Amazônia pede socorro

Intensas queimadas nas regiões Norte e Centro-Oeste acarretam problemas ambientais e sociais.

Revista Torta
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5 min readAug 30, 2019

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Por João Vitor Custódio

Editado por Arthur Almeida, Giovana Silvestri e Rafael Junker

No dia 19 de agosto, São Paulo escureceu à tarde. À primeira vista, parecia apenas a formação de uma frente fria, mas logo os dados foram confirmados: aquele acinzentado no céu era a fusão dos ventos marítimos com as queimadas que estão acontecendo nas regiões Norte e Centro-Oeste do país.

De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), comparado ao mesmo período de 2018 (janeiro a agosto), as queimadas no Brasil aumentaram 82% — já são mais de 72.000 focos de incêndio que provocam problemas ambientais e sociais.

O estado de Rondônia bateu recorde, tendo crescimento de cerca de 273,5%, saltando de 1.769 para 4.838 casos. Acre e Amazonas declararam estado de alerta. Só no dia 19, 813 focos de incêndio foram confirmados no bioma amazônico.

De quem é a culpa?

Em entrevista, o presidente eleito Jair Bolsonaro declarou que ONGs estão por trás das queimadas para “chamar a atenção contra o governo”:

“O crime existe e temos que fazer com que esse crime não aumente. Mas nós tiramos dinheiro de ONGs, repasses de fora, dos quais 40% iam para ONGs, não tem mais, acabamos com repasses de órgão públicos para ONGs, de modo que esse pessoal está sentindo a falta do dinheiro. Então, pode estar havendo ação criminosa desses ‘ongueiros’ (sic) para chamar atenção contra a minha pessoa, contra o governo do Brasil. Essa é a guerra que estamos enfrentando”.

Contudo, o chefe do Executivo não apresentou provas, nem registros sobre suas suspeitas:

“Não estou afirmando, mas no meu entender, há interesse dessas ONGs que representam interesse de fora do Brasil”.

Vale lembrar que, no começo do mês de agosto, o ex-diretor do Inpe, Ricardo Galvão, foi exonerado do cargo após divulgação de material sobre queimadas na Amazônia. Para Bolsonaro, o ato configura como antipatriotismo e deveria ser anunciado ao Ministério do Meio Ambiente antes de ser divulgado.

No dia 12 de agosto, a Alemanha anunciou a suspensão do repasse de verbas para o Fundo Amazônico. Para a ministra do Meio Ambiente da Alemanha, Svenja Schulze, as políticas de Bolsonaro deixam dúvidas se ainda há uma redução das taxas de desmatamento.

No dia 15 de agosto, a Noruega também anunciou o corte de verbas. Juntos, os países já repassaram R$3,4 bilhões para preservação da Amazônia. Bolsonaro se posicionou e disse que “o país não precisa desse dinheiro”, e ainda ironizou a Alemanha, falando para usarem a verba no reflorestamento do país europeu.

Tais suspensões impactam diretamente a fiscalização que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (Ibama) faz a respeito do desmatamento no Brasil. Em abril, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, já havia anunciado corte de 24% nas verbas destinadas ao órgão.

Outra medida que entrou em vigor durante o mês foi a Medida Provisória 881. Caso um órgão ambiental atrase a emissão de licenças ambientais, ações de desmatamento automático poderão ser realizadas. Em propriedades privadas, são dispensadas licenças para casos de “baixo impacto” ambiental.

Jogar a culpa em ONGs, sem provas, é fácil. Difícil é acobertar os dados lançados diariamente acerca do que está acontecendo na Amazônia — mas eles tentam. Tudo isso mostra o descaso do Governo com a sua população. Porque importar-se com a imagem do Brasil, se ela está sendo (literalmente) queimada?

Repercussão Mundial

No dia 22 de agosto, Emmanuel Macron convocou o G7 (bloco econômico no qual participam as sete maiores potências mundiais) para debater a respeito da Amazônia. No dia 24, representantes de cada país reuniram-se em Biarratriz, na França.

Após a reunião, Macron divulgou que os líderes concordaram em ajudar os países afetados pelos incêndios na Amazônia “o mais rápido possível”. Na ocasião, o presidente do G7 colocou a pauta no topo da agenda da cúpula e declarou ser emergência global.

No último dia de reunião, 26 de agosto, o bloco ofereceu US$20 milhões (cerca de R$83 milhões) para auxiliar no combate aos incêndios. No mesmo dia, entretanto, o Governo Bolsonaro rejeitou a ajuda. De acordo com o chanceler Ernesto Araújo:

“Está muito evidente o esforço, por parte de algumas correntes políticas, de extrapolar questões ambientais reais transformando-as numa ‘crise’ fabricada, como pretexto para introduzir mecanismos de controle externo da Amazônia”.

Araújo acrescentou que “o Brasil não aceitará nenhuma iniciativa que implique relativizar a soberania sobre o seu território, qualquer que seja o pretexto e qualquer que seja a roupagem”.

O presidente Jair Bolsonaro declarou em seu Twitter:

“Não podemos aceitar que um presidente, Macron, dispare ataques descabidos e gratuitos à Amazônia, nem que disfarce suas intenções atrás da ideia de uma “aliança” dos países do G-7 para “salvar” a Amazônia, como se fôssemos uma colônia ou uma terra de ninguém”

Contudo, toda essa imagem negativa que o atual governo brasileiro está passando, principalmente no quesito ambiental, pode (e vai) gerar problemas econômicos.

Países europeus, como a Irlanda, mostraram-se contrários ao acordo econômico entre o Mercosul e a União Europeia. A Finlândia, atual presidente do bloco, pediu que avaliassem com urgência a suspensão da importação de carne bovina brasileira como resposta à destruição na Amazônia.

Independente de quem causou o aumento do número de queimadas na Amazônia — as ONG’s de Bolsonaro, que servem de pretexto pra tudo que há de ruim, ou os líderes do agronegócio, que há muito tempo desmatam e queimam florestas pelo país para aumentar suas plantações -, fato é que a floresta queima e o presidente não vai solucionar coisa alguma apontando culpados — principalmente se o fizer sem provas.

*Informações atualizadas até dia 29/08/2019 às 10h

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