“Eu ria de nervoso, chorava de desespero”

Entrevista sobre maternidade com Dandara Adrien Aveiro

Revista Torta
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7 min readMay 31, 2019

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Por Cezar Agusto (Beto)

Editado por Arthur Almeida e Giovana Silvestri

Foto por Vinicios Rosa | Modelo Dandara Aveiro

Lidar com a maternidade é um processo difícil e, sozinha, se transforma em uma dificuldade ainda maior. Conhecido, atualmente, como “mãe solo”, o fenômeno consiste em uma mãe cuidar de todas as vertentes da criação de seu filho sem a presença paterna, fazendo ela desempenhar um duplo papel no quesito criação.

Conversamos com uma mãe solo, Dandara Adrien Aveiro, 27, estudante de Jornalismo pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP) e formada em Letras: Português/Inglês na Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM).

Dandara teve uma gravidez imprevista. Após o parto, seus pais cuidam do bebê, porém, ela ainda mantém um papel presente na vida de seu filho.

As perguntas foram feitas para contemplar a vivência e a experiência dela como mãe solo durante os processos de pré e pós gestação. Dandara contou para nós o que pensava e pensa sobre ser mãe.

“Eu nunca quis ser mãe. Não achava que eu era uma pessoa preparada pra isso pela questão financeira e principalmente por não querer ter o compromisso de saber que alguém dependeria de mim pro resto da minha vida. Isso pode soar como egoísmo, mas é a minha verdade”.

“Eu queria ser livre, viver por mim mesma, sem nada “me prendendo”, e com um filho eu sabia que todos esses planos iriam mudar. Se eu tivesse que viajar com os amigos e não pudesse, porque meu filho está doente? Se eu tivesse que trabalhar em horários pouco convencionais, mas naquele tal momento não dava porque tinha que levar meu filho na escola?” Era isso que eu pensava, mas eu estava enganada”.

“Eu nunca tinha pensado que um filho poderia ser mais um companheiro de aventuras do que um “estorvo”.

Foto por Vinicios Rosa | Modelo Dandara Aveiro

“Eu vou ter alguém dependente de mim pro resto da vida? Sim, e isso é estranho ainda. Mas, eu também vou ter sempre alguém com quem eu possa contar! Eu vou ter que me preocupar com outra pessoa a todo momento? Sim, e isso me assusta às vezes. Mas ao mesmo tempo, vou ter um companheiro a mais pras minhas aventuras!”.

“Eu vou ter que educar, ensinar, ajudar e cuidar? Sim, mas, imagina que prazeroso saber que uma pessoa se moldou naquilo que você acredita que seja certo, uma pessoa que vai se espelhar em você e que vai te olhar como um exemplo: uma heroína. Talvez eu esteja fantasiando, mas ser mãe, para mim, é isso”.

Dandara ressalta como aconteceu a sua gravidez não planejada e indesejada, e como se protegia em suas relações sexuais.

“Eu conheci uma pessoa, ficamos e pronto. E antes que alguém me julgue, porque geralmente a responsabilidade cai sobre a mulher, usamos camisinha, mas ela estourou, eu tomei a pílula do dia seguinte, mas pelo jeito não funcionou”.

“Fica o alerta de que NENHUM método contraceptivo é 100% eficaz. Eu sabia disso, sempre tive boas instruções com relação a sexo, tanto em casa, quanto na escola, mas hoje, sou a prova viva de que esses métodos podem falhar mais facilmente do que a gente pensa. Na época eu havia parado o anticoncepcional porque estava me fazendo mal. E é bom inclusive mencionar, como a mulher sai prejudicada em vários pontos”.

“Nós, mulheres, que tomamos remédio; nós que somos vistas como as “descuidadas” que não se precaveram; nós é que ficamos, no final de tudo, com toda a responsabilidade da criação dos filhos”.

“E aí eu pergunto: paro de tomar remédio e corro o risco de engravidar ou continuo tomando e recebendo uma bomba de hormônios no meu organismo que sabemos que não faz nada bem? Eu escolhi a minha saúde, até porque existem outros métodos e eu os usei”.

Ainda, a estudante confessou para nós seu verdadeiro sentimento com a notícia da gravidez.

“Fiz o teste. Eu estava grávida de aproximadamente 4 semanas já e foi um choque. Descobri no dia do meu aniversário. Para muitas mulheres seria um presente, mas para mim não foi.”

“Eu ria de nervoso, chorava de desespero”.

“Eu não acreditei, quis processar o laboratório por me dar um resultado errado. Fiz mais 2 testes de farmácia e mais 1 de sangue, obviamente todos positivos. Só fui acreditar na gravidez no primeiro ultrassom e assim mesmo achando que poderia ser qualquer outra coisa, menos um bebê”.

Dandara teve grande apoio de sua família e muitas coisas passaram por sua cabeça.

