Oito pontos essenciais em que todo founder de um SaaS B2B no estágio inicial deveria prestar atenção

Geraldo Melzer
SaaSholic
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11 min readApr 17, 2018

Fonte: integral-bg.eu

Nos últimos anos, o nosso time na a.b.seed tem se especializado em investimento e crescimento de startups SaaS B2B no Brasil. Nós avaliamos mais de *160 startups, dentro desse recorte, para fazer apenas três investimentos em 2017. Em 2018 faremos entre quatro e cinco investimentos.

A partir dessa jornada, focada 100% em negócios de tecnologia com o modelo de recorrência no estágio inicial, temos acumulado aprendizados e muitas informações que consideramos relevante compartilhar com founders que estão começando a escalada de uma startup SaaS no Brasil.

Abaixo listei oito pontos fundamentais em que, na minha opinião, todo founder de um negócio SaaS B2B deveria prestar atenção.

Espero que a leitura deste post ajude na priorização dos seus desafios neste ano de 2018, que começou faz pouco.

* Não incluí startups fora do modelo, apenas negócios SaaS B2B.

1) Co-founder CTO onboard

Ter a inteligência de desenvolvimento de produto desde o início, “dentro de casa”, normalmente aumenta as chances de se desenvolver um produto mais robusto, ter uma visão de futuro mais clara e fazer uso mais responsável dos recursos.

Na última pesquisa “Napkin 2018”, conduzida por Christoph Janz, foi feita entrevista com muitos dos mais respeitados VCs e investidores seed americanos. Para os investidores seed, eles pontuaram “Co-founder CTO” como o fator de maior importância para tomada de decisão de investimento, acima, inclusive, de MRR, PMF e outros fatores considerados por muitos altamente relevantes. O segundo maior peso ficou para “Founders com track record comprovado”, ponto que também valorizamos de forma intensa no nosso processo de análise na a.b.seed.

Fonte: Point Nine Ventures.

Dentro das centenas de empresas que passaram no nosso funil nos últimos 12 meses, boa parte das que evoluíram mais etapas no processo era composta por 2–3 founders, e ao menos um deles tinha perfil “dev”, técnico, o CTO. Se o seu negócio não tem esses skills, faça o possível para ter um co-founder com esse perfil o quanto antes na jornada.

2) Garantir sinalização clara de PMF (Product Market Fit) antes de acelerar

Tive conversas com algumas startups que estavam crescendo relativamente devagar, vendendo para perfis muito variados de clientes, com taxa de cancelamento acima do aceitável e, mesmo assim, querendo captar recursos com objetivo central de acelerar as vendas. A frase do Jacco Vanderkooij, “cuidar para não escalar o fracasso”, nunca pode ser esquecida.

É fundamental estressar muito bem a proposta de valor e conhecer o ICP (Ideal Customer Profile) antes de se acelerarem as vendas e se ampliar um modelo que, por não ter uma proposta de valor forte, muitas vezes não se sustenta.

Também é importante conhecer bem o perfil, ou perfis, dos clientes que vai se atacar, para criar estratégias de go to market adequadas ao perfil, além de uma operação adaptada à complexidade de venda do produto. Com um ticket médio de R$ 150, é viável ter um time de inside sales? É importante ter uma visão de ROI da área baseada em dados, “para fazer a conta fechar”. Neste post o Franco Zanette, do time da a.b.seed, aprofunda muito bem o tema.

Ter uma operação comercial muito bem quantificada, com a maior previsibilidade possível, é fundamental. Entender quantas contas um vendedor tem que fechar por mês, a que ticket médio para estar saudável, e quanto tempo se “rampa” um novo rep, são pontos cruciais de se controlar antes de simplesmente crescer contratando gente, na força bruta.

Conseguir construir algo próximo da famosa “máquina de aquisição” não é fácil, mas é o caminho a perseguir e a grande oportunidade que o modelo de recorrência proporciona.

