sentimento de açude

Larissa Lima
Revista Mormaço
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2 min readApr 20, 2021
captura própria

os meus pelos crescem com a mesma velocidade que as minhas olheiras escurecem. só perdem pra minha respiração. ligeira e cortada. como o órgão que bombeia entre os meus peitos.

carrego um sentimento de açude. palavra que me invadiu e não sei nem de onde veio. malmente sei seu formal significado. barreira obstáculo obstrução represa construção. me facilitou o livro de palavras miúdas.

sentires represados mas também construídos. ao mesmo tempo que não. se sinto como cachoeira não posso caber num açude. nada que escorre vai pra lugar nenhum. então que seja pra comportar, se tenho que me conter em algum lugar e só escapo pra lugar algum.

e tá tudo tão nem quente nem frio mas também nem morno então tão nada sem arrepio e sem suor, que até a música fugiu de ser termômetro pra testemunhar meus dias mais bom humorados. e agora se confunde entre ser escolhida por vazio, melancolia ou vez em quando um pingo seco de emoção.

vivo escutando minha vó contar sobre suas diferentes gasturas. são diárias. e tantas e as mesmas. como as minhas diferentes querências e carências. sobre as quais me engano e me encano igual.

cura-ação. duas palavras combinadas quase coração. e o que seria o coração senão a cura em ato? mas eu disse quase porque nada é coração sem quase. se assim o fosse, poderia chamar de software. logo nada teria de vivo e vacilante.

apois de onde viriam as arritmias e paradas e palpitações e tudo isso que também me afoga se eu não fosse quase tanta coisa que de tanta falta não cabe em canto quase nenhum?

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Larissa Lima
Revista Mormaço

escrever é como cachoeira que sustenta a própria queda.