CÂMARA ESCURA

EM 2022, OS SLASHERS VOLTARAM COM TUDO

O terror sanguinolento também está conquistando a geração Z

Revista Torta
revistatorta

--

Por Ingrid Felix

Editado por Arthur Almeida, Elisa Romera e João Vitor Custódio

Cena do filme X. || Foto: Divulgação/A24

Quando John Carpenter dirigiu Halloween, em 1978, apresentando Michael Myers ao mundo, grandes produtores imediatamente reconheceram que estavam diante de uma fórmula de sucesso. Jovens descompromissados e com os hormônios à flor da pele ficam sozinhos e desprotegidos em suas casas durante o dia das bruxas, enquanto um cruel assassino mascarado mata um por um, não obtendo sucesso apenas com a corajosa e inocente protagonista.

Apesar do sucesso da franquia Halloween, o gênero que viria a ser chamado de terror slasher, já havia sido explorado muito antes, em 1974, com baixíssimo orçamento e cenas guturais. O Massacre da Serra Elétrica chocou os Estados Unidos por abordar uma família canibal, um assassino que utilizava uma máscara de rostos humanos e, claro, uma arma comum e presente no cotidiano de muitos, a serra elétrica.

Vilões como Leatherface e Michael Myers marcaram a geração X, que cresceu assistindo a inúmeras sequências slashers estruturalmente idênticos, como Noite do Terror, Sexta-Feira 13 e A Hora do Pesadelo, por exemplo.

Cena do filme O Massacre da Serra Elétrica. || Foto: Divulgação/Bryanston Pictures

Talvez seja essa repetição de histórias, com apenas locais e antagonistas diferentes, que fez com que, na década de 1990, o gênero slasher fosse considerado saturado e ultrapassado. Os espectadores não se interessavam mais por vilões indestrutíveis e personagens pouco inteligentes que se tornavam presas fáceis nesse esquema dedutível.

Para aqueles que preferiam uma trama psicológica, os filmes sobre espíritos e demônios, importados de outros países como o famoso O Grito, O Chamado e Imagens do Além, pareciam ser mais atrativos. Por outro lado, quem prefere a violência gratuita e explícita abraçou franquias espalhafatosas como Colheita Maldita, Jogos Mortais ou O Albergue, por exemplo.

Na década de 1990, em uma tentativa solitária mas certeira, Wes Craven criou Pânico, um slasher que é consciente sobre o seu gênero e brinca com as suas convenções. A protagonista é declaradamente uma final girl e os personagens que a acompanham sabem que determinados comportamentos os levariam certamente à faca de Ghostface.

Além disso, a metalinguagem está presente em diversos momentos, já que a quebra da quarta parede acontece quando se reconhece que há um longa sendo desenvolvido pelos vilões dentro do próprio filme.

Cena do filme Pânico. || Foto: Divulgação/Dimension Films

Com o tempo, os subgêneros do terror se desenvolveram e formaram novos estilos que abusavam em uma nova estética, subvertendo o conceito de terror e os clichês que eram normalmente associados a ele. Durante esse período, o cinema deu um tempo de slashers, mas aproveitou elementos essenciais dessas produções para construir composições inovadoras.

O found footage, por exemplo, explodiu com o lançamento de Bruxa de Blair e Atividade Paranormal, enquanto o “pós-terror” (título que divide muitas opiniões), surgiu com o uso de histórias “bizarras” e não usuais que antes de apelarem para jumpscares, focam em gerar desconforto em quem o assiste. Jordan Peele, Robert Eggers e Ari Aster são alguns dos maiores nomes do terror contemporâneo, que contempla obras como A Bruxa, Hereditário e Corra.

Há, entretanto, uma retomada saudosista da estética cinematográfica dos anos 1970 e 1980 nas novas produções. A nostalgia da modernidade está trazendo um novo ar de reinvenção com base nos clássicos aos longas.

Já se pôde ver isso em 2017, quando a Blumhouse Productions lançou o sucesso de bilheteria A Morte te dá Parabéns e, no mesmo ano, sem perder o timing, a Netflix produziu The Babysitter. Os dois têm algo em comum: são slashers renovados.

Com a inevitável aclamação de ambas as obras, outras grandes produções originais surgiram, principalmente em plataformas de streaming, como a trilogia Rua do Medo, lançada pela Netflix como um experimento para testar o engajamento do público a essa abordagem.

Paralelamente, franquias clássicas foram reanimadas como Halloween, que teve uma nova produção em 2018, trazendo agora, além do molde essencial dos slashers, uma trama emotiva que demonstra os impactos psicológicos da perseguição na protagonista, que diferentemente das personagens de obras antigas, é forte e está pronta para enfrentar o vilão.

Finalmente, em 2022, o gênero parece ter se fortalecido e vindo para as telas com tudo. Grandes produtoras como a Universal Pictures, Paramount Pictures Studios e a A24 ousaram e lançaram três grandes sucessos: A Lenda de Candyman, Pânico 5 e X.

O primeiro é uma regravação do clássico de mesmo nome e dirigido pela brasileira Nia da Costa, que misturou a base estrutural do slasher com o terror psicológico a qual geração Z está mais habituada, abordando temas sociais, como o racismo estrutural nos Estados Unidos, ao mesmo tempo que apresenta o caricato vilão que persegue o protagonista.

O segundo, ainda mais apoiado na franquia de grande renome, surpreendeu por não ser apenas uma continuação, mas, também, uma releitura do formato clássico, contendo elementos modernos como celulares com aplicativos de conversa e casas inteligentes para construir seus plots bem desenvolvidos e alcançar um clímax não esperado, o que nesse caso é ótimo.

Por último, a mais nova produção da A24, elogiada por Stephen King, é um filme explícito e sincero que, por meio de cenas chocantes e profundamente angustiantes, trata de assuntos como sexualidade, envelhecimento e glamourização da indústria pornô. Retratado na década de 1970, o longa-metragem dialoga com a nossa realidade contemporânea enquanto constrói uma bela homenagem a Massacre da Serra Elétrica.

O renascimento do slasher é um sopro de felicidade para aqueles que achavam que o terror era um gênero cinematográfico que iria cair no esquecimento. Não há dúvidas que roteiristas e diretores se sentirão mais inspirados a produzir longas cada vez mais peculiares que não podemos esperar para ver.

--

--

Revista Torta
revistatorta

Divulgando informações. Projeto de revista digital com contextualização e difusão acadêmico-científica. Faça parte da Torta!