Livros dos viajantes #3: O Bonito do Caminho

Na coluna, viajantes compartilham os livros que levam na bagagem.

Roteiros Literarios
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4 min readJan 21, 2020

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por Maria Fernanda de Moraes

A coluna Livros dos Viajantes de hoje chega sobre duas rodas e com vento batendo na cara. Isso porque vamos contar um pouquinho sobre o projeto de três aventureiros: a Karina, o Ismael e a Estopa, um casal muito simpático e sua carismática mascote que decidiram fazer uma viagem de Florianópolis até o Uruguai de um modo peculiar: de bicicleta! Pra melhorar um pouco mais esse enredo, eles deram ao projeto o nome de O Bonito do Caminho.

Eles saíram da ilha no dia 16 de janeiro e, pouco mais de um mês depois, em 20 de fevereiro, estavam de volta, com a mochila cheia de experiências e vivências desses 35 dias de viagem. O legal é que eles foram publicando vários vídeos no decorrer da viagem e o pessoal podia ir acompanhando o que estava rolando. (acesse aqui o canal deles no YouTube).

Quando partiram de Floripa, além da Estopa e das duas bicicletas, eles também levaram uma carrocinha, uma barraca, um fogareiro, uma câmera, um tripé, algumas outras tralhas para sobrevivência e, ainda, teve espaço para dois livros.

“Levamos conosco Admirável Mundo Novo, do Aldous Huxley, e 1984, do George Orwell, que já estavam em andamento. Como estávamos com o peso das bikes calculado, porque afinal, qualquer item desnecessário faz peso, e nas subidas nos arrependeríamos amargamente dele, levamos nossas leituras atuais e combinamos de trocar os livros quando terminássemos (o que não aconteceu, já que mal tivemos tempo para ler!)”.

O casal também falou um pouco sobre como foi a escolha dos livros. A gente sempre fica pensando se nessa hora o gênero ou o enredo da história influencia e eles disseram que, na verdade, a viagem é que tem a ver com as obras.

“Ultimamente, temos lido obras que questionaram fortemente nosso olhar sobre a sociedade que a gente vive, sobre os valores que estão cada vez mais invertidos, sobre a maneira que vivemos e por que vivemos assim. Junto com outras leituras de Thoreau, Kerouac e Ray Bradbury, nossa ficha foi caindo de que não estamos fazendo do jeito certo essa história de viver. Entre diversos outros fatores, foi a leitura desses livros que nos fez tentar outras possibilidades de viajar e de, quem sabe, levar a vida”.

Pra quem ficou com dúvidas sobre como a Estopa viajava, olha ela aqui, bela e formosa, no engate da bicicleta

Tá, mas e quando se viaja de bicicleta dá pra ler? Segundo o casal, é mais difícil mesmo, até porque eles sempre estavam atrás de suprir necessidades básicas [vale lembrar que eles não tinham uma rota definida de antemão], como cozinhar a própria refeição, achar um lugar seguro pra dormir, se proteger do sol.

“Então quando não estávamos pedalando, estávamos fazendo uma dessas coisas, ou desmaiados de cansados. Os melhores lugares pra ler foram em campings, quando tínhamos quase tudo o que precisávamos, e em ônibus, que usamos pra fazer alguns trechos”.

Bom, pra terminar, depois dessa viagem encantadora, perguntamos pra dupla o que significa, pra eles, colocar o pé na estrada.

“É algo parecido com um despertar, como quando acordamos atrasados pra algum compromisso, num susto, de uma só vez. Estar na estrada é acordar da anestesia que a rotina na cidade nos proporciona. Agora que estamos de volta, lembramos de como os dias durante a viagem são intensos e parecem ser muito mais longos, pela quantidade de experiencias e emoções que vivenciamos ao longo do mesmo dia. Sabemos que ao contrário do dinheiro, que se pode acumular, o dia tem 24 horas fixas e não há nada que possamos fazer para mudar isso, então viajar parece ser a melhor maneira de aproveitar o tempo que temos, a maneira mais verdadeira e viva”.

PARA LER

· Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley (Biblioteca Azul): umas das distopias mais famosas da literatura, o livro mostra uma sociedade organizada segundo princípios científicos, na qual a mera menção das antiquadas palavras “pai” e “mãe” produzem repugnância. É a história de um mundo de pessoas programadas em laboratório, e adestradas para cumprir seu papel numa sociedade de castas biologicamente definidas já no nascimento. A literatura, a música e o cinema só têm a função de solidificar o espírito de conformismo. Um universo que louva o avanço da técnica, a linha de montagem, a produção em série, a uniformidade, e que idolatra Henry Ford.

· 1984, de George Orwell (Companhia das Letras): foi publicado em 1949 e é o último livro de Orwell. Winston, o personagem principal dessa história, vive aprisionado na engrenagem totalitária de uma sociedade completamente dominada pelo Estado, onde tudo é feito coletivamente, mas cada qual vive sozinho. Ninguém escapa à vigilância do Grande Irmão, a mais famosa personificação literária de um poder cínico e cruel ao infinito, além de vazio de sentido histórico.

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