MVP falhou? E agora?

A história do MVP do app para o entregador que não solucionava o problema do entregador.

Nanda Lopes
ReZÉnha
7 min readJul 21, 2021

--

Antes de falar sobre o MVP vou dar um pouco mais de contexto: o Zé Delivery, diferente de outros aplicativos de delivery, não tem uma frota de entregadores próprios. A relação comercial do Zé Delivery é direta com os estabelecimentos comerciais, os quais possuem autonomia para gerir seus negócios e a relação com seus funcionários e entregadores, mas o Zé mantém uma comunicação ativa com seus parceiros, orientando sempre sobre as melhores medidas a serem tomadas caso a caso.

Minha trajetória no Zé Delivery

Comecei como designer de produto no Zé logo depois do lançamento e teste do MVP do aplicativo criado para o entregador. Aqui, os profissionais trabalham com a metodologia ágil e se dividem em tribos e esquadrões (mais chamados de squads). As tribos são divisões verticais dos profissionais, cada uma olha para um público e suas necessidades. Dentro das tribos temos as squads, as quais são divididas para olharem com mais foco para uma necessidade específica do seu público.

Desde que vim para o Zé atuo na tribo que olha para os entregadores que trabalham nas lojas parceiras e nosso objetivo é, além de construir um app funcional e útil para ajudar no dia a dia dos entregadores, conhecer e entender melhor suas necessidades para conseguirmos oferecer uma experiência bacana.

Com relação ao app para o entregador, por ser um produto novo quando entrei na empresa, sabíamos pouco sobre o público de entregadores e minhas duas primeiras semanas foram assistindo muitos motovlogs disponíveis no Youtube, onde os motoboys e entregadores contam sobre seu dia a dia e falam sem papas na língua sobre as questões que enfrentam. Essa imersão na vida dos motoboys foi uma das etapas mais importantes do meu trabalho. Conhecer o público que usa o produto que eu iria trabalhar. Saber as dores, desafios e alegrias da sua rotina me deram insumos valiosíssimos para avançar e entregar um bom trabalho.

Em pouco tempo, o aplicativo Zé Entregador evoluiu bastante e é interessante entender como a ideia do MVP surgiu e foi desenvolvida para darmos ainda mais valor aos desdobramentos e aprendizados obtidos com o processo.

Como surgiu a necessidade do app?

Em 2019, o Zé Delivery já estava no mercado há alguns anos e já tinha um público relativamente grande. Na época, os clientes faziam o pedido mas não tinham acesso à localização do mesmo. Já imaginou pedir aquela bebida gelada para o seu almoço de domingo e ficar na incerteza se seu pedido vai chegar? Pois é. Era assim que os clientes do Zé ficavam e, por isso, muitos deles ligavam para a loja que aceitou o pedido para confirmar o andamento.

Com isso, foi identificada uma dor do usuário: Ele não tinha visibilidade do status de seu pedido depois de aceito pela loja. Essa dor causava alguns problemas para o trabalho de intermediação do próprio Zé, como o cancelamento de pedidos que já estavam na rua e insatisfação das lojas e entregadores.

Contexto extra:
Você pode estar se perguntando “Mas como o entregador sabia qual pedido devia ser entregue se ele não tinha um app para indicar?”. Como comentei ali no começo, o estabelecimento parceiro que vende pelo Zé tem seus próprios entregadores. Ou seja, quando o pedido chega para a loja, a própria loja passa as informações de endereço para o entregador fazer a entrega.

Como definimos o que seria o MVP?

O MVP (Minimum Viable Product, que em português é algo como Produto Mínimo Viável) é uma versão de um novo produto que permite que o time colete o máximo de aprendizado possível sobre os clientes com o mínimo de esforço. É a primeira versão funcional de um produto com os recursos necessários para satisfazer o cliente potencial e coletar dados e sua opinião para melhorar na próxima versão do produto.

Não podemos esquecer que um produto ou serviço precisa conter o seguinte:

  • Objetivo e propósito — esse item é a essência, o que faz um cliente buscar pela solução;
  • Confiável — além de cumprir o que promete, o produto precisa transmitir confiança para que o cliente não tenha medo de usá-lo;
  • Fácil de usar — se o cliente não conseguir usar, não adianta resolver o problema mais complicado do mundo;
  • Valor emocional — precisa conquistar o cliente.

O MVP de um produto ou serviço precisa ser uma versão enxuta disso tudo e não só de uma das partes.

Fonte da imagem: https://www.maastrichtuniversity.nl/blog/2016/08/lean-startup-mvp-how-make-meaningful-products

Como a dor do cliente era não ter visibilidade do status de seu pedido depois de ser aceito pelo ponto de venda, o Zé Delivery precisava mostrar essa informação em sua plataforma para resolver o problema. A dificuldade é que essa informação não era captada e o jeito de captar era com a ajuda das lojas que vendiam pelo Zé e seus entregadores, que estavam com o pedido na rua.