3) Começar a área de CS (Customer Success) ASAP, mesmo que seu churn esteja “ok”

Muitas startups chegam a mais de 100k de MRR, com centenas de clientes, e mesmo assim não enxergam a importância de CS. Isso ocorre por não entenderem a relevância da área para o modelo de negócios de recorrência e/ou por acharem que seu churn está sob controle — por isso, não priorizam.

Não podemos esquecer que SaaS é um business que vai além das vendas, é um negócio de retenção e expansão. Iniciar CS o quanto antes na trajetória de um SaaS aumenta as chances da empresa de preservar e expandir a base de clientes. Antecipar os clientes que não estão extraindo valor do produto e trabalhar proativamente, preocupando-se não só em diminuir a taxa de cancelamento, mas também em expandir a receita gerada pela base de clientes: essa é uma frente esquecida por grande parte dos novos empreendedores.

Já existem muitas boas práticas e ferramentas modernas que hoje estão disponíveis para entender e estruturar uma área de CS na sua empresa. No Brasil, diferentemente de cinco anos atrás, já existem profissionais com experiência técnica relevante na área e já “prontos para atividade”. Neste post do B2B Stack eles listam algumas das principais ferramentas ligadas a Customer Success.

Além dos ganhos óbvios de se implementar a área de CS cedo, como os citados acima, existem alguns benefícios muito relevantes que não ficam tão explícitos, como melhorar a curva de aprendizado de produto.

Essa retroalimentação que CS pode trazer para outras áreas acelera a curva de aprendizado e desenvolvimento da empresa como um todo. Aposte na área de CS cedo.

É necessário atenção muito especial ao processo de onboarding. O papel do processo de onboarding é garantir que o cliente que acaba de assinar um plano/serviço siga os steps necessários para extrair valor com o uso do produto da forma mais natural, veloz e sistematizada possível.

No início, logo após o cliente contratar o seu serviço, é o momento em que ele está mais entusiasmado e disposto a aprender com atenção aos steps necessários para obter sucesso. Tentar recuperar esse cliente após ele não ter conseguido extrair valor e já ter mudado o “mindset” vai ser muito mais trabalhoso, caro e difícil.

Apesar de ser muito lógico, muitas empresas não alocam a devida energia para o onboarding. Dar atenção desde cedo ao processo no qual o cliente extrai seu primeiro valor é algo imprescindível, pois o onboarding está diretamente ligado ao churn (taxa de cancelamentos).

Conversando com alguns experts em CS, o cliente que passa pelo onboarding tem, por vezes, acima de duas vezes mais chances de não cancelar o software/ serviço, comparado com o cliente que não passa pelo processo, segundo pesquisas internas de dois SaaS muito relevantes no Brasil.

4) Métricas e unit economics relevantes para o estágio seed

“Não podemos confiar tanto na métrica (LTV/CAC) no estágio muito inicial”

David Skok, criador da regra LTV/CAC>3

A métrica mais popular e relevante para se acompanhar a saúde do funil de marketing e vendas em um negócio de recorrência é o LTV/CAC (Life Time Value / Cost of Acquisition). Ele está em todos os decks e pitches no Brasil e no mundo.

A métrica LTV/CAC “pergunta” se um cliente traz um LTV maior do que o custo de vender para ele. A métrica ajuda em diversas tomadas de decisões, como em qual canal ou em qual tipo de cliente se deve investir mais. Mas, especialmente na fase inicial de uma startup, temos que ter bastante cuidado com a confiabilidade desse indicador.

David Skok, partner da Matrix Partners e talvez o maior estudioso do modelo SaaS, sinaliza que não podemos confiar nessa métrica no estágio muito inicial de uma operação, neste post.

Quando temos o próprio founder vendendo na fase inicial, o CAC terá um comportamento diferente de quando tiver o primeiro time de reps vendendo. Além disso, com pouco volume de vendas, ainda oscilantes, os dados acabam sendo pouco representativos.

À medida que a operação começa a amadurecer, novas camadas e modelos de canais provavelmente vão ser necessários, como SDRs, Partners, Operations etc. Somente quando se encontram esses canais mais escaláveis e se tem uma operação mais madura, o LTV/CAC terá papel imprescindível e confiável.

