Quantas danças cabem em um equívoco?

Thaíla
Revista Mormaço
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3 min readJul 14, 2022
Foto: Thaíla Campos — Pichação, Argentina 2022 “Em primeiro lugar, a dualidade”

Aviso Legal: Esse vai ser um relato completamente parcial, porque às vezes em vez de usar caneta a gente usa o afeto para escrever e fica meio confuso mesmo, por tanto não dê uma gota de confiança no que vai ser confidenciado daqui pra frente.

Pela vida nos esbarramos menos do que eu realmente gostaria, mas sem precisar confessar nada era inegável o carinho que inflamava a cada encontro, me levava a agradecer a existência de todas as borboletas — nos estômagos ou fora deles. Só de pensar subia um arrepio da ponta do pé até a ultima fibra do coração — não deixava subir pra cabeça, vai que o cérebro decidia dar uma de razoável — e era um querer tão gostoso que nem precisava ser dito, era melhor que não fosse, inclusive. Falar exige pensar, envolve fazer escolhas e consequentemente perder coisas. Antes dessa não-relação tinham outras pessoas na frente, do lado, em cima e em baixo. Cada um tinha alguém para chamar de seu, e ninguém estava disposto abrir mão disso, ou de qualquer outra coisa.

Naquele dia caímos juntas em uma dessas saídas não programadas, com pessoas inesperadas, para lugares que não estavam no roteiro — que roteiro? — que só mesmo quem tem menos de 30 anos vai achar que é uma boa ideia. Qualquer coisa que acontecesse depois era lucro, ou desespero. Bebida quente e mais gente do que cabia. Se tocava forró ou samba ou salsa, não era do nosso interesse, estávamos ali apenas por nós, e por aqueles minutos que uma pele encosta na outra com a desculpa de “guiar a dama”.

A respiração falava por si só, mas o desejo de colocar em palavras foi tanto que sem perceber já estava no quentinho do seu ouvido dizendo que era tudo muito, muito, muito (e quantos muitos mais coubessem) complicado e ouvi de volta um eu sei, mas às vezes dá vontade de fazer uma loucura. Chegando de voadora no meu estômago, a possiilidade real do ato me fez cuspir para fora todas as borboletas. Não existiam palavras para colocar depois disso que não fosse levar a uma enxurrada de outras questões, absolutamente nada mais cabia no espaço entre minha cabeça e seu ombro. O depois, acredito, não pertence a mais ninguém, quase que intangível até para a gente.

Naquele momento eu amei na velocidade que o rosa desbotou do meu cabelo semanas depois, e nunca mais tivemos nada. Na verdade, não tivemos nem isso. Volta e meia a vida acontece e reconquistamos esse lugar de quase conhecidas que se gostam muito. Só que nessa brincadeira que inventei e chamei-a de vida, você também faz parte, e agora mesmo ando enlaçada no achismo de te querer — de novo.

Com sorte nenhuma das duas é mais a mesma pessoa.

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Thaíla
Revista Mormaço

Baiana de Salvador, psicóloga de formação, psicanalista de desejo e escritora de gaveta.