Construa seu caminho para ser feliz (Verdades quase sempre esquecidas 5)

Rodrigo Aguiar
Rodrigo Aguiar
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5 min readMar 5, 2017

Após muitos anos de exercícios, práticas e meditações levando uma vida austera e disciplinada em um templo ao qual havia se vinculado, um monge decidiu que não estava progredindo em seu objetivo espiritual. Resolveu então atravessar o Japão e ir até outro templo onde havia um mestre muito famoso por seus ensinamentos para buscar um direcionamento mais adequado.

Após meses de dura caminhada e muitas dificuldades, as quais só poderiam ser superadas por uma determinação monástica, ele chega até o templo e pede que seja levado imediatamente até o famoso mestre.

Quando se vê diante da figura que tanto procurava, ele pergunta: “Mestre, o que é o Satori?” (termo budista japonês para iluminação)

O mestre disse: “O Deus do fogo busca pelo fogo.”

Após a saga empreendida, essa resposta fazia todo o sentido. O monge ficou eufórico. Saiu gritando da entrevista afirmando: “Eu entendi!!! Eu REALMENTE entendi!!!!”

Sua euforia era tanta que decidiu voltar ao seu antigo templo e contar o que aprendera ao seu mestre anterior. Ele precisava mostrar o seu progresso.

Ao chegar da longa viagem de volta, procurou pelo seu antigo mestre e este lhe perguntou: “O que aprendeste com o outro mestre?”

Orgulhoso do seu aprendizado, o monge começou a discorrer: “O Deus do fogo, que é em si o fogo, busca sua natureza em outro lugar!! Eu, que sou Satori, busco o Satori fora de mim!!!!”

O velho mestre esboçou um ar triste e disse: “Eu pensei que tivesses entendido, mas agora vejo que nada entendeste realmente.” E foi-se embora.

O monge ficou pasmo. Pensou: “O que?! Como é possível que eu não tenha entendido?! Como posso estar errado?”.

Ele correu até o velho mestre e pediu-lhe, desesperado: “ESPERE! ESPERE! Dizei-me enfim: O QUÊ É O SATORI???”

O mestre replicou: “O Deus do fogo vem buscar o fogo.”

O monge, neste momento, experimentou o Satori.

Nos 4 primeiros artigos desta série eu tratei de alguns dos desafios que envolvem trilhar os caminhos que elegemos ao longo de nossas vidas e como esses desafios podem nos levar à frustração e ansiedade quando não estamos mentalmente e emocionalmente preparados para lidar com eles.

Este ano, a Organização Mundial da Saúde publicou o novo relatório global sobre depressão e saúde mental (link aqui) e os resultados chamaram a atenção do mundo todo. E não é para menos.

O estudo dá foco em basicamente dois transtornos, a depressão e a ansiedade e traz algumas informações que precisam ser avaliadas com mais atenção por todos nós.

Note que o estudo em foco trata de patologias reais e não do senso comum que muitas vezes confunde frustração e tristezas naturais da existência humana com depressão.

Globalmente, 4,4% (322 milhões) da população sofre de distúrbios associados à depressão e 3,6% (264 milhões) daqueles associados à ansiedade.

Embora seja incorreto somar esses números para chegar ao total de pessoas afetadas já que em muitos casos ambos os transtornos estão associados, o fato é que é muita gente! Entretanto, o mais preocupante é o fato de que em 2012 a OMS previa que a depressão se tornaria a principal causa de incapacidade no mundo só por volta de 2030, mas o relatório atual já a coloca como principal causa ao avaliar dados de 2015!

O Brasil é o segundo colocado na região das Américas, tanto em depressão (5,8% — 11,5 milhões de pessoas) como em ansiedade (9,3% — 18,7 milhões de pessoas).

Em um estudo de 2016 (link aqui), envolvendo 36 países de baixa, média e alta renda, a OMS estima que, se feitos adequadamente, os gastos com tratamentos para essas condições entre 2016 e 2030 trariam benefício de U$ 4,00 para cada U$ 1,00 investido, se considerarmos economia de saúde e capacidade de trabalho.

