os arranhadores de céu

Larissa Lima
Revista Mormaço
Published in
2 min readJul 18, 2021
@onkarlele

alterno entre um trago e uma palavra escrita.
sinto coisas no corpo que não me peça pra explicar se são sinais de vida ou de morte.

o lance é que me inveja a segurança daqueles meninos
que debruçados na janela sem grade do 16º olham pra baixo como se a distância entre o chão e o corpo não representasse risco algum.

como eu, eles também estão tragando alguma coisa.
acho que sabem da fragilidade que é aquela sobreposição de concreto que os sustenta no alto
e os fazem quase tocar o céu.
se levantassem os olhos veriam que estão bem perto.

no mesmo campo de visão
um rapaz bulindo numa antena.
mas de cá o vejo em cima do topo das árvores que o rodeiam e fazem pano de fundo pro afazer atropelado pelo dia a dia que nem hífen tem mais então nem precisa fingir que a gente respira após cada um que passa.
assumindo que logo tudo não escapa de uma desenfreada emenda entre cores distintas de céu.

os meninos e o rapaz às alturas.

às alturas de si

na beira de imensidões sem bordas
mas contidos nos seus próprios corpos
e afazeres
e distrações.

é que a gente se acomoda com a própria vista.

busca então outro cenário que encha os olhos
ressecados
com a distinta mesmice de cada dia.

as antenas e o sustento do rapaz
e a falta de telas que segura os menino.

arranha-céu foi só um nome
que o concreto inventou
com inveja
pra parecer mais próximo
e fingir que é vivo.

agora eles vão se sentir mais pesados
cada qual com um pedaço meu.
mas dizem que o não saber também pode aliviar peso
então que sorte a deles.

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Larissa Lima
Revista Mormaço

escrever é como cachoeira que sustenta a própria queda.