A solução proposta foi criar um app para que o entregador conseguisse, enquanto estava na rua, registrar as informações necessárias, como onde estava com um pedido específico, se ele já havia começado a entrega ou se ainda estava na anterior.

E aí nasceu o app Zé Entregador.

Desafios que o MVP nos trouxe

Como todo produto novo, o app Zé Entregador nos trouxe vários novos desafios.

  • O 1º foi conseguir segurar a emoção e não sair construindo vários recursos no app que seriam incríveis, mas que dariam muito trabalho e levariam muito mais tempo para ficarem prontos. A gente ouve com frequência, principalmente quando se é designer, que precisamos pensar fora da caixa, mas para a definição de um MVP isso não significa sair fazendo várias telas com animações maravilhosas e nem um layout que complique demais a vida do programador que vai trabalhar com você.
  • O 2º desafio do MVP foi equilibrar o prazo e o time pequeno. Os recursos eram limitados e o gerente de produto teve que quebrar a cabeça nesse sentido, pois no começo o designer e o QA não eram exclusivos do time e eram poucos engenheiros alocados para o projeto.
  • O 3º (e eu diria que o principal) desafio foi testar esse novo app com os pontos de venda e seus entregadores em seu dia a dia de trabalho. Um ponto importante que aprendemos sobre esse público é a correlação que fazem entre tempo e dinheiro. Aprender algo novo, como usar um aplicativo, leva certo tempo e isso acabou criando a percepção de que faziam menos entregas no dia. Por esse motivo, não fazia muito sentido, para os entregadores, usar o app no começo.

⚠️ Como convencer o entregador a usar um app que não faria diferença para o trabalho dele, mas apenas resolvia uma dor do cliente?

Benefícios do MVP e aprendizados

Depois do app passar do MVP e ser lançado para toda a base de lojas e seus respectivos entregadores, fizemos algumas análises e percebemos que alguns entregadores começavam e finalizavam as entregas em um período de tempo muito curto. Essa informação sugeria que o app não criava valor para o trabalho do entregador e parecia estar sendo usado apenas porque a loja e os consumidores pediam tal solução. Pode parecer que o MVP falhou quando chegamos nesse ponto, mas na verdade trouxe um aprendizado valiozíssimo.

Hoje parece óbvio, mas a criação do MVP do app Zé Entregador me ensinou que olhar apenas para o cliente final ao construir o produto não é o suficiente.

E é nosso papel, como Designer, entender o todo e trabalhar na melhor solução para o ecossistema, no caso, composto pelo cliente final, entregador, estabelecimento parceiro e, como ponto de conexão entre eles, o próprio Zé Delivery.

Essa conclusão não foi tirada de um dia para o outro. Os motovlogs no Youtube, o conhecimento adquirido sobre os entregadores através de pesquisas e me familiarizar com o papel e a estratégia de negócio do Zé foram essenciais para o meu desenvolvimento e para que eu pudesse contribuir para que o produto entregasse de fato valor para os entregadores. Nenhum MVP falha, ele ajuda o produto a evoluir.

E depois do MVP?

Já que o aprendizado principal foi olhar para os diferentes grupos que compõem nosso ecossistema, a minha tarefa pós MVP foi desenhar um mapa da experiência do entregador com o estabelecimento para entender quais seriam os próximos passos. O mapa inclui desde o momento em que os entregadores começam a trabalhar com os estabelecimentos comerciais até receberem seu pagamento. Esse mapa deixou muito mais claras as oportunidades que tínhamos e as principais dores dos entregadores e dos pontos de venda parceiros do Zé Delivery.

A partir daí começamos o processo todo de novo.

  • Listamos os problemas;
  • Priorizamos os que mais atrapalhavam o ecossistema como um todo. Um desses problemas era não ter informações suficientes sobre algumas etapas dessa jornada;
  • Muita pesquisa precisou ser feita;
  • Com pesquisas em mãos, planejamos algumas mudanças e a criação de novos recursos (como o chat entre o entregador e o cliente final);
  • Para todo lançamento e mudança, fazemos um MVP para garantir que estamos no caminho certo;
  • Por fim, ajustamos com aprendizados e liberamos para todos os usuários.

Testes, como o lançamento de MVPs, nos ajudam muito a direcionar nossos esforços para soluções que realmente vão trazer valor para o usuário e também para o negócio.

O Zé Delivery possui 6 valores que movem a empresa e um deles é o Método Brutal, o qual fala justamente sobre construir, medir e aprender. Trabalhar com MVP, tanto de um novo produto como de um novo recurso que será implementado, é fundamental para agilizar o processo. Nosso objetivo nunca é errar, mas aprender. E nossos erros costumam nos ensinar mais que os acertos e esses erros, bem catalogados, são grandes oportunidades de fazer um trabalho melhor.

--

--

Nanda Lopes
ReZÉnha

Designer de Produto no Nubank | Especialista em UX Design