Periscópio

Marina Piedade
revistaokoto
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3 min readJul 8, 2021

Meu pai sempre foi uma pessoa muito persistente e de todos os ensinamentos que ele me passou e continua passando, ultimamente tem um específico que volta a pairar sobre as nossas rotinas.

Quando eu estava no primeiro ano do ensino médio minhas notas em ciências exatas eram muito ruins, nunca fui boa em matemática, física e química, mas com certeza física era minha pior matéria. Já era quase final de ano e eu já sabia que faria a prova final pra tentar não reprovar, eu e boa parte da turma. Mas ai o professor resolveu organizar uma feira de física que poderia nos gerar pontos extras. A proposta era desenvolver algum experimento ensinado (teoricamente, é claro.) em sala, e por algum motivo que já não me lembro, resolvi que iria fazer um periscópio (aquele objeto que fica dentro dos submarinos e que as pessoas usam para enxergar o lado de fora), me inscrevi sem nem saber direito o que era esse objeto, mas o desespero por pontos era tão grande que eu faria qualquer coisa.

Chegando em casa vi que a parada era mais trabalhosa do que parecia nas fotos do livro , então recorri ao meu pai, que sempre manjou mais dessas paradas do que eu, embora não tenha nenhuma formação acadêmica além do ensino médio que completou já adulto, e ele topou na hora. Metemos as caras, medimos as paradas, cortamos as cartolinas e colocamos os espelhinhos, pronto! Um periscópio, finalmente! Trabalho cumprido, já conseguia sentir o gostinho dos pontos extra. Só que não! Meu pai voltou no dia seguinte com mais cartolina e disse que se fizéssemos outro sairia melhor do que o primeiro, um pouco contrariada, mas determinada a conseguir meus pontinhos, topei! Pesquisamos mais, medimos melhor, mudamos algumas coisas e pronto! O segundo periscópio ainda melhor que o primeiro. Prestes a descansar e muito satisfeita, guardei o objeto e fui pro quarto, meu pai continuou olhando, comparando, medindo, vendo o que podia melhorar. Nessa história aí sei que fizemos pelo menos mais dois periscópios além dos dois primeiros, até discutimos porque eu já não aguentava mais todo dia fazer a mesma coisa e meu pai sempre me apontando algo que poderia ser melhorado.

No final entreguei meu periscópio e foi o melhor trabalho, o professor ficou impressionado com as medidas, os ângulos… Estava realmente muito bom, muito melhor que o primeiro! E eu consegui meus pontinhos, voltei super feliz agradecendo meu pai, que também ficou muito contente, apesar de continuar achando que poderíamos fazer melhor. Essa é só uma de muitas histórias em que meu pai age dessa forma e fala de aperfeiçoamento é algo nato dele, sempre muito disposto a fazer melhor do que da última vez e embora me estresse às vezes, ele persiste em me relembrar essa lição na prática sempre que pode, sempre me dando o exemplo e me apontando coisas que posso melhorar nas minhas atividades.

Por Iza Oliveira

Uma parada que me vem sempre que lembro dessa memória é de que eu, tendo aulas de física todas as semanas, não fui capaz de solucionar e executar algo que teoricamente já tinha aprendido, e que meu pai, a muitos anos já formado pode não só entender mas também executar e me ensinar a fazer, e assim ele fez diversas outras vezes e ainda faz.

A ideia de perfeição, além de ser uma parada branca, coloca as coisas num local cristalizado, que não pode ser criticado, algo estático, parado, enquanto o aperfeiçoamento tem a ver com se desenvolver, com movimentação constante.

Não há nada tão bom que não possa ser melhorado e não existe mudança sem movimento.

Essa lembrança é um lembrete constante de que sem prática o conhecimento não vale de nada, você sabe algo a medida que você sabe fazer, e que assim como podemos encontrar nos itãs ensinamentos sobre aperfeiçoamento, nossos mais velhos também nos trazem essa e outras muitas lições, cabe a nós saber observar, ouvir e aprender com eles, quem veio antes tem muito a nos ensinar, caminhos e descaminhos.

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