É necessário estar preparado

Arokin Akasia
revistaokoto
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6 min readJan 19, 2021
Ilustração: Izaias Oliveira

O contexto da Revolução do Haiti é que havia uma cenário de destruição à moda antiga dos brancos: O Sistema Escravocrata Colonial. Como se sabe (entre os que querem saber sobre) o Haiti foi invadido por europeus em épocas distintas, os espanhóis primeiro em 1492 e papo de 40 anos depois os franceses chegaram também. A partir daí foram aportados afrikanos escravizados do da Costa Oeste Afrikana nas praias Haitianas do Atlântico para colocarem em prática o propósito de destruição deles, como sabemos também yurugus são viciados em destruir e dominar, forçando-os a trabalhar em prol do propósito deles.

Mas avançando e tendo resultados maiores em sua revolução em relação às outras revoluções pretas de outras colônias européias pelo mundo afora, o Haiti obteve grande êxito e foi declarado independente em 1º de Janeiro de 1804 por Jean Jacquees Dessalines. Este grande evento é, sem dúvidas, um dos mais importantes, históricos e levado como referência de luta para população afrikana no mundo, tanto diaspórica quanto os que permanecem na Áfrika, sendo a primeira tomada de poder efetiva de um país a partir de uma luta racial, onde os negros em diáspora se uniram contra os colonizadores europeus. Eliminando os yurugus do lugar (seja por morte seja por expulsar do território da nação alguns vivos), abolindo a escravidão e abolindo o segregacionismo racial se tornou a primeira Nação Negra liberta das Américas e do mundo.

Desse fato há exemplos a serem seguidos, contribuições positivas para aprendermos, e também alguns exemplos não efetivos (sempre de tentativa de integração…) que também nos servem de aprendizado para o que não fazer/ser.

Entretanto não gostaria de centrar este papo nos resultados ou mesmo na execução do plano. Uma coisa importante a se refletir a partir desta revolução é que todos os envolvidos à favor da revolução estavam unidos e centrados neste propósito, não era apenas um desejo, um sonho, algo que gostaria de realizar. Mas tinham ciência que deveriam realizar e acreditavam que iriam realizar isso. A libertação não podia ser um sonho estático, sem forma, a libertação era uma necessidade latente de uma população diaspórica inconformada com a humilhação que é ser feito de escravo. Ainda mais para um povo tão preguiçoso, sem criatividade, perverso e egocêntrico como os yurugus.

O que fez com que os resultados fossem tão satisfatórios e grandiosos além (ou a partir?) deste processo mental e emocional explicitado acima foi que todas as preparações para execução dos planos foram realizadas com cuidado, atenção e comprometimento. Não há momento mais importante para realização de algo do que a etapa de preparação, o ebó.

Se Makandal não tivesse mantido seus conhecimentos sobre ervas afiados, passado esse conhecimento para outros afrikanos, se estes não tivessem recebido o aprendizado com atenção, teriam tido êxito em eliminar os negros da casa? Teriam enfraquecido 6000 soldados?
Se Cécile Fatiman não tivesse feito correr pelo território o plano de revolução, convocando cada vez mais combatentes e revolucionários durante 4 anos teriam acontecido o ritual Bwa Kayman? E mais ainda nisso, se ela e todos os outros não tivessem tido paciência no fortalecimento do povo com o que tinham no momento, se tivesse largado no meio porque “é muito tempo para esperar” ou por “a situação já estar desesperadora demais” ou “por não termos os recursos para isso”? O que teria sido de todo o levante?

A gente hoje vive no contexto de um sistema mais cínico, mais burocrático e menos escancaradamente bárbaro à todo e qualquer negro, essa balela aí de “democracia” onde a forma de dominação para completar o processo de embranquecimento da população afrikana diaspórica é a partir da subjetividade. Isto, daqueles que já não estão encarcerados, sendo assassinados antes da adolescência ou ainda em condições de escravidão em casas de classe média de Minas Gerais ou mesmo do Rio de Janeiro. Portanto o trabalho tem sido em cima da subjetividade, autoestima, confiança, etc e etc, fazendo com que os pretos acreditem que somente com ajuda dos brancos serão todos feitos livres — disseram os negrescos palmiteiros gastadores de dinheiro para conquistas pessoais em posts nos instagram aproveitando mimos de empresas racistas.

