A Palermo de Borges — e outras esquinas argentinas

O bairro guarda a casa onde Jorge Luís Borges, em Buenos Aires, e algumas das esquinas eternizadas em seus textos.

Roteiros Literarios
roteirosliterarios
4 min readMay 20, 2014

--

Por Andréia Martins

Casa onde Borges viveu no bairro de Palermo, em Buenos Aires. Em seus textos, o escritor eternizou esquinas do bairro

Jorge Luis Borges (1899–1986) é um dos principais expoentes da literatura argentina. Nascido em 24 de agosto de 1899, na rua Tucumã, na casa do avô, em Buenos Aires (Argentina), foi no bairro de Palermo que o autor criou suas primeiras memórias, começou a conhecer a cidade e aos 6 anos decidiu que queria ser escritor. O autor viveu no bairro entre 1901 e 1914 em uma casa na antiga Rua Serrano — hoje rua Jorge Luis Borges–, número 2135. O local pode ser identificado pela placa fixada na entrada, que informa quem por ali passa sobre o antigo morador. Mas não está aberto para visitas. Ali, Borges viu despertar seu interesse pelos livros na biblioteca do pai, de onde ele em um ensaio autobiográfico disse que acreditava “nunca ter saído”, e pelo corredor da casa –não à toa os labirintos seriam constantes em sua obra futura.

O escritor argentino Jorge Luis Borges, em 1951 (Grete Stern)

O bairro hoje tem uma cara diferente da vista por Borges quando criança. Nos anos anteriores à década de 1920, Palermo ainda era um bairro dividido entre a cidade e o campo, com diferentes pessoas circulando pela área. Da Europa, onde ficou por sete anos antes de retornar ao país natal, ele exaltou o bairro em livros de poesia como Fervor de Buenos Aires, Lua de frente e Cadernos de San Martín. Os poemas sobre as ruas que lembrava eram escritos enquanto a capital argentina se modernizava. Em suas caminhadas pelo bairro ele via muitos imigrantes perambulando e se metendo em curiosas confusões nas tavernas locais. Eram demonstrações gratuitas de valentia que preencheram a imaginação de Borges.

Em um de seus poemas, Função Mítica de Buenos Aires, escrito em 1923, quando ele já estava na Europa com a família, o argentino eternizou o bairro, em especial o quadrilátero das ruas Guatemala, Serrano, Paraguai e Gurruchaga. Nos versos, Borges escreve que Buenos Aires nasceu ali, naquelas ruas e esquinas. Na esquina da Guatemala com Serrano, por exemplo, está o Almacén el Preferido, prédio que data de 1885 e que Borges descreve como o reduto de valentões.

Além da casa onde cresceu e as esquinas do bairro, a Praça Güemes, também chamada de Guadalupe, era outro local muito frequentado por Borges em Palermo. Lá ele costumava jogar truco com um senhor que virou personagem no conto O Homem da Casa Rosada, de 1935, que integra o livro História Universal da Infâmia.

Hoje, o bairro é chamado de Palermo Velho. Considerado chic, abriga alguns dos bares mais descolados da cidade e é muito frequentada pela classe artística (um tipo de Vila Madalena portenha).

Outras esquinas argentinas

  • A Rua Tacuarí aparece no livro O Aleph. Borges cita uma adega em um dos prédios desconhecidos da rua e que era a localização do mítico “ponto no espaço que contém todos os outros pontos” do universo.
  • No bairro da Recoleta Borges morou boa parte de sua vida adulta, entre um apartamento e outro. Mas foi no apartamento 6B, da Rua Maipú, 994, perto da Praça San Martín, que ele morou por muito tempo, chamando o lugar de sua verdadeira casa.

CAFÉS

  • No Cafe Tortoni, na Avenida de Mayo, número 825, próximo da esquina com a Rua Suipacha, uma estátua de Borges “está sentada” numa mesa com Carlos Gardel, o cantor de tango.
  • Na Rua Florida, 468, o café Richmond ainda conserva um pouco da atmosfera da década de 1920, com poltronas de couro, colunas, vidros e espelhos. Borges costumava frequentar o local, na época em que editava a revista literária de vanguarda Martin Fierro.

BIBLIOTECAS

  • Continuando na Avenida de Mayo, dessa vez no número 575, no bairro Boedo, você encontra a Biblioteca Municipal Miguel Cané. Em 1937, enquanto a carreira não decolava, ele trabalhou ali catalogando livros. Isso até 1946. Como o trabalho não era de todo pesado, ele aproveitava parte do tempo livre para escrever, o que fazia em um pequeno quarto, sem janelas, no prédio da biblioteca. No livro Ficções, ilivro que tornou a obra de Borges conhecida mundialmente, a história Biblioteca de Babel cita os livros que ele tinha sob os cotovelos no local.
  • A Biblioteca Nacional, localizada na Rua México, 564, na Recoleta, também é outro local ligado a Borges. Depois que o ditador Juan Perón foi deposto em 1955, Borges foi indicado para dirigir a instituição. Hoje no local funciona o conservatório musical, aberto para visitas. Em 2013, uma estátua de Borges foi inaugurada no local.
A sala usada por Borges na Biblioteca Municipal Miguel Cané (Divulgação)

Para ler

  • Poesia, de Borges (Companhia das Letras)
  • História Universal da Infâmia, de Borges (Companhia das Letras)
  • O Aleph, de Borges (Companhia das Letras)
  • Ficções, de Borges (Companhia das Letras)

Originally published at roteirosliterarios.com.br on May 20, 2014.

--

--