Mais cinco minutinhos

Era assim, todos os dias.
A luz entrando devagar, quase como que pedindo licença. Eu abria apenas um olho. E mesmo que não abrisse, já sabia.
Não foi uma vez, nem duas. Não era de vez em quando e nem mesmo quase sempre.
Todos os dias. Você se levantava antes do sol. Não queria esperar, nunca quis.
Eu te adivinhava, adivinhava sua ausência programada. O sol me avisava. Mais cinco minutinhos, pedia.

Até que.

Havia um rastro, sim.
E mesmo com um olho só, eu te via. No lençol amarrotado que pendia aos pés da cama. O travesseiro manchado do seu suor, ainda morno. Há quinze anos o mesmo travesseiro fedido, sem capa de proteção. E o barulho do chuveiro.
Sim, você estava.
O chuveiro quentíssimo, o vapor quente do banho. A umidade.
Você existia ali. Aqui.
Na cortina semicerrada que você deixava para que o sol entrasse devagar. Para que não me invadisse, não me violentasse. Mais cinco minutinhos, eu pedia.
Existia você, sim.

Até que.

O sol não nasceu, esqueceu de se levantar.
A cortina arreganhada mostrava o céu cinza que preferiu não tomar partido. A chuva também não veio, o tempo não gosta de clichês. O vento não compareceu e cedeu espaço ao mormaço de uma manhã sem graça.
A umidade que não era do banho. Uma umidade sufocante veio me lembrar que não.
Não mais.
Todo dia, menos hoje e amanhã. E depois. Todos os dias até hoje, até que.

Até que não.

Hoje eu já não sei. Se você esteve aqui ou se era meu o lençol caído ao pé da cama. E será que ouvi mesmo o chuveiro ou eram as gotas de chuva? A umidade que nunca mais senti, porque já não me esqueço de fechar as janelas. Nem as cortinas.
Mais cinco minutinhos, eu pedia.

Só mais cinco minutinhos.

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