Do chão nunca passei

Thaíla
Revista Mormaço
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2 min readApr 28, 2022
Relatividade — M.C. Escher

Uma vez caí de uma árvore — acho que era uma mangueira — na escola. Me pendurei e puft de costas no chão, ainda abraçada no tronco podre e tudo. Quando me perguntavam como eu estava dizia que estava bem, mas que na hora foi horrível, fiquei pelo menos 5 minutos sem respirar e ouvia as risadas. Ana Luísa chegou a falar que mentira, senão você já estava morta. Eu não sabia quanto durava 5 minutos. E sabia menos ainda que existem minutos que duram mais do que outros.

Teve uma vez que eu caí na piscina da casa de Julialice. De corpo, roupa e tudo, saí deixando para trás um rastro de ferrugem. Um menino percebeu e falou para todo mundo ouvir olha a cor do short dela!. Com aquelas poucas idades que tinhamos só ficou claro o que tinha acontecido quando cheguei em casa sentindo meu útero gritar pela primeira vez.

Outra vez eu caí de bêbada na festa de formatura de Lucas, perna pra cima, calcinha aparecendo. Escorreguei com o chinelo na lama de cerveja. Mas nessa época eu já sabia contar e depois de 7 copos de whisky só deu tempo de sentir vergonha no dia seguinte.

Recentemente eu caí de patins na praça, duas vezes no mesmo lugar, enquanto estava parada. Bunda no chão, joelhos ralados e torção no pulso esquerdo. Bem na minha frente tinha uma criança e uma mãe que tentava convencê-la de que andar de patins não é perigoso. Espero que ela tenha se recuperado melhor do que eu.

Caindo foi uma das primeiras palavras que pulou do meu discurso para os ouvidos da minha analista, e marcou. Depois disso, nunca mais consigo uma conjugação do verbo Cair sem cair em mim mesma antes.

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Thaíla
Revista Mormaço

Baiana de Salvador, psicóloga de formação, psicanalista de desejo e escritora de gaveta.