ONDE ESTÃO OS PRETOS RETINTOS?

Coletivongunzo
RevistaNgunzo
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3 min readJul 19, 2023

Por Chico da Silva

O título desse texto é um ponto de partida para pensarmos em algo que nos custa muito caro até hoje, isto é: A mestiçagem. A discussão sobre a mestiçagem no Brasil é longa. A primeira coisa que devemos ter em mente é que: desde o Brasil colônia, a mestiçagem sempre foi uma política de extermínio da população negro-africana. Quando falamos em “política de extermínio”, queremos falar sobre uma prática racional, bem pensada, estruturada e muito bem trabalhada para matar uma população aos poucos. São muitos os intelectuais dos séculos XIX e XX que concordavam que a única forma de livrar o Brasil da “mancha negra” era por meio da mestiçagem.

Sabemos que quem “muda” essa visão é Gilberto Freyre quando instaura a noção da mestiçagem cultural (mistura de culturas) como algo positivo, algo que faz o Brasil ser um grande caldeirão cultural. A grande questão é que essa mistura nunca foi positiva para a população negra brasileira, pois a cultura portuguesa, francesa, holandesa e espanhola, nunca olhou para esse povo e viu alguma cultura neles. Por isso, Abdias do Nascimento, grande intelectual e político negro brasileiro, em 1978 lança um livro “O Genocídio do Negro Brasileiro”, no qual, pela primeira demonstra que essa mestiçagem positiva de Freyre sempre foi um racismo mascarado, pois escondia o de fato era: um Genocídio. O Racismo no Brasil sempre foi um processo de extermínio e ele age, silenciosamente ou não, pela mestiçagem.

Infelizmente, mesmo depois da denúncia de Abdias, ainda hoje caímos na mesma lógica, muitas vezes sem perceber ou, simplesmente, porque nos acostumamos já. O embranquecimento da população negra nunca cessou, ela continua e é cada vez mais complexo. Seja na cultura: a aceitação cada vez mais massiva de Brancos em nossos espaços (até mesmo dentro do movimento negro), seja nas relações afetiva (relações interraciais). Mais intensivamente andamos aceitando o Branco, criticamos ele continuamente para lacrar, gerar polêmica e afins (branquitudade e tudo mais), mas criticamos para justificar ainda mais (de modo até masoquista) sua presença em nossas culturas.

Abdias fez isso: Criticou o processo de branqueamento, denunciou o Genocídio do Negro Brasileiro, mas no final casou-se com uma branca que tomou o seu legado todo para ela, tirando ainda o fato dela ser aceita pelo movimento negro (integracionaista) quase como uma branca de alma negra. Ele não foi o único, o grande Cheik Anta Diop fez o mesmo, bem como Franz Fanon. Contradição ou justificação? Não estamos negando o legado desses grandes ancestrais, mas só demonstrando suas contradições. E esses são apenas alguns exemplos, pois existem muito mais.

Tais exemplos demonstram como a mestiçagem ainda é uma política viva, mesmo naqueles que a mais criticaram. Hoje em dia ela se complexifica e faz com que nem percebemos suas estratégias de extermínio da “mancha negra”, é só parar e analisar um pouco: Quantos pretos retintos você vê nos espaços que ocupa? Pode contar. Até mesmo nos espaços pretos. Já parou para analisar isso? Se não, aí já começa o problema, pois a estratégia do genocídio é real e anda dando certo, pois se a população brasileira é composta mais pela metade de gente negra, onde estão os mais escuros? Sabemos a resposta: sendo mortos, sendo clareados. O que estamos fazendo para mudar isso? Aceitando ainda mais o branco, reconhecendo-o como um parceiro, companheiro e afins. O Genocídio nunca cessou, a gente que se cega e ele nos cega. Por isso, é importante que voltemos a enxergar e ver que o Racismo não é sutil porque ele é brando, ele é sutil porque ele extermina silenciosamente.

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