pela janela

Beatriz Helena
Revista Mormaço
Published in
1 min readMay 2, 2023
Sunset, Sorrento Thomas Fearnley - Norwegian, 1834

Escrevo à janela
Algo pequeno
Invisível
E maciço
Que se vai.

Vai embora,
Não tenho tato
Para o escuro.

Não há corpo
Que suporte a teia,
A aranha feia,
O sufoco da sombra.

Vai embora,
Não me reconheço
Debaixo do leito
Alheio.
O monstro não está,
Não estou em mim
E não seria eu o monstro
Sem este buraco negro
De falsaria.

Vai embora
distorção da imagem,
emaranhado de impressões sem digitais,
vaso abandonado,
terra de ninguém.

É tudo mentira
Que não contaram.
mesmo assim
veio turvo,
atravessou verdade.

Vai embora,
aperto de nó cego,
capa de chuva sem chuva,
pedaço de coisa alguma.

Desenovela
O peso
Vai embora
Certeiro
que o ar é o lugar correto
de tudo mal vivido.

Dentro
não se acomode
coisa infundada
do monstro debaixo da cama
que não sou.

Silencioso
sólido
derrete
a coisa feia
que não deveria ser.

Vai embora
Expandindo
Esvaindo-se.

De dia é culpa
De noite, todo o resto.

Vai embora, eu fico.
Sossegada
sozinha
à janela,
as casinhas,
o vento,
nada
e ninguém.

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