NOTA
DEFINIÇÕES E RISCOS DA CULTURA DO CANCELAMENTO
Como o linchamento virtual, aliado aos algoritmos, pode prejudicar usuários de redes sociais.
Por Rafaela Monteiro
Editado por Eduarda Motta e João Vitor Custódio
A “cultura do cancelamento” é um boicote ou linchamento virtual realizado por usuários em massa sobre pessoas públicas ou celebridades. O fenômeno também acontece com pessoas que não são famosas, mas que viralizaram inesperadamente no Twitter, por exemplo.
De acordo com o texto “Vigilância e a cultura do cancelamento” escrito por Maria Luiza Cunha da Silva, professora da Faculdade de Letras na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), existem dois tipos de vigilância: a paranóptica e a sinóptica.
A primeira seria exercida por um observador em relação a diferentes usuários, do qual empresas ou instituições podem avaliar a manifestação de futuros membros online, em seus processos seletivos.
Já a segunda, a sinóptica, é referente a vigilância de muitos em relação a poucos, como é o caso dos cidadãos comuns seguindo celebridades e influencers por exemplo, por terem livre acesso à vida e manifestação de ideias dessas pessoas públicas.
Contudo, como a própria internet pode ser entendida como um sistema único, enxerga-se, nos casos de cancelamento, uma referência a um tribunal da internet, do qual um conjunto de indivíduos manifestam o mesmo olhar que tudo vê. Devido a intensa presença dos algoritmos, os dois conceitos se misturam.
Um texto da Universidade de Michigan nos Estados Unidos, denominado “Hate ‘Cancel Culture’? Blame Algorithm” relacionou a cultura de cancelamento com os algoritmos das redes sociais. Nele, Anjana Susarla falou que sua pesquisa mostrou como um conteúdo que desperta uma resposta emocional intensa, seja ela positiva ou negativa, tem maiores chances de viralizar.
“A indignação é a emoção negativa perfeita para atrair atenção e engajamento — e os algoritmos são preparados para atacar. Uma pessoa tweetando sua indignação normalmente cairia em ouvidos surdos. Mas se essa pessoa for capaz de atrair engajamento inicial suficiente, os algoritmos estenderão o alcance desse indivíduo, promovendo-o para indivíduos com ideias semelhantes. Um efeito bola de neve ocorre, criando um loop de feedback que amplifica a indignação.”
No dia 7 de julho de 2020, mais de 150 intelectuais, escritores e artistas publicaram uma carta aberta contra a cultura do cancelamento na Harper’s Magazine, que foi amplamente criticada por não abordar questões sobre diversidade.
O programa Papo de Segunda levantou um debate a respeito de tal manifestação e o rapper Emicida trouxe uma reflexão acerca do silenciamento ser contraproducente, ou seja, ele começa pelo privilegiado padrão, silenciando consequentemente seu próprio grupo: a pessoa branca, rica e hétero.
O rapper pontua que, junto a isso, instaura-se um clima de tensão no qual as pessoas que estão no extremo oposto, ou seja, pertencentes a minorias sociais, também se sentem amedrontadas por não performarem tão bem a opinião daquele ambiente.
“E esse clima de medo silencia a todo mundo.”
Ao pensar sobre as consequências que a cultura do cancelamento pode levar a um indivíduo, vale lembrar que quem tende a sofrer os maiores impactos sempre é a pessoa alvo do linchamento virtual.
Na pior das hipóteses pode-se findar como Byron “Reckful” Bernstein, um astro no universo gamer que se suicidou após um linchamento virtual devido a um pedido de casamento que o mesmo teria feito a namorada.
Não se sabe se em algum momento a cultura do cancelamento chegará ao fim, mas já se sabe o estragos que ela pode causar aos indivíduos acometidos pelo linchamento, então a busca por amplificação de debates e por um cuidado maior com a saúde mental, tem se evidenciado como uma melhor resposta, até o momento.
Nesse sentido, tem-se o “Como crescer”, um guia não definitivo de como sobreviver à internet, em incentivo a uma maior busca por saúde mental, criado por influencers que já sofreram com doenças como a ansiedade, a depressão e crises de pânico decorrentes do ambiente virtual.