Vigília
A gente costuma dormir meio engraçado —
pernas entrelaçadas, costas pressionadas umas nas outras
um jeito que até já virou hábito.
Quando faz frio —
a tal da conchinha,
[de classificação indicativa livre]
nos alternando,
a cada hora,
pelo papel
de “concha maior”.
Quando faz calor —
cada um busca seu esconderijo
em um dos hemisférios da cama
respirando e suando
l e n t a m e n t e
interligados, apenas,
pelos pés em nó.
Ao longo da noite, sinto
as reviradas,
espasmos
estremecimentos
do seu corpo;
enfrentando monstros imaginários,
despencando das torres mais altas,
abraçando minha cintura — meio que atrás de proteção.
[Só que os seus pesadelos nunca parecem te assombrar uma vez que você acorda —
— Eu, por outro lado,]
desperto a cada manhã
tendo sobrevivido a mais uma noite
te perdendo
nos pesadelos
mais terríveis
e melhor arquitetados.
Suspiro, aliviada,
ao sentir o peso do seu corpo
dormindo, tranquilo, ao meu lado.
O nascer do sol suspira, gentil, nas minhas sardas
devolvo o suspiro e percebo e repito:
“foi só um pesadelo, só um pesadelo, só mais um sonho ruim”
A cada manhã,
torço pelo momento
em que você entreabre os olhos,
[mel escorrendo, semicerrado, pela suas pálpebras]
se enrola preguiçosamente em mim,
beija o espaço entre meu ombro e pescoço
e me alivia dessa sede infindável
de ti.
Ô, meu bem,
é que piores são as noites de verão que não te tenho ao lado
pois pesadelos são, acima de tudo, persistentes
e não existe conforto algum em acordar
[sozinha e suada]
sem você pra me resgatar
do mormaço da vigília.
(…)
“Cuidado ao entreter meus desejos oníricos —
você pode acabar se tornando um deles.”
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