Enquanto no início da Revoluação do Haiti nós temos como um grande exemplo a eliminação dos negros da casa, “bafiotis”, assimilados, pois acreditavam que estes seriam os primeiros a traí-los para garantir seus benefícios individuais, muitos pretos hoje “metido com esse negócio de militância” muito bem mal instruídos nas escolas e universidades brancas e também em cursos negrescóides de antiracismo e outras bobagens dessas mostram o porque dessa decisão. São estes que estão acolhendo os brancos para seus espaços, são estes que estão sendo utilizados de bode expiatório para figuras públicas racistas (lê-se brancos quaisquer) limparem a bunda suja desde o nascimento pela herança do racismo que os beneficiam até hoje, tornando-os “brancos aliados” quase que vacinados contra comportamentos racistas com a vacina Antirracismo-20.

Dutty Boukman, grande líder da Revolução tendo executado sua parte em 1791 e sacerdote Vodun, foi responsável pelo início da luta por libertação do Haiti, apenas sendo o que veio à frente, existiam outros ali que cultuavam vodun, muitos que sabiam técnicas de luta por terem feito parte do exército em suas nações antes de terem sido capturados. Diz-se que na memorável noite do Bwa Kayman Boukman encheu os espíritos dos outros revolucionários respondendo-os que eles eram seus próprios líderes, seus próprios generais, que os guiaram nesta batalha.

Eles se prepararam eliminando todo e qualquer traço de branquice e se fortalecendo em bases pretas para concretização do objetivo. O Bwa Kayman foi o último momento do ebó daquele momento da revolução onde uma noite anterior todos se alinharam espiritualmente e fisicamente entre si, buscando forças a partir de rituais para Orixá (especificamente Ogum), se conectando com a natureza e se reafirmando enquanto um povo poderoso e capaz de realizar a libertação. Alinhados na tríade mente, corpo e espírito, estavam prontos para a batalha.

Quantas desculpas o povo não dá pra não realizar algo em favor do povo preto? Quantas coisas, projetos etc são feitas para o povo preto que param no meio do caminho por terem começado com ebó incompleto ou errado? Gente querendo ocupar espaço brancos, é gente querendo capacitar branco com diploma e carga horária extra pra faculdade em como não ser racista alegando de pé junto de que isso libertará o povo preto.
Enquanto isso os mesmo vivem amedrontados em suas casas grandes particulares afrocentradas protegidas por suas espadas de são jorge a cada notícia de atrocidade contra nosso povo que continua a acontecer, permanecem com seus corpos estáticos (exceto seus dedos que digitam noite e dia) ao verem no noticiário o remonte do país (o que tá acontecendo não é um desmonte do território, mas isso é papo pra outra hora) se sentindo incapazes de realizar qualquer coisa.
Sentimento de incapacidade de realização não é um princípio preto, ausência de autoconfiança, autodeterminação e de propósito para comunidade são traços de embranquecimento extremamente caros à população, tirando poder de reação física, da reação subjetiva — pois não conseguem nem pensar em sair desse buraco -, tirando o poder de poder! Mas também qual é o ebó que estes fazem? Se eu estou vendo uma tempestade vir em minha direção não vou ficar olhando, vou catar minhas coisas da praia e ir embora, se percebo que vou cair numa briga com alguém, que eu esteja pelo menos preparado pra correr e me preservar!

E antes de fechar a conversa, um fato interessante sobre a Revolução do Haiti que é comum a todos os momentos e lugares de dominação de brancos sobre povos pretos é que estes nunca estão esperando que haja uma reação, já estão tão acostumados com o poder que não esperam revolta alguma. Dos brancos que se fingem de aliados apesar de “perceberem” que são privilegiados neste sistema, não fazem nada para mudar, tirando samba de esquerda e coisas do tipo. Este contexto de falsa superioridade e falsa sensação de segurança que foi a ruína dos brancos no Haiti.
Sabendo disso, os envolvidos se preparam da melhor forma para início do plano que foi estopim para a independência anos depois.

Por fim, deixo como motivação a prática de estar sempre preparado, constantemente fortalecendo seu espírito, sua corporeidade, sua intelectualidade, organizando-se em comunidade. Se o contexto é de constantes ataques a nossas subjetividades, de nossas crianças, aos corpos dos mais ameaçadores para o estado, tu vai ficar parado que nem um dois de paus? Camarão que dorme a onda leva, preto que não se prepara yurugu abraça.

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