O churn também pode ter um comportamento distorcido na fase inicial, pois diferentes perfis de clientes ainda estão sendo testados, e problemas de produto relevantes ainda penalizam a taxa de cancelamentos. Nesse estágio uma taxa de 4%+ é considerada *aceitável, pela imaturidade operacional.

Estudar todo e qualquer cancelamento a fundo para aprender ao máximo e entender os reais motivos é crítico nessa etapa.

Nesse contexto, founders nesse estágio precisam escolher algumas métricas que gerem entendimento real sobre a performance da empresa. Startups que ainda não estão com um modelo previsível, métricas como cac, cac payback, logo churn, rev churn, LTV, ARPA mês e base são essenciais e sofrem menos distorções para se gerenciar um SaaS no estágio inicial.

Controlar muito bem o uso do recurso/cash burn é algo também muito importante, que permite à empresa não deixar acabar a “gasolina” antes do próximo “posto” e ser surpreendida por falta de recursos. Controlar bem o cash burn sinaliza domínio, controle da operação, enfim, boa gestão dos founders.

* Tomasz Tunguz compartilha no seu blog esta tabela, com as taxas de churn esperadas por segmento de negócio e maturidade.

5) Cultura de batimento de metas

Criar uma cultura de batimento de metas desde o início é fundamental. Primeiramente, ela deriva da postura, atitude, visão que os founders transmitem para a primeira camada de reps.

O founder ter vendido já algumas dezenas de contas e ter uma boa intuição sobre o processo comercial pode ser importante antes das primeiras contratações. Muito se fala na famosa “venda do sonho”, que apenas o founder consegue transmitir com confiança e clareza. Essa venda pode ter a maior conversão, porém, infelizmente, ela não escala.

Se possível, tenha o primeiro gerente de vendas com track record que inspire a primeira leva de sales reps, atraia talentos e traga o componente de agressividade e ambição, características marcantes de times e empresas que entregam seus números e crescem de forma exponencial.

O primeiro gerente de vendas tem papel crucial. Um gerente que tenha performado e seja respeitado por isso, geralmente, é a aposta de menor risco a se fazer, principalmente no início.

Criar um Culture Code que transmita a cultura com clareza e atraia candidatos alinhados com a empresa é prática importante e eficiente.

Critérios de “rampeamento” e regras para efetivação ou demissão têm papel relevante na construção da cultura da empresa. Normalmente esse tipo de prática repele aqueles que se sentem desconfortáveis com o desafio e, ao mesmo tempo, orgulha e motiva aqueles que conseguem superar o obstáculo e ser bem-sucedidos na função. Esse tipo de política, muitas vezes, promove senso de pertencimento e conquista poderoso.

6) Cultura de desenvolvimento de conteúdo sistemático

A maior parte das empresas SaaS B2B que estão em fase de crescimento utilizam o inbound marketing como um dos principais canais de educação e aquisição de clientes.

Muitos dos que conseguiram criar uma estratégia de inbound robusta, além de utilizarem ferramentas de automação de marketing modernas de forma efetiva, aderiram a uma cultura forte de desenvolvimento de conteúdo interno de forma metódica e sistemática que praticamente virava uma cultura.

Os ganhos dessa boa prática vão além da produção do conteúdo em si, que se transforma em leads, opps e vendas, etc. Quando a empresa constrói essa cultura de out-teach, ela amplia sua articulação, por meio do exercício constante de estruturação das ideias em conteúdos técnicos e materiais ricos.

A cultura de desenvolvimento de conteúdo é muito poderosa e empoderadora se feita de forma séria. No Brasil a Resultados Digitais, RockContent e Meetime são três exemplos de empresas SaaS que vêm criando essa cultura de forma exemplar.

7) Visão de mercado — TAM e EXIT

Conseguir articular com clareza como o mercado em que se encontra terá dimensão ou como se vai capturar um pedaço relevante de um mercado em forte crescimento é algo crucial. A maior parte dos potenciais investidores precisa enxergar o potencial, pois, sem tamanho de mercado relevante, menos alternativas há de saída.

