Crítica | O Reencontro e a redescoberta da vida e do sorriso

Rogério de Moraes
Redação Crítica
Published in
3 min readNov 28, 2017

por Rogério de Moraes

O filme francês O Reencontro (Sage Femme) pode ser descrito como o encontro de duas grandes atrizes e um premiado diretor acostumado a retratar mulheres fortes em seus filmes. Naturalmente, essa é uma descrição extra-filme, apenas aquilo que vemos de imediato quando olhamos os nomes de Catherine Deneuve, Catherine Frot e Martin Provost no cartaz. O que não deixa de ser um animador indicativo do que poderá ser visto na obra.

Frot interpreta Claire, uma parteira de meia idade que leva uma vida que podemos chamar de ordinária. Não há demérito nisso. Independente, ela se dedica a seu trabalho com paixão, tem um filho que cursa medicina e mora sozinha em seu apartamento. Até que recebe a ligação de Béatrice (Deneuve), uma mulher que não vê há trinta anos e que causou uma trágica mágoa em seu passado.

A tentativa de reaproximação será forçada por Béatrice, apesar da resistência de Claire, e isso vai revelar o quanto são diferentes. A primeira é um espírito livre que sempre viveu na irresponsabilidade, sustentada muitas vezes por dinheiro de jogatinas ou pelos homens de quem foi amante. Já a segunda é séria e dedicada ao trabalho. Vive sozinha e leva sua vida no limite do espartano.

Graça e leveza

Na condução dessa história, Provost flerta com a comédia dramática, mas sem se deixar levar para o exagero cômico. Consegue assim uma direção afinada, que desenvolve a gravidade dos sentimentos envolvidos sem perder a leveza. Mesmo seu roteiro previsível — da personagem séria demais que se abre para a vida a partir da convivência com alguém mais alegre — não prejudica a graça do filme.

Esse funcionamento azeitado se deve também às duas atrizes. Deneuve consegue expressar muito bem as camadas de sua personagem. Sentimos que a frivolidade de Béatrice encobre uma força peculiar. Nas entrelinhas, pode-se ver que suas escolhas também deixaram marcas, mágoas e arrependimentos. Exigiram, cada uma delas, sua dose de coragem.

Esse peso da vida é mais evidente em Claire, que passará por uma transformação difícil ao finalmente encarar seus fantasmas do passado. Nesse sentido, a atuação de Frot exige menos sutileza e muito mais uma potência transformadora. É como se tivesse estado sempre presa a seus traumas e agora, pela primeira vez, se permite o direito de olhar para a vida com mais leveza.

Crise e reencontro

Nessa transição, o verdadeiro reencontro acontece com ela mesma e com suas novas perspectivas. É um contraponto a um tipo de crise de meia idade, revelada também no seu drama profissional, quando vê seu trabalho cada vez menos valorizado, substituído pela tecnologia impessoal das modernas maternidades.

Assim, O Reencontro torna-se uma delicada história de acerto com o passado e um olhar para adiante. Uma mudança, a chance de um recomeço. Como na canção que diz que “o novo sempre vem”. Ou como o nascimento de um bebê. Um filme sensível e de humor leve com duas grandes atrizes, mostrando a redescoberta das coisas simples e fundamentais.
(texto originalmente publicado no site Formiga Elétrica)

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