Eu Amarula, você Absinto

jaisy cardoso
Revista Mormaço
Published in
2 min readSep 28, 2020

se sou licor

servido quente

que tempera a língua com um sabor condensado

você é mistério absoluto

escondido no palato recém molhado

com gélido líquido

que quando suspendo a língua, eu sinto.

se me faço bebida

que se apressa à comida

e preenche todo canto

com a inigualável certeza do depois

você se pinta estranho

como efeito alucinógeno

que inebria as vistas.

se sou Cidade do Cabo

tingida em marrom-especial

textura aveludada

espessura marcante,

você é destilada, norte-Paris

envelhecida

quente

pouco doce.

se sou o cremoso que escorre na goela

você já é o gosto fino e acentuado passando na língua;

você é meu amplo desejo de mais

sem nenhuma dor de cabeça depois

sem nenhuma queixa de ressaca no outro dia

é o trago que desamarga a boca

é o soluço entre uma dose e outra

é a imensidão entre a primeira e a última.

você é um princípio etílico

o abismo que me entrego

meu enleio

meu engodo

a densidão que

quando embebeda a minha boca

me preenche em água.

o modo-distinto:

Eu Amarula, você Absinto

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jaisy cardoso
Revista Mormaço

escrever é a minha contradição. às vezes, nomeio devir, sempre lhe chamo deleite.