jura de Amor

Laize Ricarte
Revista Mormaço
Published in
2 min readMar 14, 2021
Undine, 2020

toda vez que você chega, eu pressinto a sua partida. gosto mais do calor que emana da minha cama depois que vai embora. gosto mais do cheiro que deixa no meu travesseiro, no meu cabelo. gosto de lembrar do que disse e rir sozinha, rindo mais do que quando as palavras saíram de sua boca. vou mudando o tom, deixando as palavras, os gestos e os olhares nos meus conformes. assim tudo o que disse, fez e foi já não importa. o que importa é o que eu criei de você.

desapareça, suma, se afaste, mas não totalmente. apenas o bastante para que eu não me esqueça de você; o suficiente para que eu invente o que não me lembro. é bom assim. me conforta. nunca gostei de nada que fosse real. apareça, cole, grude em mim, vamos ser um só. vamos nos perder um no outro até que eu não saiba onde eu termino e você começa.

a vida é muito mesquinha, tira muito cedo da gente a capacidade de sentir com toda força. acho que ainda sou aquela menina pequena que sofria a cada despedida. ainda sou a filha que chorava toda vez que a mãe ia embora, achando que ela jamais voltaria. talvez eu deva deixar de ser criança. deixar de olhar tanto pro céu, pro espelho e pro umbigo. meu umbigo, seu umbigo.

me afoguei prendendo o choro, desaprendi a respirar e prendi o ar até perdê-lo. inspiro, como num susto de quem se lembrou estar viva. não serei mais esse alguém orgulhoso, perdido no próprio gozo, nesse desejo de não-viver. serei a terra em encontro ao mar, o sol da manhã esquentando o meu rosto, serei a água que bebo, o que como e as palavras que ouço, as palavras que sigo. é uma promessa a mim mesma, de ser fiel ao que eu inventei de mim.

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