Simone Biles e Didico ❤

Thabata Bernardes
revistaokoto
Published in
4 min readAug 31, 2021

Estava concatenando as ideias sobre essa comoção por conta da decisão de Simone Biles e no quanto ela tem sido citada por sua escolha. Já se passaram dias e ela ainda tem passado na minha timeline...

Biles tomou uma decisão que muitos não tem coragem de tomar, abrir mão de status, dinheiro, notoriedade e aceitação dos brancos em um momento de tanta visibilidade. É de fato muito corajoso e louvável. Ter sua imagem ligada aos EUA diante de tantos casos de racismo ao longo do ano é muito corajoso mesmo!

Mas essa comoção das pessoas é o modus operandi de sempre, as pessoas se acostumaram a se projetar no outro, a tal da "representatividade" pegou geral. Até para se sentirem menos culpadas as pessoas entraram nesta onda.

Por Iza Oliveira

Quantos de vocês estão neste exato momento se matando por aceitação? Quantos de vocês não estão ávidos por uma única chance de se integrar ao sistema? Quantos aí não estão se vendendo por troco de bala e vendendo toda uma comunidade? Quantos de vocês não estão agora mesmo pressionados e reféns deste sistema que foi planejado para a nossa completa aniquilação?

Vocês estão com aquele sorriso petrificado, sem brilho nos olhos lendo e relendo a matéria onde Simone teve a coragem de se priorizar, de se valorizar a ponto de arcar com as consequências de suas escolhas. Simone assumiu o risco que muitos de vocês sequer ousariam pensar, porque não conseguem imaginar um mundo onde não se dependa do sistema branco racista. Trabalhar para si, investir em si, ou até mesmo deixar de se pautar em brancos é algo fora da realidade para muitos de vocês!

Pensando ainda em tudo isso, me lembrei do Adriano, o Imperador. Que foi ainda mais corajoso ao se priorizar e aceitou todo tipo de acusações e calúnias a seu respeito. Adriano é um homem preto, nascido na Vila Cruzeiro, uma comunidade localizada no Rio de Janeiro. Lá Adriano nasceu e foi criado, lá ele tinha referência, apoio e a noção de comunidade. E de lá ele saiu para o mundo, o Imperador conquistou o que pouquíssimos homens pretos teve a oportunidade: fama, sucesso, dinheiro, muito dinheiro. Ele ousou ser o Imperador e ao fazer isso se desconectou totalmente de suas raízes, se assim não fizesse, jamais teria chegado tão longe... Adriano tinha o mundo e não tinha a sua comunidade, tinha muito mais que muito preto que se vende e vende sua comunidade, sua dignidade.

Ele adoeceu, assim como Biles, Adriano escolheu abrir mão de tudo pela sua saúde mental. Ele não foi só corajoso, Adriano abriu mão da sua imagem, aquela imagem que ele construiu graças ao seu talento e esforço, mas que infelizmente era a imagem que o sistema ama. E ama capitalizar, Adriano ficou milionário e deixou muitos branc,os milionários também.

O sistema não ia ousar dar tanto sucesso e dinheiro a ele antes de se assegurar que eles também usufruiriam dos frutos desse sucesso. Eles sugaram tudo o que podiam de Adriano e quando ele não aceitou mais ser a fonte de riqueza deles, Adriano virou um bêbado, sua imagem foi reduzida ao que qualquer homem preto é nesta sociedade a vista de muitos. Adriano virou um homem preto comum, bêbado, bandido, louco, irresponsável, inconscientemente...
Assim que ele deixou de alimentar o sistema ele virou um homem que poderia morrer a qualquer momento.

Imperador priorizou sua saúde mental, voltou a ser o Didico, trocou a Europa pelo morro, as grifes pelas bermudas sem camisas e botou os pés no chão. Tentaram a todo custo destruir a sua imagem, tentaram acabar com a admiração que muitos de nós tínhamos por ele, mas muitos resistiram, muitos somos os que aplaudem todas as decisões deste homem, ninguém ousou como ele, perder tudo para ter tudo. Largar tudo é para poucos, muito poucos!

Biles e Imperador são parecidos em muitos aspectos, mas a diferença mais penosa para Adriano, é ele ter nascido um homem preto que não sucumbiu ao sistema.

“Ser o Imperador é fácil, difícil é ser o Didico” ❤️

Eu não sei ao certo se Biles volta a competir, também não sei o quanto ela perde nisso tudo, mas a coragem dela é louvável e não há como negar.

Mas se for falar em heróis, se for falar de coração, coragem e dignidade, chamem o Imperador. Ele dá aulas sobre o que é autogestão, prioridade e senso de comunidade.

Ninguém se escolheu tão bem quanto o Didico, ser o Imperador é fácil, difícil é ser Didico, e nisso aí ninguém há de discordar.

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