PERIFERIA GEOGRÁFICA
“PERIFERIA GEOGRÁFICA” SE APRESENTA
A nova coluna da Torta descobre todos os meses o panorama socioeconômico e histórico de um país que não é pautado pela grande mídia ocidental.
Por Sérgio de Toledo
Editado por Elisa Romera e João Vitor Custódio
Atualmente são 193 os países reconhecidos com o título de nação soberana pela comunidade internacional — não por coincidência, são os mesmos 193 estados-membros da Organização das Nações Unidas (ONU).
193 povos com suas tradições, 193 culturas com suas peculiaridades e 193 histórias com seus percalços e esplendores. Contudo, no mapa-múndi que projetamos em nossas memórias, amiúde conseguimos enxergar somente 1/5 dessas nações.
Contemplamos Estados Unidos, Canadá, Europa Ocidental, Japão e Austrália.
Quando muito, conseguimos também visualizar em nossos mapas-múndi imaginários o contorno apagado de China, Rússia, parte da Europa Oriental, dos Tigres Asiáticos (Coreia do Sul, Singapura, Hong Kong e Taiwan) e outros países com destaque regional, economias em ascensão ou considerável poder bélico.
Ao sentar em frente à TV para assistir à programação de viagens ou ao noticiário internacional, somos convidados pela grade televisiva a nos fascinar com a frenética vida empresarial estadunidense, a nos espantarmos com os mistérios das pedras de Stonehenge, na Inglaterra, e a lamentarmos os mortos da desumana guerra entre Rússia e Ucrânia, travada em solo europeu.
Mas quantas vezes você foi levado pelos meios de comunicação a conhecer a beleza fantástica do Santuário de Las Lajas, na fronteira da Colômbia com o Equador?
Ou a se intrigar com o inexplicável desaparecimento da frota de Abu Bakr, próspero e ambicioso imperador do Mali, no século XIV?
Ou a se revoltar com a tragédia humanitária desencadeada pela Guerra Civil Etíope, protagonizada pelo governo federal da Etiópia e pelos separatistas da região do Tigré?
Milton Santos, sem sombra de dúvidas o maior geógrafo da história do Brasil, nos conta que esse desconhecimento sobre uma fatia muito específica do nosso globo terrestre não acontece à toa.
Calcados nos escritos deixados pelo admirável professor — como “Por Uma Outra Globalização” e “A Natureza do Espaço: técnica, razão e emoção” — , podemos afirmar que existem apenas duas categorias de países no mundo: os que não dispõem dos holofotes, microfones e câmeras e, do outro lado, os que detêm essas ferramentas.
Os segundos exercem o seu poder sobre os primeiros justamente na potência de sua difusão comunicacional.
Invisibilizar, arrancar o direito humano à fala, negar lugar no debate público é dos métodos mais covardes de dominação. Os que falam, afinal de contas, contam a sua própria história. Os que não podem falar, por sua vez, têm a sua história contada pelos que falam.
Em nosso universo contemporâneo, onde o dinheiro tomou o lugar do homem como ponto central da existência — outra ideia de Milton Santos, a propósito — , torna-se natural que voltemos o nosso interesse para os corações do capitalismo mundial.
E o resultado de toda essa nossa obsessão por Nova Iorque, Paris e Tóquio é a relegação de centenas de nações — com seus povos, culturas e histórias — ao mais profundo isolamento e esquecimento.
“Periferia Geográfica” é um passeio por caminhos alternativos, uma guinada para outras direções, uma trilha por passagens pouco exploradas.
O meu nome é Sérgio de Toledo — estudante de jornalismo na Universidade Estadual Paulista (Unesp), agora colunista da Revista Torta e em um caso de amor que dura mais de uma década com a geopolítica.
Todos os meses vou trazer neste espaço uma coluna onde contextualizo um país que nunca é lembrado pelos grandes conglomerados de mídia nacionais e internacionais.
Na primeira, o Iêmen, nação mais pobre do Oriente Médio que convive desde 2014 com uma guerra civil cruel e intransigente.
E, para uma coluna de apresentação que citou Milton Santos por duas vezes, finalizo com uma terceira para fechar com chave de ouro.
“O centro do mundo está em todo lugar. O mundo é o que se vê de onde se está”