Elementos da espiritualidade e culto indígena

Regina Fernandes Sanches
Editora Saber Criativo
4 min readOct 15, 2020

Por Izaías Hitohã Pataxó

As Danças para a Cultura e religiosidade Pataxó

Na cultura Pataxó as danças, acompanhadas ao som dos maracás, é a expressão mais sublime de relacionamento com os seus compatriotas e com Niamisu (Deus). Muitos, baseados em olhares externos à cultura indígena, relacionam essas danças aos rituais de invocação dos pajés. Na verdade, o pajé é um nativo como os demais, que possui nas danças um estilo de vida, no entanto, é uma liderança indígena.

Na aldeia Pataxó em Minas Gerais há uma mulher que carrega no sangue a importância da cultura do seu povo, que ela expressa através da musicalidade e da dança. Sempre quando há pessoas não indígenas na aldeia, que desejam conhecer melhor a cultura Pataxó, e, na ausência do grupo do awê (grupo de dança da aldeia), esta jokana (mulher) apresenta-se sozinha, e, na firmeza de sua voz e de seus passos, desenrola em círculos. Todos são contagiados e envolvidos igualmente a participar de sua alegria. Esta situação ilustra perfeitamente o significado das danças indígenas, parte importante da cultura indígena. Tanto crianças (kitok), moças e mulheres (jokana), homens e anciãos (kakuçu),pajés e toda a comunidade, concebem as danças como parte de suas vidas.

As Músicas

Outro aspecto de igual relevância no ethos Pataxó são as músicas, que estão intimamente relacionadas às danças. A maneira mais fácil de explicar a vida, a tradição, a compreensão de mundo e a razão de invocação e gratidão a Niamisu (Deus) são as canções. Elas são compostas por Thihi (índio), que possui mais afinidade musical, e se aplicam mais à serenidade, tranquilidade (como uma contemplação) e sensibilidade para que as letras possam fluir melhor e corresponder às situações pretendidas. Devido a isso, as músicas nunca perdem sua credibilidade para os Pataxó, pois contam e recontam a vida do povo, sua história e tradições, através de pessoas seletas e comprometidas com a cultura, como a música a seguir:

Tradução — Obrigado Deus pela chuva que na terra chegou, obrigado Deus pela chuva que na terra chegou.

Trata-se de uma música de agradecimento. Os parentes e amigos se reúnem periodicamente e entoam a Niamisu (Deus) esse canto. A letra é um louvor pela chuva que na terra chegou. Costumam cantar noite adentro numa comunhão peculiar e sentimento de satisfação pela dádiva divina.

O povo Pataxó era caracteristicamente animista. Suas danças, músicas, invocações, petições e agradecimentos eram devotadas aos vários espíritos que concebiam. Eram eles, espíritos das matas, das plantas, dos animais, dos rios, dos ancestrais.

Os Pataxó praticavam também uma forma de totemismo. Esta tradição religiosa era produto de uma adoração sincera e de um esforço de relacionamento com o divino, Niamisu. Em seu relato da criação, os Pataxó acreditavam que o primeiro homem a ser criado, que, era um guerreiro Pataxó, nascera de um pingo de chuva e este pingo de chuva fora enviado por Niamisu. No afã de agradar Niamisu e não podendo vê-lo, nem mesmo os pajés, os Txihi (índios) tinham a certeza que através das ações cúlticas estariam honrando ao seu grande Criador. Nisto, entendiam que os diversos espíritos bons em ação remetiam para o grande Niamisu.

Para os indígenas Pataxó sempre existiram os espíritos bons e os espíritos ruins. Os espíritos bons eram considerados aqueles que enviavam o alimento através das pescarias, caçadas e plantios. Enviavam também as chuvas, o sol, a fertilidade, saúde, paz. Já os espíritos maus enviavam doenças, crianças deficientes, (que não podiam exercer sua função de guerreiras), guerras, divisões de clãs, etc.

A vida comunitária era pautada e ainda continua num líder político e social (cacique). Trata-se de um homem (em raros casos também de mulher) já idoso, pessoa de profunda experiência e saber, que todos valorizam como líder guerreiro, instruído e capaz. Outra figura igualmente importante é o pajé. Este constitui a representatividade religiosa e médica de cada aldeia. Algumas comunidades ainda hoje conservam a pessoa do pajé na função de raizeiro, médico da aldeia. Todas as aldeias também consideravam a liderança dos troncos velhos (anciãos). Estes se encarregavam de diariamente se reunirem durante a noite com todos, para transmitirem os conhecimentos, inúmeras histórias, experiências diversas que até então eram saberes particulares.

Assim, através destes e muitos outros símbolos os Pataxó viviam a vida e ainda hoje observam alguns desses aspectos que são relevantes para a comunidade e são preservados em vista de uma espiritualidade saudável.

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