Paralelepípedo

Alessandro Padin
Revista Mormaço
Published in
2 min readOct 3, 2022

Paralelepípedo
Meu palavrão da infância
Inocência
Para lá o tempo da Memória
Paralelepípedo
Da bola que bate em seco nos gols caixote sem proteção
Primeiro contato com o mundo
Do tampão do dedo que abre em pus, sangue
Que tão cedo expôs os limites do corpo
Paralelepípedo
Que imune ao tempo
É quente, ao mesmo tempo seco
Úmido, impermeável
É taco, taco, taco…bola de tênis no alto
Lá andou Isolina, Carmem e Odila
Lá anda quem não sabe o que teu passado inspira
Lá andou também Toninho
Cortando a rua da calçada esquerda para a direita, atravessando o paralelepípedo
Saco de pão quentinho da mão
O beijo no rosto, o roçar da barba, o gibi dobrado no bolso
Uma música caipira sempre ecoando entre um intervalo e outro do Jornal Nacional.
Guarda entre os teus flancos
Paralelepípedo
A memória do homem, passando, presente, futuro
Gratidão
Paralelepípedo
De hoje para sempre Emerson
Que por lá andou de boné na cabeça, exigência do pai
Cuidado com o sereno, correndo sempre atrás do Dunga, o vira-lata branco e preto
Depois, homem feito, o sorriso fraterno, a pureza única
destroçada por uma doença corea dentro do cérebro
Mas, paralelepípedo, também guarda o teu sono eterno
Como um sorriso pra lá de sincero
Aqui no lado do esquerdo, no meu coração.
Paralelepípedo
Ninguém nunca te fez uma ode, um soneto, um versículo
Mas, pensa bem,
Você guarda o que há de melhor em mim
Enquanto
Sobe muro, corta árvore, passa ladrão
Os caminhões do grande mercado racham as paredes do velho caminho que não conduz a lugar nenhum.
Só você guarda o segredo do inverso e do progresso.
Só você, paralelepípedo, guarda o eco do violino que vinha do fundo da rua
Só você guarda a foto do que foi o velho menino.

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