IMAGINAumaNação

Ângelo Òkòtó
revistaokoto
Published in
4 min readMar 22, 2021

Comer bem, se alimentar dá hora, saudável e pá, é do caralho. Mas a brincadeira fica boa mesmo é quando a gente se liga que esse papo de resumir o conceito “alimentação” somente ao que a gente come é superficial e raso, já é olhar os bagulho por uma ótica embranquecida e isolante. O buraco é mais embaixo e bem mais profundo. Como a gente vive falando por aqui, no modo de vida natural Afrikano, que é a nossa referência, tudo tá conectado, porque já é visto de uma forma mais ampla, que vai além das ações específicas e diretas… como também faz o bom capoeira que tenta antever o jogo… tá atento, perguntando com um movimento mas o pensamento já tá na eventual resposta ao que será proposto pelo seu camarada. Aquela máxima, toda ação gera uma reação. Em todos os âmbitos. É uma lei natural.

Ilustração: Lisimba Dafari

É óbvio também que ampliar o conceito de “alimentação” não anula ou torna menos importante cada ação isolada, porque por menor que ela seja, ela tem sua contribuição para o todo e cedo ou tarde entra na balança.

O ponto que eu quero chegar é que assim como o que a gente come é fundamental pra ter uma vida saudável, o mesmo podemos dizer do que consumimos e absorvemos de modo geral, os produtos audiovisuais, o tipo de intelectualidade e valores espirituais são exemplos. Se enchemos a mente com as porcarias que os yurugu produzem, estamos definhando nossa própria saúde mental, quando deveríamos fazer o contrário, nutrir nosso Orí.

Para e pensa no tanto de conteúdo audiovisual de massa que é consumido pela comunidade Preta. Pensa pra além do de massa também. Mesmo os “alternativos” são fortemente difundidos e alimentados por eles. Toda e qualquer representação traz consigo vários signos implícitos e explícitos. Nada é exposto por eles por mero acaso, tudo tem um “porquê” e “pra quê”. De propagandas e ficção à reality shows, tudo tem um propósito. Esses meios de produção sempre foram usados como arma política branka pra manipulação e manutenção do modus operandi que vende uma imagem de superioridade deles em relação a nós. As narrativas, imaginários e premissas acompanham uma subjetividade que nem sempre é reconhecida de cara e na hora, mas sempre estão lá, passam mensagens e deixam registros. O que a gente assiste e escuta, querendo ou não, admitindo ou não, influência diretamente a nossa imaginação.

Ainda sobre imaginação, o ancestral brabo Amos N. Wilson saca uma certeira nesse sentido:

“IMAGINAumaNAÇÃO”

Por essas e por outras temos que botar axé nas iniciativas autônomas, Nacionalistas Pretas, PanAfrikanistas e que promovem o Poder Preto. Esses devem ser nossos referenciais básicos, intermediários e avançados… na essência! sem integração, sem negrescagem e sem massagem. É dessa fonte que a gente tem que se alimentar se pretendemos de fato refletir a essência do nosso Povo.

O FAMAAD (Frente Antirracista das Manifestações Artísticas Africano- Diaspórica) é muito mais do que Pretos fazendo arte. Fazer por fazer, já tem muito negresco fazendo por aí. FAMAAD representa o nós por nós. De Preto, por Preto e pra Preto. Como tem que ser, do nosso jeito, autônomo, independente. Não precisa de aval, apoio ou recursos externos que atendem agendas alheias.

Uma coisa é você trabalhar para ou com uma produtora de negros embranquecidos, outra coisa completamente diferente é você trampar com o Núcleo Oscar Devereaux— Audiovisual e Publicidade, que é uma iniciativa autônoma que entende a importância dos valores inegociáveis da imagem Afrikana. Não é uma instituição que “topa tudo por dinheiro”, o dinheiro é um recurso necessário, mas ele é um meio e não o fim. Quem manja de política e poder, sabe que é o poder que gera dinheiro, não é o dinheiro que gera poder.

Temos que alastrar a visão de mais Blackflix, menos netiflics… se referenciar pelo que nos conecta aos nossos ancestrais, aos nossos sistemas espirituais e nosso futuro a partir de uma subjetividade verdadeiramente Preta. O que mais tem na grande indústria do audiovisual patrocinada pelo branko é desserviço pro nosso povo e entretenimento vazio, que vai contra a nossa consciência racial e estimula a inércia e estagnação. Mó vacilação essa rapaziada aí enchendo a boca pra falar de antirracismo 23:59 e 00:00 fortalecendo as mídias que atrasam nosso progresso. É jogar contra nós na disputa de narrativa.

É totalmente diferente o resultado de fazer um trampo com um produtor que pensa em grana primeiro, no quanto pode lucrar nas suas costas e produzir um som no Hifya Studio, com um irmão de luta que pense em Raça Primeiro e tá na mesma bala, no objetivo de fortalecer os nossos, tá ligado?

O corpo, a mente e o espírito, se fortalecem, alimentam e nutrem do que consomem e ingerem. Querendo ou não, como dito lá em cima, tá tudo conectado. E assim pra fora como pra dentro, onde é investido seus recursos? Seus esforços? Seu empenho? O que te alimenta e te move? Precisamos pra ontem pegar essa visão de não se alimentar e combater os vermes que atrapalham o nosso imaginário positivo e atrasam o Progresso Preto.

Imagine uma Nação !

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