Foto: Ari Ferreira/Red Bull Bragantino

Como Felipe Conceição quer que o Red Bull Bragantino jogue?

Rodrigo Seixas
Rodrigo Seixas
8 min readJul 5, 2020

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Na semana passada eu entrevistei o técnico do Red Bull Bragantino, o Felipe Conceição (você pode conferir a entrevista completa aqui). Ainda pouco conhecido no Brasil e no estado de São Paulo, o carioca é um treinador ainda jovem (40 anos) com as passagens de maior destaque no Botafogo e América-MG. Neste texto, através da análise dos jogos e da entrevista analiso a maneira como ele monta o Red Bull e o que ele pensa sobre o time.

Filosofia de jogo

A primeira coisa na hora de pensar em como ele vai montar a equipe é pensar que ele gosta de ver a equipe dele tomando o controle do jogo. Na visão dele, montar um time apenas defensivo e reativo, não é o caminho.

A equipe de Felipe precisa buscar o gol o tempo todo, precisa ser agressiva, no sentido de incomodar a defesa rival no ataque e apertar o adversário para roubar a bola. A equipe precisa também ter transições rápidas, roubar a bola rapidamente após perder e atacar logo após recuperar a bola. Na inspiração diz gostar do estilo Jurgen Klopp e Pep Guardiola.

Vendo os jogos do Red Bull em campo diria que é uma mistura dos dois treinadores. Ele bebe nas duas fontes e usa isso na sua equipe.

Seguindo essa filosofia de jogo, o Red Bull com 36 chances criadas no Campeonato Paulista é o primeiro neste quesito. É também o que mais desperdiçou chances com 24 — um ponto onde o time precisa melhorar.

Foto: Ari Ferreira/Red Bull Bragantino

A posse de bola é uma arma importante do time que com 59% em média por jogo, é a terceira equipe com mais posse. Porém não é algo inegociável, se precisar ficar menos com a bola — fez isso no segundo tempo contra o Palmeiras na vitória por 2x1 — e continuar sendo agressivo no jogo, não há problema.

No trabalho de Felipe no América-MG na Série B de 2019, o time teve apenas a 11ª posse de bola na competição (49%), mas foi, junto do Bragantino, o time que ficou mais jogos sem sofrer gols: 18 — como Felipe Conceição pegou o time na zona de rebaixamento melhorar a defesa foi o foco dele, para além de melhorar o desempenho, retomar a confiança. E com 12 finalizações por partida em média, o América foi a segunda equipe que mais finalizou no campeonato, atrás apenas do Massa Bruta comandado por Antônio Carlos Zago. Lembrando que Felipe pegou o América na última colocação e acabou o Campeonato em 5º com 1 ponto do Atlético-GO, o 4º colocado.

Esquema

Em 2019 o time, atuando no 4–2–3–1 foi campeão da Série B e tinha em Claudinho a peça principal de criação de jogadas circulando entre as linhas de defesa do adversários. Felipe usou esse esquema nas 3 primeiras partidas — contra o Palmeiras mudou no segundo tempo — e depois do pior jogo do time sob comando dele, uma derrota de 2x0 para o Mirassol, resolveu mudar o esquema e alguns titulares.

No jogo seguinte, atuando no 4–1–4–1 venceu o Oeste por 3x0. E foi nesse jogo que o treinador começou a colocar mais a cara dele na equipe e adaptar o novo elenco com as novas contratações e maneira de jogar.

Aqui no Red Bull eu encontrei um clube equilibrado, mas tendo que mudar a filosofia do time e precisando acelerar o processo no meio do Campeonato Paulista. Já era um grupo equilibrado e bem montado. Era mais um questão de estilo, e aí você trabalha tudo não tem preferência de defesa e ataque, você vai evoluindo em todos os momentos do jogo.

Neste esquema, Barreto, o primeiro volante, não aparece muito no ataque e fica próximo da defesa ajudando na marcação. Matheus Jesus ajuda nas roubadas de bola e na infiltração na área. Vitinho fica responsável pela articulação das jogadas no ataque e por chutes de longa distância. Artur fica com o drible pela direita e a profundidade no lado. É ele também que acelera o time. Morato do outro lado dá profundidade e opção nas transições ofensivas. Na frente, Ytalo é o centroavante que busca o espaço na área.

Artur, com Felipe, é o jogar que mais toca na bola por jogo, é também o que mais cria chances. É o segundo melhor driblador do Paulista e o jogador mais influente da equipe até aqui. São 2 gols e duas assistências no Paulista.

Desde essa vitória sobre o Oeste o time mudou pouco os 11 titulares, que só saíram por lesão ou suspensão.

Ataque posicional

O ataque do Red Bull Bragantino é característico pela construção do ataque elaborado. Utiliza sempre um grande número de jogadores perto da bola e por isso tem muitas ações com a bola durante a maioria dos jogos. É uma busca permanente para encontrar espaços.

Os jogadores só mudam de posição no campo quando a jogada está próxima deles com o objetivo que abrir espaço na defesa. O jogador que está longe da bola, está dando opção para uma virada de jogo ou para uma tentativa de reiniciar a jogada mais atrás.

