Os refúgios de Eduardo Galeano em Montevidéu

Visitamos dois lugares que fazem parte da história pessoal do escritor uruguaio: o Café Brasilero e a livraria Linardi Y Risso.

Roteiros Literarios
roteirosliterarios
5 min readFeb 11, 2021

--

por Andréia Martins

Eduardo Galeano (1940–2015) é um dos mais conhecidos escritores uruguaios. Natural de Montevidéu, ele classificava a cidade como o local onde “todos se amam sem dizer e se abraçam sem se tocar”.

Ali, ele coleciona lugares preferidos, como o Estádio Centenário e a Rambla (como é chamada a parte da cidade banhada pelo rio Plata; a Rambla 25 de agosto era a sua favorita). Mas outros dois foram fundamentais para a sua formação literária e pessoal: o Café Brasilero e a livraria LinardI y Risso.

CAFÉ BRASILERO

Aberto em 1877, o Café Brasilero é o mais antigo café da cidade em atividade e o primeiro a ser declarado de interesse cultural pela Câmara Municipal de Montevidéu.

Galeano disse mais de uma vez que era filho dos cafés de Montevidéu e aprendeu tudo o que sabia neles, “em uma época onde havia tempo para perder tempo. Foram minha única universidade”, dizia.

ÁREA INTERNA DO CAFÉ BRASILEIRO, EM MONTEVIDÉU

O café fica em um dos pontos mais turísticos da capital uruguaia, o bairro Cidade Velha. O visitante passa pela Praça da Independência e cruza a Porta de la Ciudadela. Segue pela movimentada Sarandí com seus comércios, livrarias e museus para todo o tipo de turista, até chegar à Praça da Constituição. Ali, descendo pelas ruelas rumo ao Mercado do Porto você vai cruzar com o Café Brasilero.

O café Galeano, que tal?

Ali, naquele prédio antigo, com diferentes pessoas entrando e saindo (de intelectuais dos tempos de Galeano a executivos, jovens alternativos e clientes das antigas), você sente todo o clima do centro da cidade. O escritor gostava de sentar na mesa ao lado do vidro que dá para a rua.

O ilustre frequentador foi homenageado com um café que leva o seu nome e que mistura licor Amaretto, creme e doce de leite. Por $ 130 pesos uruguaios (isso em 2017) você pode tomar o café Galeano.

· Endereço: Ituzaingó 1447 — Ciudad Vieja. Aberto de segunda a sexta, das 9h às 20h

LINARDI Y RISSO

A livraria Linardi Y Risso foi fundamental para a formação intelectual do escritor. Localizada a duas ruas do Café Brasilero, Galeano frequentou a livraria desde os anos 1960 (ela existe desde 1944) até seus últimos dias.

O local ficou famoso por abrigar reuniões de grupos de discussão com escritores como Haroldo de Campos, Mario Benedetti, Julio María Sanguinetti, entre outros. O peruano Mario Vargas Llosa também tem na livraria um de seus refúgios literários, como indicava um cartaz logo na entrada, no dia da nossa visita, com uma dedicatória do autor: “Muitos dos livros que tenho consegui nesta maravilhosa livraria”.

A livraria tem um tom clássico. Enquanto o jazz toca na rádio, você caminha pela pequena livraria e se sente como num sebo já que ali há livros novos e coleções antigas, com obras amarelados e já se desfazendo devido ao tempo. Há também as encadernações clássicas de capa dura e letras douradas.

O diferencial do lugar é ter publicações diversas sobre a América Latina. Há obras sobre política, formação da identidade latina, geografia, arte, tudo o que se pode pensar, e ainda um rico acervo de jornais, o que faz a livraria ser muito visitada por pesquisadores. Eles também organizam bibliografias sob encomenda e oferecem livros descatalogados.

ENTRADA DA LIVRARIA LINARDI Y RISSO
A ÁREA INTERNA DA LIVRARIA
UM RECADO BEM-HUMORADO NA LIVRARIA DESTINADO AOS QUE NÃO TEM MUITO CUIDADO COM OS LIVROS…

Um episódio emblemático foi a inesperada visita do escritor chileno Pablo Neruda. “Foi numa manhã qualquer no final da década de 1950”, diz o relato no site da livraria, que Neruda entrou pela primeira vez na Linardi y Risso. O chileno gostava de incluir em seus roteiro livrarias e museus que considerava “originais”.

O relato continua: “Rapidamente simpatizamos. Nunca foi nosso costume tentar vender mais no menor tempo possível, mas, pelo contrário, ir devagar, mostrando as publicações e salvar alguma coisa para o final sempre. Mas sua ansiedade quebrou a nossa parcimônia. Don Pablo não era o tipo de cliente que se senta e espera que lhe mostrem o que pode ser de interesse. Ele percorria as prateleiras e subia altas escadas agilmente antes de nosso olhar atento, temendo uma queda”.

A visita se repetiria em todas as outras vezes que o chileno esteve em Montevidéu. No livro de visitas ele escreveu: “Uma livraria que busca e preserva, e esconde a surpresa que devemos encontrar. Que delícia, ainda que não levemos quase nada!”

· Endereço: Juan Carlos Gómez, 1435 — Centro. Abre de segunda a sexta, das 10h às 18h.

PARA LER

· As Veias Abertas da América Latina, Eduardo Galeano (L&PM)

· O Livro dos Abraços, Eduardo Galeano (L&PM)

· Memória do fogo, Eduardo Galeano (L&PM)

· Dias e Noites de Amor e Guerra, Eduardo Galeano (L&PM)

--

--