Gravidade sazonal

Jorge Borges
Revista Mormaço
Published in
2 min readDec 20, 2020
Disponível em tumblr.

Lá por meados do outono
Senti todos os Gs da gravidade
Que, à época, me cava e derruba.
Deixei que caísse
A chuva, a lágrima, os ombros
Pro céu limpo do dia seguinte à tempestade fazer mais sentido.

Sentido este que me ajudasse a recuperar esse buraco
Aberto em meu peito pelo inverno
Frio, pavimentado em cinza, liso e estéril.
Tão frio que nem mesmo um bafejo aquece,
Uma caneca, uma manta, um abraço;
Talvez um abraço.

Que me ajudasse a reviver as estações passadas, ter o que lembrar…
Lembrar dos dias em que a gente já foi feliz e já riu dessa bobagem toda.
Que ao primeiro sinal de primavera brotam-se as flores em sinal de resiliência
Onde a gravidade, que antes pressionava-me o corpo num peso descomunal,
Possa ser meu auxílio em plantar os pés bem fundos no chão
Para sentir apenas o que preciso sentir, nenhuma força a mais ou a menos.

Até que chegue o verão e eu possa sair do casulo:
Sentir novamente o ar, ver meus amigos num bar
Rir de nossas crises, apontar as nossas metamorfoses
Conversar sobre coisas banais e sobre coisas sérias também
Amenizar o calor num banho noturno no Porto da Barra.

Mas enquanto essa estação não chegar, o jeito é esperar,
E penso que se nada de mim sobrar até lá
É por que invariavelmente nada sobrará
Do incidir devastador
Da gravidade do tempo.

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