Caminhos e descaminhos

Kianga Hwanjile
revistaokoto
Published in
4 min readSep 30, 2021
Ilustração: Acacio Òkótò

Imagina que você tá dirigindo numa estrada com pouca iluminação à noite. Até chegar em um lugar onde você enxerga duas direções, então, tem que escolher uma delas para continuar sua viagem, e você escolhe e segue, achando que fez a melhor escolha.

De repente, chega numa parte do caminho e o asfalto acaba, a estrada fica esburacada e você com dificuldade na direção, então você para e pensa: sigo por este caminho ou volto e tento ir pelo outro? Enfim, você talvez não consiga mais seguir, pois até chegaria ao destino mas com o carro todo quebrado e a vista cansada. Então, você resolve voltar, mesmo que vá demorar mais pra chegar. De volta a bifurcação do início, o outro caminho está interditado por uma obra, e agora?

Bom, dessa vez é dia, o sol raiou, sua visão está melhor, então você olha e descobre um outro caminho além dos dois que você viu quando estava à noite. E você segue por ele, mesmo sabendo que o outro (que agora está interditado) poderia ser o melhor, mas talvez esse caminho não será tão ruim quanto o que você pegou anteriormente, você então segue até chegar ao seu destino.

Essa historinha foi só pra ilustrar o que vou dizer agora.

Estava refletindo sobre sofrimento e caminhos, escolhas e decisões. Eu mesma já não quis voltar atrás várias vezes em algumas escolhas que estavam me fazendo sofrer, pois achei que depois de uma decisão tomada não existiria o caminho de volta.

Nota: Tem um itan de Orunmilá e Exu, no qual Orunmilá vai visitar um reino, só que ele não fez direito o que devia ser feito antes de ir, então ele se perde. E Exu como bom amigo (risos) começa a indicar caminhos para o reino, porém Exu na verdade estava deixando Orunmilá mais confuso. O caminho de volta para Orunmilá seria voltar e jogar novamente até ter a certeza por qual caminho seguir, mas ansioso decidiu ir mesmo assim e deu no que deu.

O caminho de volta sempre vai existir, o que não é garantido é que aquele outro caminho que você deixou de ir, ainda estará disponível. “O tempo passa e a folha vira”. Uma hora o caminho tá aberto, outras ele se fecha pra você. Porém num momento de decisões anuviadas com pouca claridade deixamos de enxergar que talvez existiriam outros caminhos e não apenas os dois que enxergamos, às vezes existem 3, 4, 5, um monte de novas possibilidades.

O caminho do sofrimento nada mais é do que aquele caminho onde não sabemos lidar com o que ele nos trás, e tudo bem não saber lidar, tu pode voltar, tu pode aprender a lidar e depois retornar, são várias possibilidades.

Refletindo sobre sofrimento, no meu curto entendimento, a gente sofre por coisas que ainda não temos inteligência emocional pra lidar, por exemplo, quando alguém morre e a gente sofre muito, é porque ainda não aprendemos a lidar com a morte. Ficar triste é normal mas se prender ao sofrimento é não saber lidar com a parada.

Uma boa saída para isso é trabalhar nossa espiritualidade em conjunto com nosso emocional, pois é ela que nos auxiliará a lidar com as adversidades, saber o que fazer e como agir em determinadas situações. Eu ainda não tenho inteligência emocional pra várias coisas, mas trabalhar a espiritualidade ajuda até a saber onde tem goteira quando chove.

Por fim, comecei falando de caminhos e terminei falando de sofrimento e espiritualidade, mas se você parar pra analisar tá tudo interligado. Pois até para você reconhecer que sofre naquele caminho que escolheu é necessário ter inteligência emocional. Até pra você decidir voltar ou seguir, você precisa estar firme pra aceitar os custos de qualquer escolha. Aprender a lidar com as adversidades, escolhas, vontade, desescolhas, descaminhos, exige maturidade emocional, exige que você esteja conectado ao seu axé pra entender o que seu coração pede e aonde ele quer estar.

A gente costuma a achar que é a cabeça que tem que nos guiar, mas na real, é no coração que tá nossa vontade e nosso axé. E é pra lá que a gente tem que ir, seja até pelo caminho do descaminho, pois ir contra seu coração, também é sofrer. Mas veja que, até para saber o que seu coração quer, é necessario saber calar para ouvi-lo, porque, se não, você pode estar insistindo num caminho tortuoso por puro ego ou por achar que seu coração tá ali mas na verdade é puro querer sem propósito. Seu ori e seu coração devem estar em harmonia e equilíbrio.

Seja qual for o caminho que você escolher saiba que existe o caminho de volta, todos eles terão seus custos. Eu escolhi o caminho de volta quando parei de andar no caminho da branquisse, e ganhei novos caminhos que me parecem bem menos tortuosos e sofridos.

Seja pelo caminho ou pelo descaminho, vá, movimente-se. Apenas não fique parado na encruza.

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