Ninguém tem tempo. As pessoas têm é prioridades

Balogum Manu Yahya Òkòtó
revistaokoto
Published in
3 min readJun 28, 2022
Por Iza Oliveira

Ontem eu tinha todos os motivos do mundo pra não treinar.

Não to falando do treino de capoeira do Òkòtó porque esse é sagrado e não existe a opção de não ir.

To falando do meu treino de musculação.

Todo dia é correria, mas ontem foi mais sinistro: aula pra preparar, gente pra contatar, comprovante pra checar, informação pra passar. Isso só do curso de economia que a gente oferece também pelo Kilûmbu Òkòtó.

Além disso, tive que ir na rua pra comprar as frutas pra fazer o suco que eu vendo pra galera depois do treino.

Ainda tinha que preparar meu almoço e minha janta e organizar outro projeto que estamos desenvolvendo no Òkòtó voltado pra emancipação financeira da nossa galera.

E a chuva atrapalhou mais ainda porque, com ela, eu teria que ir a pé pra academia em vez de ir de bicicleta e o tempo a mais de deslocamento faria eu me atrasar pro treino de capoeira.

Então se eu dissesse pra alguém que não treinei e contasse essa história, qualquer um entenderia e falaria: “po, tem dia que não dá mesmo”. Ainda mais considerando que eu treinaria capoeira de qualquer forma, mesmo com a chuva de granizo que teve por aqui. Então estaria de boa não treinar

Ninguém diria que eu fiz corpo mole.

Mas eu diria. Então mesmo não conseguindo ir pra academia, fiz um treino brabão em casa mesmo.

Esse treino pra mim é inegociável. É sagrado também. Porque se eu permitir que agentes externos me impeçam de fazer o que eu me comprometi a fazer, eu abro brecha pra displicência.

Qualquer pessoa que já tenha tentando criar uma rotina de exercícios sabe que acontece assim: você começa direitinho. Fica um ou dois meses treinando 5, 6 vezes por semana. Até que um belo dia acontece algo que te impede de treinar. Você pensa: “é só um dia. Não tem problema”. Até que acontece alguma outra parada que te impede de treinar de novo. E quando você vê, tá há uma, duas semanas sem fazer exercício, sua dieta já foi pro caralho e o pouco progresso que você fez já foi pro ralo.

É como nos itans de Exu.

A pessoa sabe que precisa sempre alimentar Exu, mas num dado momento ela pensa: “mas já dei tanta comida pra Exu por tanto tempo. Se eu não der hoje, não tem problema.”

E nisso a pessoa deixa Exu de lado… Até que uma hora a conta chega. E o preço a pagar é caro.

Pro corpo é a mesma coisa.

Exu sente fome todo dia. E Exu é corpo, é movimento. O corpo tem fome todo dia.

Por isso Exu Òkòtó é representado pela espiral do caracol.

Quanto mais você o alimenta, mais você cresce, mas você se expande. É o movimento de saída da espiral.

Quanto menos você o alimenta, mais você regride, mais você se contrai. É o movimento pra dentro da espiral.

To falando de corpo, mas isso vale pra tudo na vida.

E se tratando na luta pela nossa emancipação, pense em você como uma ferramenta pra sua comunidade.

Você deve se alimentar daquilo que vai te tornar a melhor ferramenta possível pra que nós possamos construir um futuro glorioso pro nosso povo.

Seja ambicioso. Busque ser brabo no que você é bom. E utilize isso pra desenvolver sua comunidade.

Como disse Jonh Henrik Clarke: “Pegue aquilo que você faz de melhor e faça isso pelo seu povo.”

Não se permita ser displicente com o seu desenvolvimento. Defina o que é inegociável no seu processo. Defina o que é sagrado. E alimente Exu diariamente.

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