Jared Sleeper faz parte do time do Matrix Partners e escreve no site For Entrepreneurs, especializado em SaaS B2B, a “bíblia” do tema. Neste post ele traz uma visão sólida sobre os caminhos mais adequados para se chegar ao TAM (Total Addressable Market) no estágio seed.

Segundo ele, o formato top down, que geralmente começa em “segundo Gartner, esse mercado movimenta US$ 30b…”, é o menos apreciado, pois deixa pouco claro o verdadeiro sweet spot, ou seja, quais subsegmentos de clientes têm maior potencial de aderir à solução e que dimensão de mercado isso representa de fato.

Ele escreve que a abordagem bottom up, “pricing praticado vezes número de clientes com fit para vender”, pode ser o caminho mais claro e tangível de articular o potencial de mercado. Apesar de concordar que a visão bottom up pode ser menos abstrata, na a.b.seed gostamos de fazer os dois exercícios, top down e bottom up, para construir uma visão a mais assertiva possível do mercado endereçável.

Ter lucidez sobre o real potencial de dimensão do seu negócio é crucial. Soluções muito específicas para um nicho muito pequeno por vezes podem ser um excelente negócio, mas também um péssimo investimento.

Ter uma visão quantitativa e qualitativa consistente da dimensão do seu negócio é fundamental, pois ela terá uma boa relação com suas futuras alternativas de funding e exit.

No final, o próprio exercício de se chegar no TAM é o mais rico e importante do que se chegar á um número específico e definitivo.

8) Talent 1st

Esperar ficar grande para ter um recurso de talent ou ter um recurso de talent para ficar grande? Uma startup SaaS de sucesso, para crescer, precisa ter a capacidade de contratar as pessoas previstas, para entregar o crescimento acelerado esperado.

Alguns reps demorando para serem contratados e/ou demorando um pouco mais para “rampar” que o previsto provocam dois grandes efeitos, conforme gráfico abaixo mostra. O primeiro é o tempo para que esse vendedor se pague. O segundo, não tão óbvio, é a necessidade de fluxo de caixa necessário para financiar esse desenvolvimento. Em empresas de alta velocidade de contratação, essa variável pode ter impacto relevante e criar um buraco no plano de crescimento.

A curva acima mostra o efeito de um rep demorando três meses para rampar (vermelho) e o efeito de outro demorando seis meses para rampar (azul). Fonte: a.b.seed Ventures.

Diversos founders e diretores de SaaS mais experientes com quem tive interação compartilham a visão de que o desafio de recruiting é gigante e pode tomar até próximo de 50% do tempo da liderança de uma startup em fase de hipercrescimento. Atrair e converter um pool qualificado de talentos não é tarefa fácil.

A criação de um Culture Code é prática muito importante, e praticamente todas as startups que estão conseguindo crescimento consistente vivem o Culture Code de forma legítima e genuína. Um Culture Code que reverbere a cultura dos founders, à medida que a empresa cresce e que os founders perdem a interação direta com o time, tem papel mais importante do que pode parecer.

As primeiras dezenas de contratações serão decisivas para a formação de cultura da empresa e influenciam bastante para onde o barco vai. Estressar bem a atração de talentos altamente alinhados e comprometidos com a cultura, com os valores e princípios dos founders será um divisor de águas.

Nessa fase será crucial ter uma pessoa para dar eficiência a essa atividade de talent acquisition. Uma função que profissionaliza e sistematiza o processo de recrutamento e seleção tira grande parte da carga dos founders e garante que os recursos previstos no BP estejam disponíveis na data certa, com perfil certo, “rampando” na velocidade prevista.

Assim como a máquina de vendas tem que estar bem calibrada, a máquina de contratação também é componente decisivo e sensível para qualquer startup que persiga o crescimento exponencial.

Meu nome é Geraldo Melzer, sou partner na a.b.seed Ventures. Fazemos investimentos seed em startups SaaS B2B no Brasil.

Originally published at pt.linkedin.com on April 17, 2018.

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Geraldo Melzer
SaaSholic

Sou partner na a.b.seed Ventures. Fazemos investimentos seed em startups SaaS B2B no Brasil.