A necessidade dos opostos
Estava aqui refletindo o quanto atravessamentos raciais de vivências, faz a gente ir se encolhendo, se diminuindo até sumir de vez da cena.
Nos últimos anos eu ouvi muito isso:
“ Tu não vai lançar um livro?”
“Esperando seu livro!”
“Isso dá um livro!”
E eu nunca consegui visualizar…
Eu? Um livro meu? Imagina…comentam porque querem ser gentis…eu não sou escritora…só escrevo algumas coisas gente. (risos)
Agora tendo que juntar todo o meu material para colocar no site, eu estou perplexa com a quantidade de textos que já produzi!
E ao ouvir o papo de um brabo sobre não deixar esse “molde racial” nos limitar, e impedir que falemos em voz alta do nosso valor e potencialidades, eu digo que:
Eu definitivamente SOU UMA ESCRITORA.
E das boas. Risos.
E eu vou sim lançar livros!
Que já visualizo na prateleira:
Autora:
Akilah Raawiya Òkòtó
Bacana essa história né?
Mas até chegar ali, foi um longo processo, uma longa caminhada…
E essa restauração, nos leva a batalha da criação; a história de Ausar, Auset, Seth e Heru.
Não cabe aqui entrar em detalhes, mas como acontecimento principal, temos Seth, o irmão invejoso que assassina Ausar, divide seu corpo em 14 partes e as espalha por Kemet. Auset, a viúva, sai em busca para juntar todas as partes novamente.
Seth representa a desordem e o caos. Ausar representa a ordem e a harmonia.
Enquanto pessoas africanas em diáspora, fomos despedaçados tanto quanto Ausar, e precisamos fazer o mesmo movimento de reconstrução que Auset fez.
A busca por essas partes seria a retomada dos nossos nomes, da nossa espiritualidade, da corporeidade, da nossa história, da nossa cultura…
Assim como Auset não encontrou todas as partes, nós também não encontraremos, mas o que conseguirmos reconstruir, será capaz de nos fazer acreditar que podemos realizar por nós mesmos novamente.
E será fácil? Haverá forças contrárias a este processo?
A resposta para a primeira pergunta é não e para a segunda é sim.
A partir de uma visão de mundo ocidental, aprendemos que aquilo que se opõe deve ser eliminado. Foi exatamente o que os brancos fizeram ao entrarem em contato com nossa espiritualidade. Seth nas religiões brancas passou a ser representado por Satã. Aquele que deve ser destruído.
No entanto para nós africanos, o universo só pode funcionar em equilíbrio.
Existe a necessidade dos opostos. Ordem e desordem. Harmonia e caos.
Ao final a harmonia vence o caos, e a ordem vence a desordem.
Mas para que essa batalha aconteça, é preciso que os opostos coexistam.
E é nas dificuldades, nos movimentos de resistência, que devemos assumir a energia de vencer aquilo se opõe, e assim possibilitar a criação de qualquer coisa que nos proponhamos a fazer.
Isso é o equilíbrio universal. É espiritualidade africana.
Reconecte-se.