declararam que ela havia sumido
às vezes me olho no espelho,
reflito.
há um estranho em mim
pontos, poros, pelos
nascem, crescem, morrem
e se mudam
sem que eu receba um aviso prévio
de trinta dias
sem que ele se limpe da bagunça feita
na lama
quem é esta que eu vejo hoje?
escrevo sobre um corpo
que não pode ser descrito
porque ele se entranha o tempo todo.
ao mesmo tempo,
só escrevo porque morro
porque contorno e não controlo
as curvas,
os moldes peremptórios
de outras palavras
de outras escritas
feitas a partir da minha pele
meu corpo antes fosse
só um conjunto celular, mas
é também enunciado
texto indecifrável
mutável e auto falante
meu corpo, aquele estranho
não foi encontrado em seu pretérito imperfeito
mas levou os restos de comida, e só deixou pra trás
a receita de família
aquela que dita o saber-fazer sobre
como encarnar um reflexo bem-dito
meu corpo, esse danado
aprendeu o imprevisível
e por isso já não some mais,
não de silêncio.
*a Revista Mormaço é uma publicação independente, coletiva e voluntária da Mormaço Editorial. você pode nos apoiar dando palminhas nos textos e compartilhando-os. nos encontre nas redes sociais com o @mormacoeditorial.
