pain au chocolat

Henrique de Campos
Revista Literária Mente
2 min readOct 22, 2022

nunca me interessei pelo fran’s café,
mas todos me diziam
para experimentar
então eu fui.

fui em um ao lado do trabalho,
uniforme,
crachá,
sou o único assim.

todos parecem importantes,
não sei o que fazem,
como fazem,
por que estão aqui,
mas todos me parecem
importantes.

uma mistura de calças social,
sapatênis,
saltos alto,
blusas de seda
ou lã.

todos se parecem,
os cabelos,
os rostos,
as vozes.
as conversas são iguais,
contas,
trabalho,
filhos.
tudo igual,
menos os funcionários,
eles são os únicos negros.

peço um café gelado,
me disseram que era bom,
junto com um pain au chocolat,
eu não sabia o que era.
o homem em minha frente pediu um,
devia trabalhar com ações,
parecia ser importante,
e eu queria parecer também,
queria me sentir igual,
apesar do uniforme.

eu peço ao garçom:
- um pain au chocolat.
o garçom não entende,
eu me sinto ridículo,
por que pedi isso?
nunca me interessei por nada da frança,
por que eu forcei esse sotaque?
- um pain au chocolat.
eu repito.
o garçom me olha e anota o pedido.

eu espero a comida.
sentado,
eu reparo nas pessoas e
em mim,
como sou diferente delas,
como não somos iguais,
apesar de sermos tão parecidos.

então eu percebo
que não deveria estar aqui,
tento me encaixar em um mundo
que não é meu.
eu não gosto de café gelado,
não tomo expresso,
não sei o que é um pain au chocolat,
não gosto de ações,
filhos,
sapatênis,
lã,
seda,
pain au chocolat.

mas ele chega
e eu como,
bebo o café gelado,
pago e vou embora,
sabendo que nunca mais vou voltar,
para meu alívio,
mas,
principalmente,
para alívio deles.

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