preços, além de negociar custos com fornecedores. Isso diminuiu as entradas e as saídas. Alguns clientes precisaram suspender os meus serviços”, explica Evalnice Wagner, fisioterapeuta e instrutora de Pilates. Apesar disso, ela conta que vem conseguindo fazer a transição para atendimentos online. “Nada está faltando por enquanto”.

Yngrid indica as novas atitudes que ela e a sócia precisaram tomar para a manutenção de seu empreendimento no novo cenário: “estamos fazendo propaganda no Facebook, patrocinando publicação no Instagram, estudando bastante sobre marketing digital. Não estamos vendendo tão bem quanto antes mas a gente consegue pagar as contas, mantendo o ateliê por enquanto, conseguindo comprar e pagar materiais”.

Iniciativas de e-commerce para pequenos negócios também está sendo uma saída buscadas pelas empreendedoras. “A gente pensou em colocar no Magazine Luiza. lá eles estão abrindo lojas online, mas é bem burocrático, não conseguimos enviar toda a documentação que eles pediram ainda”, conta Yngrid.

Como um efeito cascata, as dificuldades e transformações geradas pelo coronavírus na empresa tem repercussão direta dentro de casa e na vida pessoal das empreendedoras.

“Estamos conseguindo manter a família porque tivemos que nos readaptar. Tentamos os auxílios do governo, mudamos para um apartamento menor, contas que foram permitidas as ‘pausas’, nós fizemos as pausas”, conta Evalnice. “A maior dificuldade é ter que ficar devendo, mesmo que tenham sido feitas as pausas permitidas em alguns contratos. Mas a sensação é muito ruim por não estar conseguindo fazer os pagamentos, para que coisas essenciais não faltem”.

Greice comenta que para manter sua loja, irá fazer um acordo com o dono da galeria em que ela fica localizada, no centro de Bauru. “Estamos conseguindo nos manter dando prioridade às contas: água, energia, internet, gás e mercado. Outras contas não estou conseguindo cumprir”.

Ainda que tanto Yngrid quanto o marido tenham fontes de renda, ela conta que para manter o casal e os dois cachorros está sendo difícil. “A gente cortou tudo que não é essencial, mantendo mantendo o foco só para pagar aluguel, gasolina contas básicas da casa e a comida mesmo. Não pede comida fora, não compra roupa, acessório, coisa para casa. Tá difícil, mas acredito que se a gente continuar como a gente tá trabalhando, a gente consiga sim sair dessa crise”.

Ações da administração pública

De acordo com a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Turismo e Renda (Sedecon) de Bauru, entre março e abril foram realizados cerca de 400 atendimentos a empreendedores da cidade.

“A pandemia do novo coronavírus é algo sem precedentes. As cidades não estavam preparadas para receber uma quantidade tão grande de pessoas perdendo seus empregos e suas fontes de renda. Por isso a gente criou, pela Prefeitura Municipal, algumas alternativas”, explica a secretária Aline Fogolin. “Para que nós possamos manter esses canais abertos e que o empreendedorismo ainda possa se permitir”.

Foi registrado um aumento na geração de novos CNPJs para Microempreendedor Individual (MEI), fazendo com que o número de cadastros ultrapasse 31 mil em Bauru. Ainda segundo a secretaria, nos últimos 60 dias de pandemia, mais 120 empresas de outros portes foram abertas. “Isso mostra que a região de Bauru continua buscando se fortalecer e se reinventar nesse período de pandemia”, comenta Fogolin.

Confira a seguir a entrevista com a secretária de Desenvolvimento de Bauru, Aline Fogolin, tratando sobre as medidas da administração pública municipal no apoio aos empreendedores de Bauru e região durante a quarentena e pandemia do novo coronavírus e os projetos de atuação previstos para o fim da paralisação de atividades e pós-pandemia.

Reabertura

Desde o dia 20 de março, quando Bauru entrou oficialmente em estado de emergência, houveram três prorrogações que quarentena. A última, datada de 10 de maio, decreta manutenção do estado até o dia 31 do mês.

O governador de São Paulo, João Dória, já sinalizou mais uma prorrogação da quarentena em todo o estado. Há, porém, uma mudança: a chamada “quarentena inteligente”: a flexibilização em maior ou menor grau, dependendo das condições das diferentes regiões do estado.

A retomada das atividades vem sendo pautada incisivamente no município desde o início da quarentena. Nos dias 27 de março e 26 de abril, empresários participaram de carreatas como forma de manifestação, pedindo a reabertura do comércio em Bauru.

“A pressão dos lojistas para abrir o comércio é pensando apenas no lucro, sendo que irão colocar seus funcionários para trabalhar e não os donos. É uma mensagem de que não se importam com as pessoas e sim com o dinheiro”, afirma Greice. “Sou a favor da quarentena, porque precisamos controlar o vírus. Acho primordial deixar o comércio fechado porque precisamos dar valor a vida. As vendas darão certo depois que tudo isso passar”.

O projeto “Plano Estratégico” elaborado pelo Sindicato do Comércio Varejista de Bauru e Região (Sincomércio), serviu de base para um Projeto de Lei apresentado na Câmara Municipal pela vereadora Chiara Ranieri (DEM), que conta ainda com emendas da própria autora e demais parlamentares.

A proposta está organizada em duas fases: a primeira determina a instalação de boxes para atendimento aos clientes e abertura do comércio de rua (entre as 10h e 16h) e lojas de shoppings centers (entre 12h e 20h durante a semana e entre 14h e 20h aos domingos); a segunda fase indica a abertura normal do comércio, sendo de responsabilidade dos lojistas a limitação do número de clientes no local.

Por unanimidade, o Projeto de Lei foi aprovado pelos vereadores e agora vai ao Executivo para ser promulgado.

Nesta semana também foi assinado o Pacto Regional por 39 municípios, incluindo Bauru. O documento determina protocolos gerais e específicos que regulamentam a abertura de estabelecimentos nas cidades.

“Entendo que pressionar para abertura do comércio vai só piorar a situação, uma vez que o brasileiro não é colaborativo e não sabe respeitar regras simples”, opina Evalnice. Ela acredita que o fechamento seja um mal necessário. “Se abrir o comércio, o brasileiro vai entender que ‘está tudo bem’ e que pode seguir a vida normalmente sem respeitar a gravidade da pandemia”.

Foto: Julia Mendonça/Arquivo pessoal

Julia Mendonça é jornalista, geminiana, apaixonada por audiovisual e ainda não sabe o que quer ser quando crescer.

--

--