“Não vou ser hipócrita de dizer que não me passou pela cabeça um aborto. Eu não queria ter um filho, eu pensei por várias vezes em tirar. Não contei para os meus pais. Fiquei com medo. Contei pra uma tia que contou pra minha mãe e que contou para o meu pai. Eles conversaram comigo e foram incríveis, me apoiaram muito. Disseram que se eu não quisesse, não era para tirar, era para entregar para eles cuidarem e nada na minha vida iria mudar (continuaria minha faculdade normal)”.

“Pensei duas coisas, primeiro: eu não quero esse filho porque não POSSO ou porque ESTOU COM MEDO de ser mãe? Segundo: o aborto tem riscos e se eu perder o útero e nunca mais conseguir ter filhos?”.

“E se eu passar mal, for para o hospital e eles descobrirem que fiz um aborto, será que poderia ser presa por ser uma prática ilegal?”.

“E se o aborto não acontecer e a criança nascer com problemas por conta da tentativa, como vou cuidar de uma criança doente, que é muito mais difícil? Enfim, muitos questionamentos e cheguei a conclusão: estou com medo, mas nada comparado ao medo que eu tinha de um aborto”.

“Então eu seguiria com a gestação, entregaria para os meus pais e continuaria minha vida. Só precisava aguentar 9 meses. Ledo engano”.

Foto por Vinicios | Modelo Dandara Aveiro

A jovem relatou sobre seus sentimentos durante e após o parto.

“Hoje ele está com meus pais e eu morro de saudade. Eles cuidam para que eu continue meus estudos, mas quero que ele more comigo um dia e quero ser a mãe que meu filho merece. Mas na época, foram os 9 meses mais logos da minha vida. Eu queria sair, beber… Eu não queria alguém dentro de mim”.

“Não tive conexão entre mãe e filho quando ele estava na minha barriga. Por mais que eu estivesse fazendo tudo certinho, eu não aceitava aquela situação”.

“Demorou muito, aceitei tudo só depois do nascimento e ainda com muita dificuldade. Mas com relação a apoio, tive total, tanto de amigos quanto de familiares. Achei que meu pai ia me dar uma bronca, que ia me tirar da faculdade, me obrigar a viver uma vida que se resumisse a criança (coisa que eu não queria de jeito algum). Mas foi o contrário; ele me abraçou e disse que tudo ficaria bem. E ele tinha razão”.

Dandara relata sua situação psicológica, emocional durante e após a gravidez.

“Foi uma fase difícil, eu só conseguia pensar que ia dar tudo errado e que seria tudo péssimo dali pra frente. Tive depressão pós parto, e nada emocionalmente foi fácil. Mas me recuperei rápido e devo isso ao meu filho, ele sempre foi um bebê maravilhoso, bonzinho, amoroso.

“Eu não imaginava que seria uma experiência tão engrandecedora pra mim. Amadureço e me torno uma pessoa melhor a cada dia por ele e por causa dele. Hoje me sinto feliz e completa. Mas, nada apaga o susto, o medo e a tristeza de quando eu descobri a gravidez. Fui fraca? Fui uma pessoa ruim? Fui injusta com o bebê? Não sei, pode ser que todas as respostas sejam positivas”.

“Mas, não controlei meus sentimentos, vivi o que estava sentindo naquele momento. Infelizmente foram mais sentimentos ruins do que bons. Não dá pra apagar isso. Mas o importante é daqui pra frente. Sou MÃE e hoje eu me orgulho muito disso. Meu filho é o meu maior presente”.

Foto por Vinicios Rosa | Modelo Dandara Aveiro

“A amamentação também foi difícil, sangrava e eu sentia dor, eu tinha que estudar e amamentar ao mesmo tempo, era complicado e eu estava de saco cheio (logo no começo). Juntando tudo isso, fiz algumas consultas com uma psicóloga, tomei antidepressivos… Tudo isso me ajudou também”.

“Mas, acho que no meu caso era questão de tempo para perceber que não era o fim do mundo, não era algo tão ruim ou complicado e que aquela situação foi mais benéfica por me fazer amadurecer, do que algo ruim”.

“Antes de chegar nessa conclusão, eu bebi muito, porque sempre tive problemas com o álcool e ele foi meu refúgio. Não bebi na gravidez, mas antes eu bebia muito e depois de dois meses de nascimento dele, eu voltei a beber porque eu achava que aquilo me ajudaria a apagar tudo aquilo. Mais uma vez, eu estava errada”.

“Tudo que me faria bem dali pra frente, estava bem diante dos meus olhos, que era meu filho. E AINDA BEM que eu percebi isso “rápido”, e hoje eu sou feliz e não poderia desejar felicidade maior”.

Foto por Vinicios Rosa | Modelo Dandara Aveiro

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