Filhos? Jamais!

Jhené Zahara
revistaokoto
Published in
3 min readJan 25, 2021
Ilustração: Izaias Oliveira

Quando menina dizia com toda veemência que filhos não iria ter! Não haveria possibilidade, sem chances dizia! E toda vez que repetia isso nas conversas em casa, escutava sempre a mesma coisa: — Não quer agora, quando ficar mais velha vai querer! Eu? fazia uma careta como resposta e respondia mentalmente: DÚVIDO!

O terror de gerar uma criança sempre foi muito grande, era como se tivessem tirando meu ar, toda vez que pensava nessa possibilidade. Isso porque escutava em muitas conversas como fulano teve sua vida atrapalhada e sonhos interrompidos depois que teve o filho. Era sempre o mesmo tom de lamúria (com ar de fofoca): Sabe Fulana? Depois que teve o filho se acabou, parou de estudar, e pipipi popopó. Que já sabemos onde vai dar.

Quem vai querer ter filho desse jeito? Para que eu ia querer ter alguém que vai acabar com a minha vida? Se já sabia todo o enredo, para que iria me aventurar? Com todas essas perguntas fervilhando, vi no instagram pela primeira vez o termo maternidade real, onde todo dia você via mulheres (maioria brancas) relatando o quão difícil era ter um filho e quão sozinhas eram ( Um fato que chamou bastante a minha atenção foi de quase todas terem parceiros e família que as ajudassem).

Foram muitas conversas e muitas colegas que mudou o status para mãe incentivavam a não ter filhos, uma vez perguntei num grupo onde havia bastante mães, se elas tinham um conselho para uma menina que havia acabado de descobrir a grávidez e estava em desespero, pois estava sem nenhum apoio no momento, todas me responderam com a seguinte frase: — Fala para ela abortar!

Aquilo me encheu de preocupações, sabemos que crianças dão trabalho, mas os adultos dão muito mais! Como assim, aborta? Aquilo me apavorou tanto que quando minha menstruação atrasou e eu tive alguns sintomas por conta do anticoncepcional entrei em pânico, não dormia, não comia, só existia, comprei vários testes deu negativo, um alívio, porém tinha lembrado que havia bebido. Então, o desespero se instalou novamente e a saga recomeçou, achei fornecedores de cytotec, nem comentei com meu namorado na época sobre a suspeita e muito menos sobre o que iria fazer, afinal iria ser muito ruim para mim, não é mesmo? Enfim, fiz o exame de sangue e realmente deu negativo.

No momento fiquei muito aliviada, não nego, mas depois comecei a me sentir mal, pois como assim eu seria capaz de tomar uma atitude, sem nem sequer considerar o outro lado? Sem nem conversar. Refleti muito sobre meu comportamento, naquele momento entendi que esse medo todo não me pertencia, era o racismo disfarçado de maternidade real, era o medo dos yurugus, trajado de uma ótica torta, que servem para nos aprisionar, castrar, polir.

Eles dizem que sabem que nossos homens não dão conta de criar uma familia, inclusive é assim que inicia as clinicas de abortos (podem ler nesse link aqui https://portalconservador.com/conheca-a-feminista-que.../...), que não temos condições, que a criança é o diabo (na língua deles), eles sentem esse peso, pois nunca consideraram elas como continuidade. Para nós a criança é centro representa a vitalidade, a ancestralidade, nossa continuidade, nossa vida personificada e a vida deve ser celebrada!

Essa galera da maternidade real são como a falsa mãe da Rapunzel, nos contando tantas mentiras sobre a maternidade, como pode ser solitária se você tem uma comunidade inteira te abraçando? Seu vizinho que olha teu filho para você ir trampar, ou sua mãe/pai que fica com as crias, seu esposo que sai para trabalhar, para ajudar no sustento também, como pode ser péssimo? Se em alguma medida tem sempre alguém ali para socorrer.

Esse é o conto mais louco, porque ficamos trancados na torre acreditando que realmente a solução é não ter filhos, que é tudo de ruim real e oficial e nessa estamos só sendo usados para nosso próprio extermínio. A criança dá trabalho, mas existe uma comunidade inteira para educá-la, pois é assim que se caminha em comunidade, esse é o verdadeiro ubuntu.

Então, meninas e meninos procriem, pois a comunidade precisa, é importante que darmos continuidade as nossas histórias, assim seremos lembrados. Não caia no conto da bruxa má , mas conhecida como yurugus.

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