A bola vem construída desde o goleiro, Julio César acertou 22 passes no último jogo de 31 distribuídos (71%).

Os triângulos formados na troca de passes do time no ataque.

Nesse modo de ataque. Os laterais aparecem bastante pelo lado para dar apoio aos pontas e aos jogadores de meio mais próximos. Assim a criação das jogadas pelo lado direito fica com Aderlan/Vitinho/Artur e do lado esquerdo com Edimar/Matheus Jesus/Morato.

O contra-ataque também é sempre utilizado, lembra que o time tem transições rápidas? Porque apesar de buscar jogadas elaboradas para construir o ataque, é um equipe que tem jogadores preparados para explorar os contra-ataques, o segundo gol da equipe no último jogo antes da parada, foi marcado assim. O time retoma a bola e já liga o ataque rapidamente. Artur é a principal peça no contra-ataques.

Alias, muito do que Felipe Conceição quer ver a equipe jogando, está nesse jogo.

Defesa

Para defender o time monta o 4–1–4–1 e se defende nessas linhas. Os defensores atuam de forma agressiva para recuperar a posse o tempo todo, procura ter sempre vários jogadores próximos da bola.

Exemplo de como o time faz a pressão no adversário.

Isso é algo que o time já tinha com o antigo treinador, e não mudou tanto com Felipe. A maior diferença é no esquema, onde o time ficava antes no 4–4–2 na hora de marcar e “sobravam” dois na frente.

Aqui o 4–1–4–1 em campo

E o Claudinho, destaque em 2019, no banco?

O meia Claudinho foi o melhor jogador da última Série B. Com dribles que quebravam os marcadores e alegravam a torcida, passes que desmontavam a defesa e arrancadas, foi o principal destaque do time em 2019. E por que ele fica no banco com Felipe Conceição?

Acho que a explicação pode ser tática, além de comportamental e/ou técnica — dizem que o meia não estaria tão afinado com as ideias do novo treinador por isso teria parado no banco. Mas sabe essa defesa no 4–1–4–1? Com ela Claudinho teria de voltar para marcar muito mais do que fazia antes e tem uma posição bem mais fixa do que antes no ataque.

Se ele jogar pela esquerda, vai ter que fechar aquele lado e na hora de atacar só vai sair daquela região quando a bola chegar nele. Se atuar pelo meio, no lugar de Vitinho, por exemplo, vai ter que voltar para defender o centro.

A posição que ele fazia, não existe mais (meia de ligação/ponta de lança), esse talvez seja o grande problema. Por outro lado, ele é melhor jogador tanto se for comparado com Morato como Vitinho, acho que seria interessante ver ele se encaixando na equipe, ele pode ser muito útil e pode ser melhor aproveitado.

Thonny Anderson, ex-Athlético-PR e Grêmio também é outro jogador que também pode render mais e aparecer na equipe durante 2020. Ele pode até voltar como titular, assim como Claudinho, o time titular pode sofrer alterações durante o ano, mas a ideia de jogo vai seguir a mesma.

Filosofia Red Bull e processo de seleção

Para ser contratado, Felipe Conceição e o Red Bull contam que houve um processo de seleção até achar o nome. Felipe foi o treinador que passou no teste, foi ele quem estava mais afinado com a ideia de jogo da empresa de energéticos.

A empresa tem vários clubes no mundo, times na Alemanha, Leipzig, na Áustria, o Salzburgo, e em outros países. E todos os treinadores, jogadores e diretores precisam seguir essa cartilha. Ralf Ragnick é o diretor de todas as franquias pelo mundo, o diretor, ex-treinador e ex-jogador é um dos criadores do gegenpressing, um modelo de jogo alemão que hoje tem como principal referência Jürgen Klopp — treinador do Liverpool que Felipe citou como referência. Esse modelo tem relação com aquela agressividade no jogo que Conceição diz.

Esse vídeo mostra um pouco gegenpressing

Outro motivo da escolha de Felipe Conceição é o bom trabalho dele com jogadores jovens. Além do elenco jovem do América-MG o treinador trabalhou na base do Botafogo. Matheus Fernandes atuou com ele na base do clube carioca e foi contratado pelo Barcelona recentemente.

Em todo o mundo a Red Bull faz observações por jovens jogadores e os contrata. Não só tem retorno técnico como obtêm lucro no processo. Todas as contratações do Red Bull Bragantino são de jogadores com menos de 23 anos, o clube tem dinheiro e boa estrutura, mas não gasta com veteranos. A média de idade do plantel do Leipzig é de 24 anos, e Timo Werner um dos melhores jogadores alemães na atualidade acabou de ser vendido ao Chelsea por 64,00 milhões €. No Salzburg, Haaland foi vendido ao Dortmund por 45,00 milhões € aos 19 anos.

Felipe utiliza os jovens e aproveita da intensidade de jogo deles para fazer o time funcionar como gosta.

O Red Bull Bragantino hoje tem o projeto de cultura de jogo mais sólido do Brasil. Entender como ele é feito e o resultado que ele terá dentro do país é algo importante e pode ditar como os clubes brasileiros vão trabalhar nos próximos anos.

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