Fala Jonguero!

Mayara Assunção
revistaokoto
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3 min readOct 28, 2021
Por Iza Oliveira

Filho de Mestre Jongueiro, Mestre Jongueiro é!

“Beleza, Beleza, Beleza!”

Filho de Mestre Dorvalino de Souza — do grupo de Jongo “Os Filhos de Angola”, da Barra do Piraí/Rio de Janeiro (comunidade do bairro da Boca do Mato), Laudení de Souza veio para São José dos Campos, em São Paulo, disse que daria continuidade ao “Jongo” e aqui firmou tradição.

Nascido e criado dentro de uma comunidade Jongueira, ele aprendeu no dia-a-dia os cantos, a dança, os toques e tudo sobre Jongo, sobre comunidade e sobre família. O grupo liderado por mestre Laudení é formado por famílias. Crianças, idosos, mulheres e homens se organizam nas atividades da comunidade jongueira. O Mestre, de 61 anos, está sempre bem alinhado, de chapéu e sorriso largo no rosto.

“Joguei meu chapéu pra cima,

Meu chapéu parou no ar.

Gritei por Nossa Senhora, ai meu Deus do Céu,

Meu chapéu tornou voltar.

La laiá, laiá laiááá. La laiá Laiá laiááá.”

Mestre Laudení é um verdadeiro exemplo e referência nas comunidades jongueiras em São Paulo. Quando está na roda, ele traz muito movimento. São gracejos, louvações e muita alergia. Ele brinca com leveza, esperteza e muito vigor, está sempre atento e de prontidão. É díficil quem não pare para olhar Mestre Laudení dançando na roda. e por falar em dança, cada comunidade de Jongo dança à sua maneira.

Nas comunidades paulistas é presente “giros” durante a dança em dupla. Já no grupo de São José dos Campos, a dança nos lembra muito mais os passos executados na Comunidade da Serrinha (RJ) do que a dos grupos de São Paulo. É bem presente o “tabeá” (forma de dançar) e a umbigada no Jongo trazido por Mestre Laudení.

Não existe um só corpo e um só formato no Jongo. Existe o corpo negro, do homem negro, que se movimenta com agilidade, malemolência, graça e está pronto para o que vier. O que surgir no meio do caminho é o que precisa ser encarado.

O Mestre organiza, orienta e dança, mas é também o responsável pelos cantos. Canta com o corpo todo. As “demandas” são versos lançados na roda para “provocar”, “chamar”, “dizer algo”. São versados que pedem habilidade de quem canta, pois exige raciocínio rápido, respostas certeiras com boas doses de “graça”.

Quem nunca ouviu, procure ouvir os versados de São José dos Campos embalados pelo “Lê Lê lê lêêê, Lê Lê leiá; Lê Lê lê lêêê, Lê Lê leiá…” O jogo de palavras, as brincadeiras rimadas, as indiretas e as tirações são construídos em segundos e até o próximo “Machado” muita risada e “alfinetada” rola na roda.

“Com tanto pau no mato, embaúba é coroné”

Laudení sempre fala do quanto o canto é importante dentro de uma roda de jongo. Ele ressalta que no período da escravidão, os pontos cantados tinham a função de alertar, passar mensagens, planejar estratégias e era uma das principais formas de comunicação entre os negros. Ainda naquela época, os tambores eram feitos de troncos e depois barricas e acompanhavam as mensagens cantadas na roda.

Não é só sobre querer cantar, precisa saber cantar. Saber a hora do ponto certo, saber rimar no tempo pedido. É ter a percepção para louvar na hora de louvar, para demandar na hora de demandar. Palavra cantada na hora certa é como um tiro bem dado. Aquele papo que já foi dado de que a Palavra tem Axé, movimenta e traz movimento. Nosso Mestre disse que faria e está fazendo.

Inclusive, a comunidade de Mestre Laudení é uma das poucas que bota a boca e aponta “grupos” que surgem, visitam a comunidade e depois ganham editais apresentando “Jongo”. Pessoas que passam a receber por editais em cima das comunidades jongueiras… Mas isso já é papo para aprofundarmos em outra conversa…

Machado.

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Mayara Assunção
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Filha da Dona Rita. Mãe do Adriano e da Amora. De São Mateus. Algumas vezes eu danço, em outras toco e noutras escrevo!