Bossa Nova

Porque não recebi o memo

Fernando Bolivar
Rock Climbing

--

Há coisas que mais parecem vir com um mandamento atrás, presas, a dizer que “tens de gostar disto”, aliás, nem me perguntaram, sim, eu posso acusar de não me terem perguntado pois lembro-me perfeitamente o dia em que tudo aconteceu.

Eu ia na rua, em Lisboa, insuspeito claro está, caminhando alegremente, quando vejo um pequeno grupo de rufias brasileiros, com ar de meninos de praia de copacabana, tinham violas, sim, lembro-me como se fosse ontem, estavam armados com violas e ninguém os detinha — como se andar com violas na rua não fosse perigoso — e pareciam prontos a atacar, e… e.. .e estavam prontos a atacar, tanto estavam que atacaram, atacaram-me. Logo ali, *pumba*, deram-me logo com “água de beber”, como se houvesse água que não fosse para beber tentei eu responder, mas uma Sra. Leão mandou-me calar, “sim” disse eu, “melhor era mesmo se se fossem todos afogar”, mas a ver se ficaram chateados, continuaram a sussurrar como gatos esfomeados e a cantar música que ninguém leva a mal, pois calha bem que eu levo, e eles toparam isso, tenho a certeza.

O pior de tudo é que desde então não me largaram, onde eu vou, eles atacam, não sempre, mas de frequência considerável e normalmente em locais públicos, vêem com as suas perigosas vozes gatinhadas e dedilhar de guitarra de surfista queimado. Atacam sem piedade. Têm os seus sítios preferidos, isso reconheço, já quase os adivinho. Vou ao supermercado e logo ali, mal saco os cereais, caem-me em cima. *pimba*, estou num elevador, a pensar que me safo e pela coluna descem eles, *zás*, lá levo eu com a trupe da Bossa Nova, tanto me batem, acham que vou gostar lá para o fim desta guerra sem nexo. Eu atiro-lhes cocos em barda, à cabeça para doer e tudo, mas eles não desistem.

Tentei o psicólogo, mas nem cheguei a entrar na sala, eles estavam à minha espera, mal cheguei à sala de estar do consultório, o mais violento deles, o Jobim, ali plastrado com aquela gente toda à espera de consulta. Fugi, por pouco diga-se, mas fugi.

Tem sido assim a minha vida, aterrorizado e perseguido por um grupo de gente de quem não gosto, e ninguém se importa, a sociedade não se interessa, eles dizem que gostam e pronto, são impunes estes “moleques” de praia. Que o diabo os carregue, que a mim ninguém perguntou se gostava!

--

--