Comemorar a Páscoa está alinhada ao seu Employee Experience?

Lud Pimenta
RHlab
Published in
6 min readApr 13, 2020

Antes de mais nada este artigo não tem o objetivo de desrespeitar qualquer tipo de religião. Este artigo fala sobre os preceitos de Employee Experience e a Páscoa é somente um exemplo. Dito isso, sigamos.

Hoje eu acordei e ao abrir o instagram vi uma colaboradora parabenizando sua empresa por ter enviado para a sua casa uma ovo de Páscoa. Ela se sentiu cuidada, mesmo a distância. Achei super legal, mas na mesma hora imaginei uma budista ou judeu recebendo os ovos. O que será que passaram pela cabeça deles? Será que um adventista está tendo a mesma experiência de segurança psicológica por estar “faltando” ao trabalho no sábado?

"Ah, pelo menos gosto de chocolate" ou "esta empresa não pensou na minha individualidade", qual será o pensamento criado por tal gesto?

O fato é, mesmo querendo acertar, a gente não sabe o que faz um gesto organizacional se tornar uma experiência positiva ou negativa para o seu colaborador. As chances aumentam muito mais quando não sabemos quais são os seus interesses e necessidades ou quando queremos que eles se comportem como uma massa de gente padronizada.

Precisamos lembrar que o "pão e circo" são resquícios do nosso modelo industrial ultrapassado — mais ultrapassado agora com a revolução coronavírus.

Quem já assistiu alguma palestra minha ou fez algum treinamento do RHlab sabe que eu tenho algumas (várias) críticas a "brindes" oferecidos de forma não pensada ou só por protocolo, a Páscoa é um exemplo, mas eu poderia ter usado vários outros.

O poder da motivação intrínseca

Quando eu era Gestora de RH, os brindes para datas comemorativas entravam dentro do orçamento do RH em "ações de endomarketing". Muitas vezes eu tinha que lidar com um orçamento baixo e me recordo do penúltimo evento do Dia das Mulheres que realizei antes de criar o RHlab.

Baseado na quantidade de mulheres colaboradoras, o meu orçamento dava para um brinde de até 2 reais por mulher. Mais precisamente, R$1,99. E foi aí que depois de um dia fazendo orçamentos, ligamos em uma marca de esmalte que conseguiu nos atender. Conseguimos a R$1,59 a unidade do esmalte vermelho (afinal, vermelho, mulher, feminino, sensual). Missão cumprida! Sobrou dinheiro p/ dia dos pais.

Mas depois disso comecei a reparar na mão das minhas colaboradoras… pouquíssimas usavam esmalte. Muitas se mantinham no branquinho, no clarinho, ou ao natural…
A missão não estava cumprida, eu havia falhado e isso não podia se repetir.

Um ano depois, Dia das Mulheres, fiz um questionário com uma simples pergunta aberta: o que é um café da manhã ideal para você?

Muitas falaram da comida, de rotina, de hábitos, de que não tomava café porque não daria tempo de pegar o ônibus. De que não tomava café porque estava fazendo jejum intermitente para tentar emagrecer… enfim. Foram várias respostas e com essa simples pergunta eu pude compreender melhor aquela pessoa, entender suas necessidades, compreender melhor as diferenças entre realidades e o que faz daquela colaboradora ser mais humana. Mais do que isso, eu pude me aproximar daquela pessoa. O sentimento foi de que elas foram escutadas.

O resultado foi 1 mês com 4 cafés da manhas diferentes onde abordamos várias experiências incluindo o nome delas em receitas ou em hábitos. Foi uma experiência de escuta e também para que elas se conhececem um pouco melhor. Eu não consegui criar todas as realidades, mas consegui criar pelo menos algumas e isso foi muito importante para todas.

Não preciso nem perguntar o que vocês acharam que gerou mais conexão, não é? E o problema não está na recompensa em si. Mas sim no significado intrínseco que há além dela.

Muitas vezes subestimamos o significado das recompensas que oferecemos (motivações extrínsecas).

Muitos não levantam nem ao menos os dados que validam aquela ação, o que é um princípio básico para as organizações que desejam implantar Employee Experience. Quando consideramos a motivação intrínseca dos colaboradores, podemos criar momentos de maior conexão e melhorar sua experiência.