Não é possível apontar uma causa exata, já que sabe-se que as causas dos quadros de depressão e ansiedade são multifatoriais, incluindo fatores biológicos, sociais e psicológicos. O interessante é que em países menos desenvolvidos, a prevalência é maior do que naqueles mais desenvolvidos.

Parece que a forma como o mundo funciona hoje está se tornando cada vez mais insustentável e, buscando ser altamente competitivos e produtivos, estamos justamente deixando de sê-lo.

De que forma isso nos afeta diretamente?

Assim como no conto que abre esse texto, muitas vezes, estamos sujeitos a injunções, pressões e preocupações, a buscas que, criadas ou não por nós mesmos, ao serem somadas, podem se tornar demasiadas para que possamos carrega-las.

Eu desconheço um estudo que avalie a realidade apresentada aqui e consiga separar essas pressões entre aquelas que sejam extrínsecas daquelas intrínsecas, que são criadas por nós mesmos, através de nossas escolhas, pontos de vista, abordagem da vida, valores e crenças. Mesmo assim, nós sabemos que essa diferença existe. Todos os dias nos deparamos com o sofrimento atroz que significa uma ocorrência para alguém e que não tem maior significado para outrem.

Não quero dizer com isso que sofremos, em parte, por culpa nossa. Ao contrário, meu pensamento é que, em geral, não somos preparados para lidar com muitas das injunções da existência da maneira adequada.

Logo ao nascer, somos empurrados para um grande triturador que é a vida em sociedade (nos moldes atuais) e; por conta de incontáveis necessidades, desejos, compromissos, reuniões, expectativas alheias e próprias, problemas e preocupações; passamos a vida correndo, sem parar para questionar quem somos, o que realmente estamos fazendo aqui e onde queremos chegar. É de certa forma trágico, pois esse deveria ser o ponto de partida.

Oras, eu trabalho com planejamento estratégico. Não é justamente isso que é ensinado a fazer quanto se trata de direcionar empresas? Por que seria diferente ao direcionar as pessoas? Temos provas de que funciona também para as pessoas.

Para os casos das patologias expostas nesse texto, muitas são as abordagens de tratamentos possíveis e a psicoterapia surge como fator muito importante para que os indivíduos possam aprender a lidar com todas as injunções e pressões de forma mais salutar. Aliás, o estudo recomendado aponta que alguns dos fatores que contribuem para que essas patologias cresçam são justamente os baixos níveis de reconhecimento/diagnóstico das mesmas e a falta de acesso/adesão aos tratamentos (psicoterápico ou não). Ou seja, é primordial procurar ajuda especializada quando a doença está instalada.

Em adição a isso, acredito que algumas medidas e ferramentas podem ajudar a evitar que se chegue em situações onde a doença esteja instalada e mesmo auxiliar o processo de tratamento, caso isso já tenha ocorrido.

A principal delas é a que tenho buscado trazer semanalmente através destes textos: Questionar e questionar-se.

Evitar operar no modo automático e parar um pouco para pensar a respeito de nós e de nossas escolhas.

Posso dizer que tem sido muito rico não só para mim mas também para pessoas que tem relatado o quanto isso as tem ajudado.

Se textos como esses ajudarem a tirar uma ou outra pessoa daqueles números tratados acima, já terei cumprido o objetivo. Ainda há muito mais a ser explorado. O texto de hoje tem o intuito de chamar a atenção para a necessidade de assumirmos o controle de nossas vidas (sair do modo automático) e outros virão, assim como os quatro primeiros, buscando contribuir com esse processo

E você, Deus do fogo, o que anda buscando?

Se esse texto fez sentido pra você, se foi útil de alguma forma, curta e compartilhe, pois é a melhor forma de fazer com que chegue em outras pessoas.

Abraços.

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