Experiência do colaborador está em alta como uma tendência do trabalho desde 2017, e a cada ano tomando mais força, mas percebo que na prática, ainda temos muitas ações inconsistentes. Ainda está no nosso sangue o "comando e controle" do modelo industrial e do "reconhecer e recompensar", que virou a gourmetização do "seja bonzinho e performe". Não me levem a mal, eu não sou contra o reconhecer e recompensar. Só acho que os requisitos que utilizamos estão errados. Os requisitos ainda são de comando e controle.

E como fica o remoto? Em tempos de quarentena, ainda vale investir na Páscoa ou em qualquer outra data comemorativa? Será que é possível prezar pela experiência do colaborador mesmo de forma remota? E o orçamento? Está como uma de suas prioridades?

Employee Experience em período de quarentena

É possível amenizar os efeitos da pandemia e do isolamento, assim como melhorar a experiência do seu colaborador durante este período de caos. Por isso, logo abaixo, passarei algumas dicas que considero importante neste momento.

A realidade que estamos vivendo não é a ideal para iniciar um projeto de employee experience, tão pouco para tirar dados de produtividade ou suposições de como está sendo a performance dos colaboradores durante a quarentena. Mesmo para aqueles que já trabalham remotamente antes da quarentena. As variáveis que podem impactar a produtividade aumentaram, os colaboradores estão super atentos a forma como a organização está lidando com a crise, por isso, menos é mais.

Cuidar da experiência é gerenciar expectativas. Neste momento também é gerenciar necessidades e reduzir a ansiedade da situação incerta. Por isso, partindo dos três subcontratos que permeiam o conceito de Experiência do Colaborador de Tracy Mayllet, para balizar suas ações (ações mais intrínsecas do que extrínsecas) segue as dicas abaixo:

1. Contrato de marca

O contrato de marca é aquilo que atrai em um primeiro momento os colaboradores para a marca empregadora. Dentro da organização ele irá validar se a marca e ações estão alinhadas. Durante a pandemia, a cultura e lacunas organizacionais estão expostas de forma exponencial, portanto, é muito importante neste momento abrir um canal de diálogo com os colaboradores apresentando argumentos que validem qualquer ação que vai contra a cultura inicialmente vendida. Guie-se pelo seu EVP e busque enfatizar pontos da cultura que foram alavancados.

2. Contrato transacional

O contrato transacional é o o contrato multuamente aceito, recíproco e explícito. Normalmente são as regras estabelecidas desde o início do trabalho pelo contrato de trabalho e políticas da organização. Neste momento o contrato transacional está sofrendo grandes alterações e dúvidas: MP, alteração de contrato, abaixa salário ou banco de horas? Demite ou dá férias? Enfim. São inúmeras dúvidas para o RH, e que também geram ansiedade no colaborador. Portanto, se possível, realize um novo contrato falado, temporário entre os colaboradores, permitam que cocriem este novo momento. E RHs, não se coloquem como detentores da tomada de decisão, abra o jogo e convide colaboradores a sugerirem. Além de aproxima-los, não se admirem de vê-los engajados em resolver a situação. Sabe quando a família conta para os filhos que está passando por uma crise financeira? Pois é, mesma coisa. Não subestime a capacidade de compreensão dos seus colaboradores.

3. Contrato psicológico

O contrato psicológico é o implícito, o não dito, a cultura paralela (cultura de corredor) e todas as crenças que são construídas e muitas vezes validadas. Mas mesmo assim, não ditas. Um exemplo claro é a crença que muitos possuem de que o colaborador que faz somente a hora do contrato é menos engajado do que um workaholic (afinal o workaholic está dando seu sangue, e é sangue que a gente quer, não é mesmo?). Neste momento, aquele contrato psicológico que já estava ruim, poderá ficar pior. Portanto, é hora de acalmar todos os colaboradores. É hora de quebra de protocolos de rotina, controle, entregas. É momento de dar mais apoio e mediar a busca por soluções do que cobrar ou exigir algo, em uma situação totalmente nova para todos.

Não se surpreenda se as suas motivações extrínsecas não se tornarem mais necessárias. Aquelas organizações que conseguirem passar por este período fomentando motivações intrínsecas poderão ter uma grande oportunidades de fortalecerem sua marca empregadora, cultura e já estabelecerem, através da crise, parâmetros para Employee Experience.

E aí eu te pergunto, você deu ovos de páscoa para os seus colaboradores?

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Lud Pimenta
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